CURITIBA – Marcelo Odebrecht, herdeiro e ex-presidente do grupo que leva seu sobrenome, disse nessa quarta-feira, dia 1º, em depoimento à Justiça Eleitoral, que 4/5 de um total de R$ 150 milhões destinados pelo grupo para a campanha da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer em 2014 foram por meio de caixa 2. Segundo relatos, ele afirmou que a petista tinha dimensão da contribuição e dos pagamentos, também feitos com recursos não registrados ao então marqueteiro do PT João Santana. A maior parte dos valores destinados ao marqueteiro, conforme Marcelo Odebrecht, era feita em espécie.
O empreiteiro respondeu a todas as perguntas e apresentou documentos durante as quase quatro horas de depoimento à Justiça Eleitoral na ação movida pelo PSDB que pede a cassação da chapa reeleita. A audiência comandada pelo ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e relator da ação, Herman Benjamin, ocorreu na sede do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, em Curitiba.
Marcelo Odebrecht confirmou ter se reunido com o então vice-presidente Michel Temer durante tratativas para a campanha eleitoral de 2014, mas negou ter acertado diretamente com o peemedebista um valor para a doação de R$ 10 milhões ao PMDB.
De acordo com o empresário, as tratativas para a doação foram feitas entre o atual ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e então executivo da empreiteira Cláudio Melo Filho. Ele admitiu que parte dos pagamentos pode ter sido feita via caixa 2.
Conforme Marcelo Odebrecht, o valor acertado para a campanha presidencial da chapa reeleita foi de R$ 150 milhões. Deste total, de acordo com ele, R$ 50 milhões eram uma contrapartida à votação da Medida Provisória do Refis, encaminhada ao Congresso em 2009 – e que beneficiou a Braskem, empresa controlada pela Odebrecht e que atua na área de química e petroquímica.
‘Alerta’
As negociações, segundo o empreiteiro, eram feitas diretamente entre ele, Santana e o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. Na audiência, Marcelo citou, porém, um encontro com Dilma no México ocasião que, segundo ele, alertou à presidente que os pagamentos feitos ao marqueteiro do PT estavam “contaminados”, pois tinham origem em offshores utilizadas por empresários do grupo para o pagamento de propinas.
Ao detalhar a distribuição de recursos da empreiteira, Marcelo Odebrecht também citou pagamentos de “dezena de milhões” para partidos aliados. O jornal ‘O Estado de S. Paulo’ revelou que a Odebrecht deu, via caixa 2, cerca de R$ 30 milhões para que a chapa Dilma-Temer comprasse o apoio de cinco partidos na campanha eleitoral de 2014. Todo o recurso encaminhado à campanha constava em uma conta corrente controlada pelo empreiteiro.
No depoimento, Marcelo Odebrecht foi questionado também sobre o início da relação da empresa com o governo do PT. Ele disse que as primeiras conversas ocorreram em 2008, quando foi procurado para fazer doações para as eleições municipais daquele ano, especificamente para as que Santana estava trabalhando.
Delação
“Ele respondeu a todas as perguntas, foram quase quatro horas”, disse o advogado de defesa de Temer, Gustavo Guedes. De acordo com os advogados, o empresário confirmou o que já havia dito na delação premiada à força-tarefa da Operação Lava Jato. “Ele nem poderia dizer algo diferente”, afirmou Guedes.
Em despacho do dia 21 de fevereiro, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, declarou que “os deveres e compromissos assumidos pelos colaboradores aplicam-se a quaisquer esfera judicial”.
O herdeiro do Grupo Odebrecht foi preso em 19 de junho de 2015, durante a 14ª fase da Operação Lava Jato. Ele firmou um acordo de colaboração premiada e deve permanecer na carceragem da Polícia Federal em Curitiba até o fim deste ano.
A defesa de Dilma não se manifestou. Os advogados de João Santana e de Guido Mantega não foram localizados pela reportagem.
Bobo da corte
No depoimento, Marcelo Odebrecht disse que se sentia o “bobo da corte” do governo federal. Ao falar sobre a situação da empreiteira baiana que leva seu sobrenome, o ex-presidente do conglomerado demonstrou descontentamento por ser obrigado a entrar em projetos e empreendimentos que não desejava e bancar repasses às campanhas eleitorais, sem receber as contrapartidas que julgava necessárias.
Marcelo Odebrecht declarou que mantinha contato frequente com o alto escalão do governo – como Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda do governo Dilma Rousseff, com quem disse negociar repasses a campanhas eleitorais. “Eu não era o dono do governo, eu era o otário do governo. Eu era o bobo da corte do governo”, afirmou Marcelo Odebrecht, segundo relatos colhidos pelo jornal ‘O Estado de S. Paulo’. O empresário também se mostrou incomodado por divergências com seu pai, patriarca e presidente do Conselho de Administração do Grupo Odebrecht, Emílio Odebrecht, na forma de apoio ao governo.
Declarados
Em nota na sexta-feira, 24, Temer afirmou que, “quando presidente do PMDB, pediu auxílio formal e oficial” à Odebrecht. “A Odebrecht doou R$ 11,3 milhões ao PMDB em 2014. Tudo declarado na prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral” diz a nota.
(Estadão Conteúdo/ATUAL)