Parafraseando Karl Marx e Friedrich Engels, que em fevereiro de 1848, com a frase ‘Trabalhadores do mundo, uni–vos!’ conclamaram a união de todos os operários do mundo, no clássico Manifesto Comunista, apresentamos algumas reflexões acerca do Dia Internacional da Mulher celebrado neste 8 de março.
Primeiramente, não se trata de um dia de comemoração e sim, de mais um dia de luta pela garantia de direitos num mundo ainda muito marcado pelas desigualdades sociais, econômicas, políticas, culturais e de gênero.
A convocação à união de todas as mulheres é legítima e oportuna num contexto ainda muito marcado pela negação de direitos e pela misoginia que representa a repulsa, desprezo e o ódio contra as mulheres contribuindo assim para o crescimento dos casos de feminicídio que são as mortes de mulheres tipificadas pelos crimes de ódio motivados pela condição de gênero.
Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontam que em 2017 uma média de doze mulheres foram assassinadas por dia no Brasil. Isso sem considerar as subnotificações de feminicídio. A aversão ao sexo feminino, a misoginia, está diretamente relacionada com a violência que é praticada contra as mulheres em todo mundo e estreitamente relacionada com a ideologia patriarcal que delega o poder de decisão ao homem transformando a mulher num objeto destinada procriação e ao prazer masculino. Quando a mulher escapa deste controle, está sujeita a todo tipo de violência praticada pelo uso e abuso do poder conferido principalmente aos homens criados nos ditames da sociedade patriarcal que se acostumou a lidar com as mulheres numa relação de domínio e posse, como se fossem meros objetos ou mercadorias de uso e descarte.
Não bastasse a violência praticada pelos homens contra as mulheres, vem crescendo também a violência de mulheres contra outras mulheres, resultado das desigualdades de classe, raça, gênero e geração. Não obstante, a violência também pode estar relacionada à intolerância à diversidade religiosa.
A violência entre mulheres é uma realidade muito complexa, contraditória e de difícil abordagem. É complexa porque muitas vezes uma mulher se coloca contra a outra na disputa pelo amor de um mesmo homem ou de uma mesma vaga de trabalho.
É complexa porque é fruto de críticas superficiais e indecorosas entre mulheres, o que contribui para o enraizamento, a permanência e a reprodução dos estereótipos preconceituosos criados e alimentados historicamente por uma sociedade machista e patriarcal.
É contraditória porque, nas relações de poder e dominação marcadas pelas desigualdades sociais e econômicas, uma mulher pode se colocar contra a outra esquecendo-se de todos os laços que nos unem na perspectiva da sororidade. Ou seja, esquecemo-nos dos laços que nos unem pela empatia e companheirismo, na luta para alcançar objetivos comuns.
É de difícil abordagem porque não se reconhece esse tipo de violência. Mas, o sistema opressor, patriarcal e racista se vale de nossa desunião para nos manipular e dominar, nos colocando umas contra as outras sem nem mesmo nos darmos conta de nossa insensatez diante das estratégias de controle de nossas mentes e nossas ações.
O estado de exceção é perito quando o assunto é colocar uns contra os outros fragmentando todas as bases de resistência. A fragmentação, seja ela entre classes sociais, gêneros ou seguimentos étnico-raciais, faz com que as atenções se confundam e, enquanto páreas se atacam entre si, os verdadeiros controladores das relações de poder e dominação permanecem imunes às tenções e conflitos.
Nessa perspectiva, a convocação de Marx e Engels aos trabalhadores de todo o mundo se aplica perfeitamente às mulheres de todo o mundo. O apelo à sororidade entre todas as mulheres do mundo é um apelo ao fortalecimento dos laços que nos unem e nos tornam mais livres, decididas e “irmanadas” na mesma luta por direitos e dignidade num mundo marcado pelas desigualdades de um sistema econômico que estrategicamente nos coloca uns contra os outros.
O apelo à união entre todas as mulheres do mundo é legítimo e capaz de aliar na mesma luta mulheres brancas, negras, quilombolas, ribeirinhas, indígenas, jovens, idosas, magras, gordas, intelectuais, analfabetas, patroas, empregadas, empresárias, autônomas, desempregadas, professoras, alunas, camponesas, operárias das cidades e, assim por diante.
“Mulheres do mundo, uni-vos!” Porque unidas é que somos fortes. Não somos inimigas nem rivais, somos mulheres! E é isso que nos une na mesma luta para proteger nossos territórios e nossos corpos da usurpação da política centrada no lucro neoliberal e assentada no machismo institucional. Com essa consciência celebremos o dia internacional da mulher, neste 08 de março e em todos os outros dias até que a última de nós seja livre e participe da grande ciranda que reúne em festa e em alegre dança, todas as mulheres do mundo!
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