Por Daniela Arcanjo, José Marques e Fábio Zanini, da Folhapress
SÃO PAULO – Em meio à repercussão negativa do endosso do presidente Jair Bolsonaro às manifestações contra o Congresso no próximo dia 15, movimentos que organizam os atos afirmam que não defendem pautas autoritárias, como o fechamento do Congresso e do STF (Supremo Tribunal Federal) ou intervenção militar. No entanto, alegam que não têm como controlar as pessoas que se posicionam a favor desses temas em suas redes sociais ou nas ruas.
Apesar de não ser o posicionamento dos organizadores dos movimentos, nas redes a discussão avança entre os seguidores e chega a temas como o fim do Supremo e a defesa de um novo AI-5, ato que iniciou o período mais repressivo da ditadura militar.
A manifestação convocada para capitais de todo o país é capitaneada por movimentos bolsonaristas como o Nas Ruas, Avança Brasil, Do Povo Brasileiro e outros com nomes similares, como Brasil Conservador, São Paulo Conservador e Movimento Conservador.
Todos têm dito que a principal pauta é a defesa das bandeiras do governo Bolsonaro, que para eles vem sendo impedido de governar pelo Congresso. Pedem, por exemplo, “não ao parlamentarismo branco” e “não à chantagem do Congresso”.
Movimentos menores que pregam abertamente o AI-5, como um chamado Patriotas Lobos nas Ruas, têm dito que não vão à manifestação porque acham que os grupos de direita só querem “levantar seus representantes para entrar na política”.
Os atos estavam previstos desde o fim de janeiro com a bandeira da defesa da prisão após a condenação em segunda instância, mas acabou mudando de pauta para apoio a Bolsonaro e encorpando insinuações autoritárias.
A convocação foi reforçada após a fala do general Augusto Heleno, chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), em que acusou o Legislativo de fazer chantagem. “Não podemos aceitar esses caras [parlamentares] chantageando a gente”, disse, em frase captada em transmissão ao vivo do Palácio do Planalto.
A fala de Heleno aconteceu em um momento em que o governo tinha dificuldade em chegar a um acordo sobre a divisão do dinheiro dentro do chamado Orçamento impositivo e vinha em atritos com o Congresso.
Um dos defensores de Bolsonaro na Câmara, deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP), acredita que o Legislativo deve ser a entidade mais cobrada nos atos.
Para ele, o objetivo da manifestação deve ser “mostrar para o Congresso que a população está de olho, que quer que o governo execute os seus planos e que o Congresso seja amigo do governo nesse processo”. “O Congresso surrupiou R$ 30 bilhões e removeu das contas do Executivo, que já estavam comprometidos com um volume de gastos. Não é um golpe ainda, mas uma tentativa de enquadrar o Executivo numa sinuca”, afirma Luiz Philippe.
Ele vê “uma mobilização no Congresso de partidos, deputados e senadores, que bolaram uma estratégia para enquadrar um possível pedido de impeachment”.
Os líderes dos movimentos que irão às ruas no dia 15 também pretendem concentrar suas críticas nos entraves que o Congresso impõe para aprovar temas caros ao Executivo.
Edson Salomão, que coordena o Movimento Conservador, afirma que o atual presidente é o “que mais sofreu derrubada de vetos pelo Congresso” e cita episódios como a “retaliação ao pacote anticrime” e a perda de validade da medida provisória que criou a carteira de estudante digital.
Salomão ressalta que nunca foi a bandeira do seu movimento a defesa de medidas autoritárias. “Nós sempre repudiamos intervenção militar, nós somos contra a intervenção militar, nós somos contra qualquer tipo de atitude de invasão de Congresso, sempre repudiamos isso”, afirma. “Agora, se você está nas redes sociais e faz uma publicação convocando o povo para ir às ruas para demonstrar apoio a Jair Bolsonaro, qualquer pessoa entra e comenta o que quiser. Eu não tenho controle sobre isso”.
Ele também diz que os movimentos não devem ser responsabilizados pelos posicionamentos das pessoas que vão a manifestações defendendo esses temas, como vem ocorrendo nos últimos anos. “Eu vou colocar cabresto nas pessoas? Não queiram responsabilizar os movimentos pelos indivíduos que vão às ruas e falam qualquer besteira e aí (dizer que) ‘é o movimento que está incitando isso’. Nós vamos com a nossa proposta nas ruas, mas ela é aberta e vai qualquer pessoa”.
Ted Martins, integrante do Movimento São Paulo Conservador, lembra que as manifestações já estavam marcadas antes da fala do general Heleno e que a reivindicação inicial era a prisão após condenação em segunda instância. “Como essa pauta não emplacou, e em virtude dos últimos acontecimentos, nós decidimos, principalmente pelos áudios vazados do general Heleno, entendemos que neste momento seria importante nós irmos para as ruas demonstrar o nosso apoio ao presidente Jair Bolsonaro”, afirma ele.
Da forma que as instituições estão operando, diz Martins, elas estão disfuncionais. Para ele, a culpa não recai sobre o presidente, cujos “atos, que são republicanos, precisam ser respeitados”, mas sobre os outros Poderes. “Por anos, (o Congresso) está viciado em um modelo de governo, de Parlamento, de relacionamento com os demais Poderes. Há um vício, ele precisa tomar um choque de realidade. Afinal de contas, o Bolsonaro representa a ruptura de um sistema todo”, diz.
Cargos de confiança a políticos do DEM e do MDB seriam as provas de que o presidente está disposto a dialogar. “O DEM, partido do presidente da Câmara Rodrigo Maia, é o partido que tem os ministérios mais privilegiados. O líder do governo no Senado é do MDB. Então você vê que, por parte do governo, há uma disposição para sentar e dialogar”.
Quando questionado sobre eventuais manifestações autoritárias durante o ato, diz que “não tem como controlar o comportamento dos indivíduos”. “Se alguém aparecer com esse tipo de comportamento e causar tumulto, nós chamaremos a polícia e pediremos, educadamente, para a pessoa se retirar”, afirma ele.
Davy Albuquerque, fundador do Movimento Brasil Conservador, diz que é ativo nas redes sociais e viu poucas manifestações autoritárias na internet. Ele vê o Congresso como “um grande entrave para o presidente” e diz ser necessário dar legitimidade a Bolsonaro e pressionar os parlamentares que estariam “contra o povo”.
“Legitimidade qualquer pessoa, qualquer político, precisa o tempo inteiro. Não é só no primeiro ano do mandato, no segundo, é o tempo inteiro. A partir do momento que ele perde a legitimidade, ele perde o real motivo de estar no cargo em que ele está”, afirma.