Por Jullie Pereira e Iolanda Ventura, da Redação
MANAUS – O pedreiro Adão dos Santos Almeida, 27, preso pelo candidato a prefeito de Manaus Capitão Alberto Neto (Republicanos) por suspeita de assalto a um ônibus da linha 651, na zona leste de Manaus, na quarta-feira, 7, disse ser inocente, que sofreu trauma com o caso, não consegue mais andar de ônibus e perdeu trabalhos por ter sido exposto na mídia.
Em entrevista ao ATUAL, Adão disse que quer uma retratação pública do candidato, desmentindo o que ele divulgou nas redes sociais.
O pedreiro contou que pegou o ônibus no Centro de Manaus e após passar pelo Terminal 2, na Cachoeirinha, zona sul, um dos passageiros percebeu que tinha sido furtado e o acusou. Ele atribuiu o equívoco por parte do rapaz à grande quantidade de pessoas que entrou no coletivo.
“Eu peguei o ônibus no Centro no sentido Coroado. Quando chega no Aleixo, o rapaz me acusa de ter roubado o celular dele. Isso aconteceu lá no Terminal 2, naquele ‘empurra-empurra’ de gente, pessoal todo mundo empurrando lá, acontece de sumir o celular dele. E ele ficou me acusando, dizendo que tinha sido eu, sendo que eu não tinha feito nada disso”, disse Adão.
Adão conta que após ter sido acusado, houve uma confusão dentro do ônibus. Quando chegou ao Coroado, havia uma ação de campanha de Alberto Neto. Foi quando o candidato percebeu o tumulto, entrou no veículo e rendeu Adão.
“Essa confusão foi parar só no Coroado. Lá estava esse Capitão Alberto (Neto). O Capitão Alberto pegou a minha bolsa. Nessas horas que ele falou que estava tocando o terror dentro do ônibus, o (passageiro) que me culpou falou que eu estava querendo furar ele e tudo mais, sendo que ele pegou minha bolsa, tomou uma chave minha e ficou querendo me furar com a minha própria ferramenta”, disse o pedreiro, que levava os instrumentos de trabalho.
A versão do pedreiro desmente a de Alberto Neto, que divulgou para a imprensa que mais de um homem estavam roubando o ônibus. “Acabamos de participar de uma ocorrência policial onde infratores levaram celulares das vítimas que estavam no ônibus, aqui na frente do Coroado, onde nós estávamos fazendo nossa panfletagem”, disse o candidato, na quarta.
Apesar de não ter certeza da acusação, Alberto Neto deu voz de prisão a Adão e divulgou o ato, classificando o pedreiro como ‘infrator’. “Hoje colocamos mais um infrator na cadeia, e assim vai ser a nossa rotina como prefeito de Manaus, vamos levar segurança para o nosso povo, assaltante não vai ter vez dentro de ônibus não”, disse Alberto Neto.
Adão afirma que havia muitas pessoas no ônibus, mas justamente ele foi acusado pelo passageiro de ser o assaltante por ser negro. “Não é erro não. Isso é coisa que acontece, isso é coisa política. Com certeza só pode ser. Ou ele acha assim: ‘ah, não tinha ninguém lá’. Tanta multidão que tinha lá, um ‘bocado’ de gente dentro do ônibus. Por que ele me escolheu? Só pode ser porque eu sou preto. Eu sou preto, mas eu sou um cara negro e tudo, mas eu sou um cara trabalhador”, disse.
Adão relatou que foi rendido e colocado no carro da polícia sem ser ouvido, e ficou preso. “Depois disso tudo me colocaram no carro da polícia lá e nem precisava. Me colocaram atrás no carro da polícia. Passei pelo sofrimento, estou pagando por uma coisa que eu nem fiz. Do Coroado me levaram para a zona leste, parece que eles rodaram comigo para cima e para baixo só para ‘sacanear’. Ainda me colocaram dentro da cadeia lá, passei mais ou menos umas duas horas sem nada, sofrendo lá”, contou.
“Eles (supostos assessores de Alberto Neto) nem queriam saber de nada. Eles estavam muito era me pressionando, todo mundo me pressionando lá. Inclusive até os funcionários daquele candidato (Capitão Alberto Neto) me pressionando toda hora. Aqueles caras [assessores de Alberto Neto] não têm poder de estar fazendo aquilo com ninguém não, que eles não são autoridade. Quem tinha que resolver aquilo era a polícia, não eles. Aí o Capitão Alberto manda os funcionários fazerem o que fizeram comigo”, relatou.
Apesar do alarde feito em torno da prisão, ele afirma que não sabe de investigação alguma. “Não falaram que vão investigar nada. Até agora não me falaram nada, só me liberaram e pronto. E também outra coisa, nunca fui preso, eu sou um cara ficha limpa”, disse.
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Consequências
Além de pedreiro, Adão faz bicos na feira da Manaus Moderna. Ele diz que conhece todos os feirantes. Após o acontecimento, tem medo de andar de ônibus e ser reconhecido e perder trabalhos. “Eu sou um pai de família, trabalhador, trabalho todo dia. Hoje eu estou aqui na feira porque não fui trabalhar porque eu não quis, eu estou com muito trauma sobre essa confusão que teve. Mas trabalho tinha, só que eu não fui”, disse.
“Como é que eu vou pegar o transporte público? Aí eu dentro do ônibus o cara olha e diz ‘olha esse aí é aquele ladrão’, sendo que eu não tenho culpa de nada”, afirmou. “Cliente meu que eu trabalho de pedreiro fazendo diária por aí… Como é que o pessoal vai dizer? ‘Ah, eu não vou ligar para esse cara não que esse cara é ladrão, esse cara é assaltante’”, disse.
Adão afirma que no momento que foi retirado do ônibus fotos suas foram divulgadas. “Na mesma hora colocaram as minhas fotos nas redes sociais em todo lugar. A minha família logo descobriu, todo mundo me ligando. Isso aí fica feio entendeu, como é que vai ficar?”
Adão quer uma retratação pública desmentindo o que foi divulgado por Alberto Neto. “Esses caras que fizeram isso comigo tem que pedir desculpa, tirar as minhas imagens das redes sociais. Tem que ser homem esses caras que fizeram isso comigo para ver se eles são homem de pedir desculpa e tudo mais, retratação pública sobre esse negócio aí”, afirmou.
Outro lado
Consultado pelo ATUAL, Alberto Neto afirmou que fez a sua obrigação. “Fiz o meu papel de defender quem estava precisando. Dever cumprido. A PC (Polícia Civil) vai continuar com as investigações”.
O candidato negou que tenha divulgado as imagens de Adão. “Eu não divulguei imagem dele. O veículo de comunicação sabe de suas responsabilidades de não divulgar imagens de suspeito. Nas minhas redes não tem nada divulgado. A imagem tem que ser borrada para divulgação”, disse.
As imagens do suposto assaltante foram espalhadas pela própria assessoria de imprensa do candidato, que as enviou já escondendo a identidade do homem rendido. Vídeos gravados por presentes no local não escondiam o rosto de Adão.
Questionado, Alberto Neto afirmou que não irá se retratar. “Não, porque fiz o meu papel de defender o outro. Havia uma confusão no ônibus onde todos o acusavam. E ele foi levado para delegacia, conforme manda o procedimento policial”, afirmou.
Veja a entrevista completa:
(Colaborou Murilo Rodrigues)
Tem q pedir de quem o acusou e não de quem atendeu a um pedido de socorro, mesmo sendo de quem o acusou errado.