EDITORIAL
MANAUS – No Brasil de 2021 (chegando em 2022), os membros dos poderes constituídos ainda se comportam como aqueles que tinham o poder no obscurantismo da Idade Média, conhecida historicamente como a “Idade das Trevas”.
O obscurantismo é um sistema político, cultural e social que nega instrução à maioria dos homens e mulheres para que não conheçam a luz e possam ser mantidos sob o julgo daqueles que são sustentados pelo trabalho árduo dos ignorantes.
Séculos se passaram e os poderes no Brasil mantêm o mesmo comportamento: não se sentem parte da sociedade, mas acima dela. Por isso, se sentem no direito de levar uma vida nababesca custeada com o dinheiro do contribuinte.
Essa situação ficou evidente neste ano, principalmente nas ações dos poderes Legislativo e Judiciário. Em ambos os casos, os próprios membros dos poderes foram vistos servindo-se de regalias e privilégios.
No âmbito nacional, o Congresso aprovou um fundo eleitoral de R$ 5 bilhões e 100 milhões para 2022, ano em que o Brasil realiza eleições gerais para presidente da República, senador, deputado federal, governador e deputado estadual.
O dinheiro será usado para as campanhas eleitorais dos candidatos que forem indicados pelos partidos. Cada partido recebe uma bolada, de acordo com o número de cadeiras na Câmara dos Deputados. Soma-se aos R$ 5 bilhões e 100 milhões mais R$ 1 bilhão do fundo partidário, dinheiro usado para a manutenção dos partidos.
No âmbito local, assistimos à Câmara Municipal de Manaus numa tentativa alucinada de gastar o dinheiro excedente, transferido pela Prefeitura de Manaus. As transferências, apesar de legais, mostraram-se exorbitantes. O excedente poderia ser devolvido ao Poder Executivo, mas não foi.
Os vereadores de Manaus tentaram gastar com aluguel de carros de luxo para eles próprios, mas desistiram após a reação popular; tentaram gastar construindo um prédio desnecessário com mais de 50 gabinetes (a Câmara de Vereadores têm 41 cadeiras), mas também enfrentou ação na Justiça e desistiu.
No apagar das luzes, no último dia de trabalho deste ano, os vereadores aprovaram o aumento d valor da Ceap (Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar), de R$ 18 mil para R$ 33 mil. Um absurdo, que também está sendo questionado na Justiça.
Além disso, os vereadores já têm aprovado, desde dezembro de 2020, um reajuste nos próprios vencimentos, que passará dos atuais R$ 15.031,76 para R$ 18.991,68, a partir de janeiro de 2022.
O Judiciário também resolveu, no fim do ano, gastar o dinheiro excedente em 2021, quando o poder passou a maior parte dos dias de portas fechadas por causa da Covid-19 e os seus membros e servidores trabalharam de casa.
A Presidência do TJAM decidiu pagar três parcelas generosas de R$ 100 mil a cada magistrado de uma dívida que vem sendo encarada como impagável. Trata-se da PAE (Parcela Autônoma de Equivalência), um achado espetacular que o Supremo Tribunal Federal concedeu aos seus membros e que depois se tornou direito adquirido para toda a magistratura brasileira, Ministério Público e Tribunais de Contas.
Desde 2010, o TJAM vem pagando parcelas mensais de R$ 10 mil aos magistrados, e a dívida nunca diminui. Esses R$ 10 mil somam-se ao salário de mais de R$ 30 mil e vantagens, que elevam os ganhos mensais de alguns desembargadores e juízes a mais de 40 mil. Mas neste fim de ano, eles receberam valores acima de R$ 130 mil líquidos em outubro, novembro e dezembro.
Enquanto isso, uma parcela da sociedade depende de um auxílio do Governo do Amazonas no valor de R$ 150 mil para comer. Outros não conseguem sequer esse benefício.
Outra parcela da sociedade, das classes média e média baixa, que ainda consegue um emprego ou um negócio para prover sua família, sustenta, com o pagamento de impostos pesados, a casta que se mantém no topo.
Os poderes constituídos no Brasil ainda não se deram conta de que os tempos mudaram e seus membros são servidores do Estado. Bastaria um salário decente, como ocorre em países de regime democrático em que a população saiu do obscurantismo pela educação.
O problema é que um faz as leis, o outro aplica as leis e o terceiro julga os conflitos a partir das leis. O circulo se fecha no andar de cima, enquanto os de baixo sustentam o peso sobre os ombros.