Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – O ISS (Imposto Sobre Serviços) pago pela Eneva referente a exploração de gás natural no Campo de Azulão, na Bacia do Amazonas, é objeto de disputa entre os municípios de Silves e Itapiranga. O primeiro, que atualmente recolhe o imposto, recorreu à Justiça para impedir o vizinho de pleitear parte do imposto.
A empresa começou a exportar o gás no Campo de Azulão para abastecimento da térmica de Jaguatirica, em Roraima, em abril do ano passado. À época, o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), disse que a operação geraria ISS para o município e ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) para o governo do estado.
Em audiência realizada em agosto do ano passado, o advogado Eduardo Karam de Moraes, que representa o município silvense, afirmou que representantes das duas cidades se reuniram em abril. Na ocasião, técnicos de Itapiranga apresentaram estudo que inclui o empreendimento no território deles e pleitearam 50% do imposto.
Para Moraes, no entanto, outro estudo encomendado por Silves mostra o contrário. “Nós realizamos um estudo técnico e o estudo foi na contramão do estudo que eles apresentaram. Então, o empreendimento da Eneva está totalmente dentro da divisão territorial de Silves. Não consta nada dentro do município de Itapiranga”, disse o advogado.
Em agosto de 2021, a juíza Tânia Mara Granito, da Vara Única da Comarca de Itapiranga, rejeitou o pedido para impedir os representantes de Itapiranga de cobrarem o ISS da Eneva. O município de Silves recorreu da decisão e o caso foi parar no gabinete do desembargador Abraham Campos Filho, do TJAM (Tribunal de Justiça do Amazonas).
Ao analisar o recurso de Silves, o desembargador também negou o pedido contra Itapiranga. Campos Filho alegou que o caso é “complexo” e que é necessária a produção de prova técnica “a fim de elucidar a questão”. Ele também pediu que MP-AM (Ministério Público do Amazonas) se manifestasse sobre o caso.
Em fevereiro deste ano, o procurador de Justiça Pedro Bezerra Filho afirmou que somente a Eneva pode reclamar da cobrança do imposto por Itapiranga. “Quem está sendo ameaçado de dupla cobrança pelo mesmo tributo é a empresa Eneva. Portanto, quem deveria pleitear em juízo para defender interesse próprio seria a empresa e não o ente municipal [Silves]”, disse.
“Equívoco”
Os advogados de Silves sustentam que o estudo apresentado por Itapiranga, elaborado pelo engenheiro Raimundo Neidelande Martins de Araújo, contém “equívoco” ao traçar a linha divisória entre as duas cidades. Esse estudo técnico mostra que 84% do empreendimento da Eneva está no território de Itapiranga e apenas 16% em Silves.
O município silvense alega que o trabalho do engenheiro “vai totalmente de encontro à divisão territorial balizado” na Lei 1.707/85, que estabelece que a linha demarcatória entre os municípios “repousa sobre o divisor de águas entre os Rios Urubu e Uatumã”. Silves apresentou outro estudo que contesta a delimitação elaborada por Araújo.
“Restam patentes as distorções apresentadas nas peças técnicas pelo Agravado, donde se verifica o afastamento da posição da linha divisória traçada para nível muito inferior de elevação quando em cotejo com o que fora estabelecido na Lei de criação do Território do Município de Silves”, diz trecho da ação movida por Silves.
Os advogados de Silves apresentaram um mapa que, segundo eles, é “a posição de fato da linha divisória, resultante da interpretação técnica do especificado na Lei nº 1.707/85, que demarcou o exato ponto divisor entre os Municípios de Silves e Itapiranga”. O mapa coloca o empreendimento totalmente na área silvense.
Cobrança
Para o advogado Luiz Augusto Porto, que representa Itapiranga, o pedido de Silves fere a Constituição Federal, que prevê que “ninguém pode fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei”. Além disso, segundo ele, os municípios “são entes autônomos” e o pedido de Silves tenta interferir na administração de Itapiranga.
Porto afirmou que o Município de Itapiranga está disposto a negociar com Silves para solucionar a questão de forma amigável. “Nós temos total interesse em conversar com o município de Silves para que nós solucionemos essa questão, inclusive, administrativamente”, afirmou o advogado.
De acordo com Porto, as alegações de Silves contra o engenheiro que produziu o estudo para Itapiranga é “deselegância”. “É técnico de pesca, sim, mas é gestor ambiental geomensor, ou seja, tem capacidade técnica, tal qual o doutor Tadeu, para atuar em qualquer caso da espécie. É até deselegante do colega desmerecer o trabalho do nosso técnico”, disse Porto.
A reportagem solicitou mais informações da Eneva e da Prefeitura de Silves, mas nenhuma resposta foi enviada até a publicação desta matéria. A reportagem não conseguiu contato com a Prefeitura de Itapiranga.