Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Em tempos em que a sociedade brasileira necessita se organizar para discutir seus problemas e apresentar soluções, os partidos políticos deixam de lado suas ideologias para dar espaço ao “caciquismo” e ao “personalismo”. Para analistas políticos, isso enfraquece as siglas e as tornam meros meios para se chegar ao poder.
Na eleição deste ano, diversas siglas estão sofrendo conflitos internos que envolvem a divergência sobre candidatos a cargos majoritários e a disputa pelo comando delas. Em âmbito nacional, houve divergências no PSDB, MDB e Pros. No Amazonas, conflitos dividiram o PT, Pros e PSOL. A maioria dos casos foi judicializada porque não houve consenso.
No caso do PSOL, a falta de unidade fez com que a sigla lançasse dois candidatos a governador: o advogado Marcelo Amil e o médico Israel Tuyuka. Apesar de Amil ter recebido apoio da presidente regional da sigla, Rosilane Almeida, a candidatura de Tuyuka foi declarada a oficial pela Executiva Nacional. Amil recorreu ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e aguarda decisão.
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O conflito interno no Pros, no Amazonas, envolveu apoio a candidatos a governador de outros partidos. Uma ala defendia a integração da sigla à coligação encabeçada pelo ex-governador Amazonino Mendes (Cidadania) e a outra era a favor da candidatura do ex-vice-governador Henrique Oliveira (Podemos). Uma decisão recente do TSE beneficiou o candidato do Podemos.
No PT regional, a divergência se deu em relação ao apoio da sigla ao senador Eduardo Braga (MDB), candidato a governador, que um grupo de filiados era contra. A disputa interna se deu até nos últimos momentos antes da convenção do MDB, com a escolha do(a) candidato(a) a vice-governador(a), que saiu do PT. O partido escolheu Anne Moura.
O advogado e sociólogo Carlos Santiago afirma que o eleitor brasileiro tem costume de votar em personalidades em detrimento de ideologia de partido político. Por conta disso, as siglas partidárias buscam pessoas conhecidas, que podem receber votações expressivas nas eleições e, assim, ser eleitas para o Parlamento ou para o Executivo.
“Poucos são os partidos que apostam em criação de lideranças políticas. Isso acaba criando um problema seríssimo no período das convenções partidárias, em que há muitos conflitos de interesses pessoais em detrimento das ideologias partidárias e da ideia coletiva que deveria ser o partido político”, afirmou Santiago.
O sociólogo cita como exemplo os dois candidatos que figuram entre os favoritos para o Governo do Amazonas na eleição deste ano. “Tantos os eleitores de Amazonino como de Wilson Lima, que estão liderando as pesquisas, estão mais propensos a votar em nomes, em pessoas, do que na legenda, do que na proposta ideológica do partido”, diz Santiago.
Confusão ideológica
Para o sociólogo, o resultado do “personalismo” é a falta de opções para os eleitores que buscam votar pela ideologia. “No período das eleições, o eleitor também acaba passando por conflito quando ele quer votar em ideologia política não em pessoas porque as próprias legendas acabam, no período eleitoral, se misturando”, afirmou Santiago.
“Fica difícil para o eleitor identificar o que é de esquerda, centro ou direita. São inúmeros exemplos de partidos que defendem a bandeira do socialismo e estão se unindo com partidos defensores do neoliberalismo. E tudo isso só alimenta essa cultura do personalismo, já que as legendas partidárias também não mostram para a sociedade as suas diferenças”, disse Santiago.
Para o sociólogo, o “personalismo” e o “caciquismo” enfraquecem os partidos. “Os partidos políticos sempre foram fracos nas suas concepções políticas, no Brasil. Isso se deve não só ao personalismo e ao caciquismo, que são fortíssimos na política brasileira, mas também por conta de interesses particulares que utilizam as siglas partidárias para chegar ao poder”, disse.
O advogado e cientista social Helso Ribeiro Filho também critica o que chama de “excesso de personalismo” nos partidos. “Nós falamos muito assim: é o ‘PT do Lula’, o ‘PL do Alfredo Nascimento’, o ‘PSD do Kassab’. A gente diz até o nome do dono do partido. Então, as pessoas passam a sua personalidade para o partido”, afirmou Ribeiro Filho.
Siglas de aluguel
Além do “personalismo”, o cientista social critica o uso das siglas como instrumentos de negócio pelos “caciques” políticos. “Alguns partidos pequenos servem de aluguel, são siglas de aluguel. Essas siglas têm donos, os partidos são feudais. Você não pode desrespeitar o dono do partido. Os partidos são feudais”, disse Ribeiro Filho.
O cientista social defende a cláusula de barreira, que impede o funcionamento de partidos que não alcançarem determinado percentual de votos. “Eu entendo que enquanto não apertamos, aumentarmos ainda mais a cláusula de barreira que inviabiliza algumas benesses a partidos políticos a gente vai continuar com isso”, disse Ribeiro Filho.
“Como nós não temos um grande lastro de democracia, a gente tem que fazer com que os partidos também sejam democráticos. E não são só os partidos, não. Você pode ver, por exemplo, que sindicatos, às vezes, caminham no mesmo direcionamento. São autocráticos, tem donos também”, completou Ribeiro Filho.