MANAUS – O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB) irritou os empresários do setor industrial, na semana passada, ao fazer cobrança durante entrevista a uma emissora de rádio local. Foi na quinta-feira. O prefeito cobrou maior participação das empresas do Polo Industrial de Manaus em ações filantrópicas na capital e disse que as empresas ajudam pouco na solução de problemas da cidade. “Vamos fazer valer a lei que instituiu a Zona Franca. Eles terão que colaborar e não apenas levar daqui bilhões em faturamento e incentivos fiscais”, teria dito o prefeito. A entrevista ganhou destaque em um jornal local (no destaque abaixo) e revoltou os empresários do setor.
Em privado, um dos diretores do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam) disse que se foi pelo momento político, o prefeito atuou muito mal, e questionou “que incentivo ou benefício o município oferece às indústrias?” O empresário também lembrou que são as indústrias que mantém boa parte das entidades filantrópicas de Manaus, como Casa Vidha, Grupo de Apoio à Criança com Câncer (GACC), Apae, Fazendo Esperança e Lar Mamãe Margarida, além de vagas em creches oferecidas pelo Serviço Social da Indústria (Sesi). “Tirando isso, imagino se todos os funcionários e dependentes das indústrias do PIM utilizassem o serviço público de saúde, transporte, educação… Sem contar a UEA”.
Em público, a resposta dos empresários foi dada através da coluna Follow-up, do Cieam, publicada no Jornal do Commercio, na última sexta-feira, 10. No texto em forma de notas, a entidade empresarial critica desde os gargalos de infraestrutura que prejudicam a indústria do Amazonas até pesada carga tributária que as empresas pagam para o governo, e que chega à Prefeitura de Manaus através dos repasses, principalmente de ICMS.
Os empresários afirmam que “a maior parte da riqueza gerada pela ZFM, 55% aproximadamente, decorrente dos benefícios fiscais volta para os cofres da União. De tudo que é produzido pelas empresas da ZFM, portanto, a fatia do leão, literalmente, é destinada ao governo”. Citando um estudo feito pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEA), o Cieam informa que os empresários ficam com apenas 1,82% das riquezas produzidas na Zona Franca de Manaus.
Veja abaixo a publicação sobre o que disse o prefeito Arthur e a resposta do Cieam, pela coluna Follow-up.
Coluna Follow-up do dia 10/10/2014
Vamos convidar o Brasil a passear na floresta
Com a bancada parlamentar estadual e federal eleita promulgação da Emenda Constitucional 80, feita pelo Congresso Nacional no dia 5 de agosto último, é hora de planejar a luta para o novo ano que se avizinha. O Brasil arrefeceu a pressão de alguns segmentos da indústria e da mídia para repensar a Zona Franca de Manaus, mas ela voltará, não tenhamos dúvida. Por isso, nossa representação política precisa chamar seus pares de outras regiões a conhecer a ZFM. A renúncia fiscal envolvida no modelo foi reconhecida – na eficácia de seus benefícios sociais, econômicos e ambientais, pela absoluta maioria dos parlamentares em 2014, apenas 4 votos contrários no Congresso Nacional. Foi dada uma trégua nessa relação truncada e distante do Brasil consigo mesmo. O travamento da ZFM, na dinâmica de sua cadeia produtiva e autonomia administrativa, porém, segue intacto, não apenas pelo esvaziamento da Suframa, a autarquia que administra os incentivos fiscais, como na falta de perspectiva para equacionar os gargalos de infraestrutura, com o apagão digital de uma banda larga lenta e cara, energia sobrando sem estrutura de distribuição, e uma estrutura portuária duopolizada e cara. E de quebra, a continuidade do boicote articulado por interesses políticos inconfessos para protelar a liberação do Processo Produtivo Básico (PPB) que tem travado novos investimentos na região.
Embargos da burocracia
No caso do PPB, entregue a um grupo de trabalho nos ministérios do Desenvolvimento e Ciência, Tecnologia & Inovação, o prazo para liberar o início da produção de determinados itens, no passado, chegou a superar quatro anos de espera, afetando o aporte de novos investimentos à região. Após muitas discussões o MDIC se comprometeu a dar a devida atenção e celeridade no processo de avaliação de PPBs e estamos acompanhando essas ações. Boicote semelhante acontece na distribuição dos recursos de P&D, recolhidos pelas empresas da Zona Franca de Manaus no setor de informática. Um boicote sombrio, que provoca incertezas e preocupações a respeito da atuação da aplicabilidade dos recursos arrecadados. Mais de R$ 120 milhões que seriam destinados a projetos de inovação em biotecnologia e tecnologia da informação – as prioridades das Global Trends 2015 – foram, em 2013, para uma atividade totalmente alheia ao desenvolvimento da região: o agronegócio. Os demais recursos para a Amazônia, incluídos os do Fundo Amazônia, a cargo do BNDES, seguem travados nos escaninhos perversos da burocracia.
