EDITORIAL
MANAUS – Eduardo Pazuello quase não esboça sorriso em público, mas deve, no privado, dar boas gargalhadas do comportamento dos senadores na CPI da Covid, no Senado, que investiga as responsabilidades do governo federal na pandemia.
O ex-ministro da Saúde, ao mesmo tempo em que se mostra espertalhão diante dos senadores, revela um caráter nada elogiável.
Primeiro, pelo fato de se submeter a “aulas particulares” para treinar o que deveria dizer na comissão. Um homem de bom caráter não se submeteria a esse tipo de treinamento e enfrentaria os senadores com as suas próprias verdades.
Depois, veio a tentativa de fuga do depoimento, com uma desculpa estapafúrdia de que teve contato com pessoas infectadas pelo vírus. Natural seria que os senadores exigissem provas (exames) dos militares que testaram positivo para Covid-19 e em que circunstâncias tiveram contato com Pazuello. Nada foi questionado.
O senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da comissão, se disse satisfeito com a palavra do comandante do Exército, que assegurou ser verdadeira a versão contada pelo ex-ministro. De acordo com o comandante em questão, Pazuello deveria ficar em isolamento durante 14 dias (até hoje não está claro em que dia ele teve contato com os militares infectados).
Isolamento ou quarentena exige que a pessoa não tenha qualquer contado com o mundo exterior, para reduzir o risco de contaminação de outras pessoas.
Mas Pazuello, que uma semana antes da CPI andava sem máscara em um shopping de Manaus, fazendo galhofa de quem o interpelasse, recebeu o ministro Onyx Lorenzoni, escalado pelo governo Bolsonaro para coordenar a estratégia de defesa junto à CPI.
De novo, Omar Aziz minimiza os fatos. Disse o senador que não via crime no fato de Pazuello receber a visita de Onyx. Não se trata de crime, mas de falta de respeito ao trabalho dos senadores da CPI.
Para Omar Aziz, o problema é de Pazuello e Onyx. Para quem acompanha o desenrolar da CPI, vê outra coisa: uma tentativa de desmoralizar os “bravos” senadores que ousaram investigar o governo.
Ora, se o ex-ministro Pazuello está mesmo em quarentena, não poderia receber visita nenhuma, principalmente de uma pessoa que sabidamente trabalha para “melar” as intenções dos senadores que estão preocupados com o que ocorreu com o Brasil na pandemia.
Onyx Lorenzoni, por sua vez, não correria o risco de visitar Pazuello se não tivesse certeza de que ele não representa perigo sanitário algum. Portanto, ambos dão margem para que se levantem todas as suspeitas sobre a versão apresentada para suspender o depoimento de Pazuello no dia 5 deste mês.
Nessa dança de gato e rato, Pazuello, até aqui, levou a melhor. E levará todas se os senadores continuarem aceitando as artimanhas do ex-ministro como fatos normais e naturais.