Por Pedro S. Teixeira, da Folhapress
SÃO PAULO – Pesquisadoras britânicas testemunharam cenas de bullying, assédio sexual e discurso abusivo contra crianças, no metaverso VRChat World. Esse mundo virtual permite conversar com estranhos de forma anônima, como é possível em salas de bate-papo e redes sociais da internet convencional.
Metaversos são espaços digitais que permitem interação entre múltiplos usuários – como se a rede social ganhasse uma versão tridimensional. O acesso a esses mundos é possível via computador, celular ou com dispositivos de realidade virtual.
As especialistas em tecnologias imersivas Catherine Allen e Verity McIntosh trabalharam com exemplos do Reino Unido, onde 9% da população acessa metaversos – dessa fração, 43% usa aparelhos de realidade virtual. Hoje, não há dados oficiais no Brasil sobre o acesso a óculos simuladores, segundo o Comitê Gestor da Internet.
Elas produziram o relatório “Safeguarding the Metaverse” (Resguardando o Metaverso, em tradução livre) para um instituto que tenta influenciar políticas públicas do governo britânico sobre tecnologia o IET (Instituto de Engenharia e Tecnologia, em tradução livre). O estudo foi apresentado no Dia da Internet Segura (7 de fevereiro).
De acordo com o material, a supervisão dos pais é mais difícil em aparelhos de realidade virtual do que em navegação na internet em telas. Uma solução é usar os óculos apenas com a transmissão para televisão ativa.
Allen e McIntosh recomendam, ainda, que crianças evitem o uso prolongado de aparelhos de realidade virtual e não os usem duas horas antes do sono. Desligar o aparelho de forma repentina também é contraindicado.
McIntosh disse à reportagem que alguns metaversos, como Fortnite e Roblox, têm boas políticas de proteção a crianças, quando comparados ao VRChat. De acordo com ela, o acesso às plataformas deve ser planejado pela família para equilibrar autonomia e segurança.
A Meta, assim como outros fabricantes de dispositivos de realidade virtual, recomenda o uso dessa tecnologia apenas para crianças maiores de 13 anos, atendendo a legislações de países desenvolvidos como Estados Unidos e Inglaterra.
Óculos simuladores ainda não estão em venda oficial no Brasil, embora seja possível encontrar em marketplaces a versão importada do Meta Quest 2 por preços em torno de R$ 3 mil nos Estados Unidos, custa US$ 399 (R$ 2.076, na cotação atual).
Procurada, a Meta, indicou a leitura de seu manual de controle parental no óculos de realidade virtual Meta Quest 2. A funcionalidade permite o bloqueio de aplicativos, limitação do tempo de uso, acesso a lista de seguidores e habilitar notificações de download de programas.
A big tech também recomendou ler uma publicação sobre privacidade no aparelho. O Meta Play 2 pode captar informações dos movimentos dos olhos, o que pode ser desativado, de acordo com a vontade do usuário.
O diretor de prevenção e atendimento da organização Safernet Brasil Rodrigo Nejm defende que noções de letramento midiático em realidade virtual e aumentada devem ser ensinadas nas escolas. “As crianças podem crescer nesses ambientes, desenvolver habilidades, mas precisam entender as situações de risco”.
A escola de programação SuperGeeks, por exemplo, usa Roblox para ensinar programação a crianças e adolescentes. Esse metaverso voltado ao público infantil permite o desenvolvimento de novos jogos e programas dentro do mundo virtual.
Conforme a coordenadora da pesquisa TIC Kids Online Brasil, Luisa Adib, o acesso aos aparelhos e à informação é desigual no país. Enquanto, quase 100% das crianças de 9 a 17 anos com renda familiar acima de R$ 7.100 já tiveram acesso à internet, esse número cai para 86% para as crianças em famílias com renda até R$ 2.900.
No Brasil, as tecnologias de realidade virtual precisam atender às determinações do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), ao Marco Civil da Internet e às diretrizes do Comitê dos Direitos da Criança da ONU (aprovadas no Comentário nº25, de 2021). Os direitos dos menores de idade devem ser respeitados também em ambientes virtuais.
Os especialistas ouvidos pela reportagem indicam que, pela norma brasileira, a classificação indicativa para dispositivos de realidade virtual e metaverso estaria em 12 anos, como é para as redes sociais.
O desafio é fazer essa norma ser respeitada. No país, 92% das crianças e adolescentes de nove a 17 anos acessam redes sociais.
Nejm, da Safernet, aponta que criança e responsáveis precisam desenvolver um repertório geral de cibersegurança. “É possível adaptar esses fundamentos à plataforma ou programa da vez, para evitar vazamentos de dados, discurso de ódio e superexposição”.
Realidade virtual para crianças
Limitar o uso de dispositivos de realidade virtual por crianças ao máximo de 15 minutos diários
Em sessões mais longas faça pausas a cada 15 minutos
Não deixe o aparelho de maneira muito rápida ou inesperadamente
Sempre afaste móveis e objetos
Não deixe crianças usar realidade virtual sem supervisão e sempre que possível use a função de reproduzir as imagens do aparelho
É difícil para adultos supervisionar crianças
Não use realidade virtual uma ou duas horas antes do sono, porque pode atrapalhar o sono
Inclua realidade virtual na administração de tempo de tela da família
O relatório sobre segurança no metaverso, diz que essas práticas são indicadas pelos próprios fabricantes.
Controle parental no Meta Queste 2
Os adolescentes precisam convidar os pais a se conectarem a conta Meta vinculada ao dispositivo. Os pais também podem convidar o adolescente a participar do aplicativo para celular Family Center, também da Meta. Mais informações sobre o programa podem ser consultadas neste link: https://familycenter.meta.com/ .
Os pais podem, então, autorizar acesso a aplicativos, cuja classificação indicativa esteja além da idade do jovem. É possível também bloquear aplicativos que seriam permitidos.
Os pais podem também saber quando os filhos compram aplicativos e consultar a lista de amigos indicada no aparelho de realidade virtual.