Da Agência MPF
BRASÍLIA – A capacitação dos agentes públicos sobre as religiões de matriz africana foi uma das principais demandas apresentadas ao Ministério Público Federal (MPF) em Sergipe pelos povos de terreiro e de religiões de matriz africana no evento realizado na terça-feira (20) de março.
Cumprimento da lei federal que obriga as escolas públicas e privadas a ensinarem sobre história e cultura afro-brasileira no ensino fundamental e médio também foi cobrado no evento.
A reunião, convocada pelo MPF, contou com 86 participantes de diversas comunidades religiosas de Sergipe, que lotaram o auditório na sede da instituição. Pela primeira vez, no Estado, essas comunidades foram convidadas pelo MPF a apresentar suas demandas, que serão a base das diretrizes para atuação da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) em 2024.
Mãe Marizete Silva Lessa, a mais antiga ialorixá do Candomblé em Sergipe, do Abassá São Jorge de Mãe Nanã, compareceu ao evento e, apesar da idade avançada, 94 anos, acompanhou toda a reunião, colaborou na condução dos debates, cantou, e deu a benção aos presentes. “Esse contato com o MPF é importante para nos dar força junto ao poder público. Temos os nossos direitos e eles precisam ser respeitados”, enfatizou.
Demandas
O respeito aos praticantes de religiões de matriz africana por parte dos agentes do poder público foi repetidamente cobrado na reunião. Entre as propostas, está a capacitação e sensibilização dos agentes, especialmente os da segurança pública, sobre as práticas religiosas, indumentárias e a cultura das comunidades, para evitar abordagens que firam o direito de liberdade de culto dessas pessoas.
A proteção dos locais sagrados também foi listada pelo MPF entre as demandas apresentadas. Essa salvaguarda envolve tanto os terreiros quanto as reservas de mata e fontes de água indispensáveis para os cultos religiosos de matriz africana.
“O avanço das construções acaba com os poucos resquícios de mata atlântica em Aracaju e também no interior. Os rios também sofrem com poluição e construções irregulares. E sem folha e sem água não há axé”, enfatizou o babalorixá Fernando Kasideran, do Ilê Axé Dematá Ni Sahara.
A preservação dos locais sagrados passa também pelo mapeamento dos terreiros em Sergipe. Ilzver Avelar, professor de direito e defensor de Direitos Humanos destacou que, em outros estados, esse mapeamento já foi realizado e que, em Sergipe, essa informação é crítica para a garantia do direito fundamental de liberdade de culto, dos modos de vida e da história dessas comunidades.
Educação
A lei federal que determina o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas de todo o Brasil completou 20 anos em 2023, e também apareceu entre as demandas trazidas à reunião. Severo D´Acelino, ator, diretor de teatro e um dos pioneiros do movimento negro em Sergipe, destacou os momentos históricos em que houve avanços na aplicação da lei, mas sempre em programas de governo, sem se tornar uma política pública permanente. “É uma realidade distante em Sergipe”, enfatizou.
A procuradora regional dos Direitos do Cidadão, Martha Figueiredo, afirmou que o encontro foi um pontapé inicial para o MPF em Sergipe construir parcerias, inclusive com outras instituições do poder público, para garantia desses direitos. “As demandas aparecem em vários setores. Esse evento marca o início das articulações para conseguirmos efetivamente concretizar o direito dos cidadãos praticantes de religiões de matriz africana, à liberdade de culto, ao respeito às suas tradições, seus espaços de culto e suas liturgias sagradas”, avaliou.
Ação Nacional
A atividade faz parte de uma ação coordenada nacionalmente pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) para a redução do racismo religioso, pela laicidade estatal, pelo respeito à diversidade e para promoção de direitos fundamentais referentes à liberdade religiosa.