Generosos tributos
Acusada de “pesadelo fiscal”, pelo desconhecimento do volume de emprego e renda que produz, o preconceito de alguns setores da mídia contra ao modelo ZFM ignora que não há custeio público no processo produtivo local. Existe sim uma renúncia fiscal para reduzir as inaceitáveis desigualdades regionais, com isenção apenas do IPI nas importações e reduções de outros tributos. No caso da ZFM, quando o governo deixa escapar por um lado sua compulsão arrecadatória, ganha por outro, fazendo do modelo medida compensatória aos próprios cofres, numa operação fácil e tecnicamente demonstrável. A maior parte da riqueza gerada pela ZFM, 55% aproximadamente, decorrente dos benefícios fiscais volta para os cofres da União. De tudo que é produzido pelas empresas da ZFM, portanto, a fatia do leão, literalmente, é destinada ao governo. É o que diz uma pesquisa feita pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEA) foram analisados os efeitos que os incentivos fiscais concedidos a indústrias instaladas na região têm na distribuição de riquezas entre funcionários, proprietários e governo. Vamos recordar os dados obtidos pelo pesquisador Jorge de Souza Bispo, autor da tese “Criação e Distribuição de Riqueza pela Zona Franca de Manaus”: de toda a produção da ZFM, 54,42% vão para o governo; 27,28% são distribuídos entre os empregados; e apenas 1,82% fica com os empresários. Em compensação, no restante do país o governo recebe 41,54% de toda a produção; os empregados ficam com 36,31%; e os empresários, com 6,44%. Para o autor, foi uma conclusão surpreendente, pois mesmo com os incentivos fiscais, as empresas locais geram em média 31% de riqueza sobre o faturamento, enquanto as outras criam aproximadamente 50%. Isso significa que Manaus comparece com quase a metade dos impostos recolhidos pela União na Região Norte. E o Amazonas é um dos oito estados da Federação que mais recolhem do que recebem recursos. A exportação de recursos para a União em 2013 foi de R$ 12,967 bilhões, e recebeu de volta (transferência) apenas R$ 2,753 bilhões, gerando uma exportação líquida de R$ 10,213 bilhões, uma informação que escapa aos desafetos da ZFM. Acrescente-se ainda, uma geração de empregos que se aproxima de 1 milhão só no Estado e é incalculável em toda sua cadeia produtiva dos itens presentes em todos os lares do Brasil. A ZFM não beneficia só o Amazonas, mas o Brasil, os brasileiros que consomem os produtos fabricados aqui. Portanto, é preciso rever o discurso raivoso da renúncia, e olhar de outro prisma as vantagens da prorrogação.
Integração inteligente e urgente
E se as empresas aqui instaladas, comprovadamente, arrecadam menos que em outros arranjos industriais do país, elas patrocinam duas vezes o orçamento da Universidade do Estado do Amazonas, no fundo criado para sua manutenção, pagam os programas regionais de pesquisa e desenvolvimento e os fundos estaduais de turismo e fomento municipal, que permitiram, por exemplo, financiar os projetos de cadeias produtivas no interior. São mais de R$ 2,3 bilhões de investimentos, entre P&D, universidade, turismo e programas de agroindústria para a população ribeirinha. Com mais de 95% de sua floresta original conservados, é mais barato prorrogar a ZFM e agregar infraestrutura e recursos de P&D para criar outras matrizes econômicas, adensar, diversificar e interiorizar alternativas, coerentes com a biodiversidade, aquicultura, polo gás químico. O contraponto é devastar as matas, ou entregar a região ao narcotráfico, ou, quem sabe, financiar megaestrutura militar para vigiar as fronteiras e proteger seu patrimônio genético. O Amazonas convida o Brasil a conhecer suas matas, sua história, os pioneiros que recriaram a economia com a queda do ciclo da borracha, e apostaram na viabilidade de suas utopias. Conhecer 60% do seu país, ou seja, nossa fantástica floresta, a Amazônia, que o Brasil, a maioria dos brasileiros, desconhece. Estamos na Constituição Brasileira, existimos para guardar esta floresta, onde brota um quinto de todos os seres vivos do planeta. Um patrimônio que o Brasil precisa olhar com inteligência e sabedoria, para produzir remédios, cosméticos, alimentos e energia limpa, sem destruir suas matas. Está na hora, portanto, de convidar o Brasil a passear na floresta.
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]