Por Iolanda Ventura, da Redação
MANAUS – Hábitos de higiene pessoal antes ignorados, como lavar as mãos, podem se tornar corriqueiros com a pandemia do novo coronavírus. O costume faz parte do cotidiano da professora Mônica Augusto de Souza Taveira, 52, que viu nas máscaras uma forma de se proteger de outras doenças respiratórias comuns. Desde o primeiro caso do novo coronavírus no Amazonas, em março, são quatro meses de rotina de limpeza rigorosa.
Para Mônica Taveira, a máscara é uma proteção a mais que será difícil abandonar após a pandemia. “Em relação às máscaras, eu fico até com medo de passar essa pandemia e eu continuar usando porque é como se fosse uma proteção a mais. Nós não temos só a Covid, temos outras doenças que podem ser transmitidas pelo ar também, principalmente na nossa região”, diz.
Na casa da professora todos usam máscaras. “Lá em casa todos nós usamos, eu, meu esposo, minha filha. Às vezes, ele até esquece que está com a máscara. Nós procuramos sempre sair de máscara, carregamos mais de uma, dentro do carro tem máscara, na bolsa tem”, relata.
Na casa de Mônica, o álcool em gel virou um item de necessidade. “No meu carro eu procuro sempre ter o álcool em gel. Entrei no carro já vou diretamente fazer a higienização das mãos e do volante. Tudo o que eu tiver na mão eu já passo. Eu já tenho o hábito de carregar o álcool em gel, virou um item de necessidade”, afirma.
Fazer compras e guardar direto na dispensa hoje é impensável. O novo afazer doméstico de lavar todos os produtos se tornou essencial para a assessora parlamentar Silvania Balbi, 56, que usa álcool, vinagre e outros produtos para garantir uma boa higienização. Ir ao supermercado não está nos planos.
“Quando a gente pede compra do supermercado, é tudo pelo Whatsapp. Quando chega, eu passo álcool na mão, eu ponho a máscara, vou lá e recebo tudinho. Lá mesmo no portão eu já passo álcool, deixo tudo na garagem, tiro os sacos e jogo todos fora” explica Silvania.
No dia a dia de Mônica, as novas medidas de higiene não serão abandonadas. “Passando a pandemia, com certeza esses hábitos serão preservados. Porque são hábitos saudáveis, e você se protege não só de Covid, mas de muitas outras doenças que são transmissíveis através do ar”, afirma.
Segundo a psicóloga Michele Karon, a permanência dos hábitos é uma questão de influência. “O ser humano tem uma capacidade de ser influenciado pelo meio, então aquelas pessoas que viveram em um meio onde esse controle com a higiene era mais intenso, elas tendem após a pandemia a continuar com esses comportamentos de higiene. E os que não foram condicionados só tendem a manter o padrão de comportamento que sempre tiveram”, explica.
É o caso de Mônica. “Na verdade, os hábitos de higiene se intensificaram mais, porque eu já tinha certos cuidados antes da pandemia. Eu passei a ter mais cuidado em relação aos alimentos, aqueles que possuem embalagens descartáveis. Eu sempre higienizo quando eu chego em casa das compras”, diz.
Para a psicóloga Dilza Santos, esses hábitos tendem a permanecer e a continuidade, sem exageros, é benéfica. “É extremamente importante esse despertar, a limpeza se faz necessário não só em tempos de pandemia, esses novos hábitos de forma equilibrada contribuem para nossa saúde e de nossos familiares”, afirma.
Excessos
Karon alerta para a preocupação excessiva com a limpeza, que pode levar à ansiedade. “Em uma situação de pandemia, onde você está sendo posto obrigatoriamente em um isolamento social o medo acaba tomando conta do ser humano, e aí ele acaba ficando ansioso. Aí ele fica assustado, começando a querer controlar cada passo e movimento dele para que não pegue Covid. Só que aí o cérebro não consegue lidar com essa necessidade de controle”, pontua.
A psicóloga cita como exemplo comum a preocupação do indivíduo em lavar as mãos sempre que pega em algo, como é o caso de Silvania Balbi. “Quando estou em casa, porque estou trabalhando em home office, eu passo muito álcool na minha mão. A minha conta de água então subiu muito porque eu vivo lavando a minha mão, tudo que eu faço eu lavo a minha mão. Se eu for no fogão e voltar para a geladeira eu já lavo a minha mão”, relata a assessora.
A psicóloga Raquel Lemos afirma porém que nem todo cuidado excessivo pode ser considerado patológico, pois é normal que em situações de risco o ser humano fique ansioso. “A ansiedade faz parte da nossa natureza e nesse caso, há um motivo real para tal. Óbitos por conta da Covid, a falta da vacina, a perda do direito de ir e vir sem previsão de acabar entre outros fatores que potencializam os sintomas”, explica.
No projeto ‘Acolher é Preciso’ da Sejusc (Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania), que promoveu o atendimento psicológico para a prevenção de danos emocionais provocados na pandemia, os principais problemas relatados pelos que buscavam o atendimento individual era o sofrimento psíquico (ansiedade, depressão, solidão) em decorrência do isolamento social em si e aquele advindo de suas consequências imediatas, tais como o desemprego e conflitos no âmbito familiar.
Nos dados solicitados pelo ATUAL à secretaria, constam que 53 pessoas solicitaram o serviço individualizado, sendo 44 mulheres e nove homens. Destas, 16 informaram diretamente estarem ansiosas diante da possibilidade de contrair o coronavírus. A média de idade das pessoas atendidas foi 37 anos.
No caso de Silvania, essa preocupação maior tem uma razão clara. Além do marido de 74 anos, a assessora faz uso de medicação que a impede de ser tratada com qualquer medicamento. “Eu tomo uma medicação, que é um anticoagulante, então é assim, eu não posso tomar nada. Se eu foi no pronto socorro, eu não posso tomar uma injeção”, relata. Silvania não sai de casa se não for necessário e nem recebe visitas. “Visita na minha casa é lá no portão, não entra, não passa da garagem”, diz.
Segundo Lemos, a limpeza pode ser até uma forma de relaxar. “A limpeza dentro de casa pode ser vista até como uma forma de aliviar tensões e proteger sua família. Como também, mudanças de móveis, pinturas, entre outras coisas, podem mudar o ambiente e o humor de todos”, diz.
Para diferenciar um hábito saudável de uma possível compulsão, basta observar se está havendo sensação de desconforto. “Se te traz sensação de desconforto, se passou a ter rituais e repetições chegando a consumir horas do seu dia, sugiro desacelerar e se possível procurar ajuda de um profissional da área. Pacientes com transtornos, não sentem apenas preocupações, e sim são invadidos por sofrimento”, alerta.
De acordo com Dilza Santos, pessoas que já possuem uma pré-disposição é que correm mais riscos de desenvolver transtornos. “Não exatamente que essas mudanças possam levar a transtornos, nem todos desencadearão episódios neste contexto, podemos dizer que aqueles indivíduos que já tem uma pré-disposição para alguns transtornos, podem ser acometidos com alguns sintomas, mas é preciso investigar para se chegar a um diagnóstico”, orienta.
(Colaborou Murilo Rodrigues e Alessandra Taveira)