Nesta semana, o ex-governador, prefeito, deputado federal e senador da República faria 90 anos de idade. O setor produtivo do Amazonas lhe deve muita consideração e agradecimento. Nos anos 80, na volta de seu exílio, encontrou meia dúzia de empresas desestimuladas e a repensar seus investimentos na região. Ele tratou não apenas de convidar seus dirigentes, debater as dificuldades e pedir sugestões de encaminhamento. O mesmo se deu no setor de varejo, quando acordos escusos firmados com o Paraguai implodiram a Zona Franca Comercial no virada dos anos 80. No setor agrícola, embora tenha estimulado a importação desonerada, desobrigou empresas de foco eletrônico a investir em agricultura.
Em suma, Gilberto mantinha as portas de seu gabinete para debater o fortalecimento do Polo Industrial de Manaus a qualquer custo. Prova disso foi o fato de ter encontrado uma dezena de empresas desanimadas no início dos anos 80 e ter conseguido implantar 263 indústrias no Distrito Industrial. Em homenagem a este ilustre companheiro, publicamos trechos de seu livro “Amazônia Terra Verde Sonho da Humanidade”, uma publicação que reúne suas teses sobre a Amazônia, intuições e premonições sobre nossos desafios, e sobre as razões do atraso, a mentalidade tacanha e subserviente que nos impede de alçar o panteão dos países desenvolvidos, ou seja, civilizados. Confira um trecho.
Síndrome de Colônia
Infelizmente o Brasil vive ainda a síndrome de colônia,
ou procede como se assim o fosse. Quer dizer, não temos.
sido capazes de avaliar objetivamente a alternativa de
exploração responsável de nossas potencialidades.
Copiamos, de segunda mão, modelos e condutas que não
consideram nossas especificidades de país que tem
dimensões continentais e com potencialidades excepcionais.
Não é à toa que o brasileiro pensa que um artigo é bom só
pelo fato de ser importado. Freqüentemente as pessoas vão
ao exterior, compram um excelente par de sapatos de couro
de crocodilo africano, pagam uma fortuna e, ao chegarem
em casa, descobrem que se trata de um artigo genuinamente
nacional, feito com couro de jacaré brasileiro, levado de
contrabando por falta de regulamentação oficial da caça e
sua comercialização.
Investimento pífio em C&T
Com esse raciocínio, nossa conduta como país é sempre
reativa. Tomamos posição costumeiramente em resposta às
pressões internacionais, pondo em segundo plano os interesses
de nossa gente. Somos incapazes, ao que parece, de olhar o país
de nosso ponto de vista, para constatar, por exemplo, que não
sairemos do estágio subdesenvolvido em que estamos enquanto
aplicarmos apenas 0,6 de nosso Pffi (Produto Interno Bruto)
em ciência e tecnologia, do qual somente 0,005 é destinado a
toda a região amazônica Essa postura de colônia faz com que
pensemos a Amazônia conforme os parâmetros usados pelos
alemães para pensar a Floresta Negra, que nada mais é do que
um pequeno bosque se comparada às nossas florestas.
Manejo florestal Sustentável
Na Europa se maneja a floresta historicamente, a despeito
de ela ficar vários meses sob a neve e em condições
climáticas extremamente adversas ao seu crescimento. A
legislação ambiental brasileira estabelece parâmetros de
manejos tão ou mais rigorosos do que aqueles adotados pelos
tradicionais madeireiros europeus, canadenses ou norte-
americanos. Com uma cobertura territorial tomada por lagos
e uma área para exploração de produtos florestais muito
menor que o menor município do Estado do Amazonas, a
Finlândia tem uma exportação anual desses produtos que
alcança 8 bilhões de dólares.
Somos tão reativos que uma passeata medianamente
organizada em Amsterdã por ecologistas desinformados
sobre falsas queimadas na Amazônia pode provocar
alterações nos rumos da política ambiental brasileira.
Silvicultura, sustentabilidade e prosperidade
Uma encrenca fabricada pelos interesses internacionais
pode ilustrar o que eu estou falando. É o caso do mogno
da Amazônia. Atinge 80 milhões de dólares a exportação
anual dessa espécie, da qual o Brasil é o maior fornecedor.
Só a Grã-Bretanha importa mais de 50 do mogno
extraído da floresta amazônica. No entanto, a gritaria
européia, especialmente a inglesa, provocada por algumas
entidades ambientalistas, a despeito de não conseguir
restringir de fato o volume de mogno comercializado,
atingiu de modo fulminante a economia amazônica. Quem
sai lucrando? Os Kaiapó? A floresta amazônica? O caboclo
que se embrenha na floresta por dois meses para cortar
madeira? Absolutamente não! Todas as vezes que essas
organizações saem em manifestação de defesa do mogno,
o preço interno do metro cúbico despenca. Ou seja, mais
uma vez ganha o comprador europeu e mais uma vez o
preço de nossa matéria-prima se reduz. A quem interessa
essa gritaria do alarmismo internacional provocada pelos
ingênuos duendes da floresta?
Os bancos do Central Park
Recentemente houve uma confusão em Nova Iorque
porque a prefeitura decidiu trocar os bancos do Central
Park. Passeatas, manifestações, protestos sob o argumento
de que os novos bancos a serem colocados representariam
a derrubada de milhares de hectares de florestas na
Amazônia para se conseguir o mogno necessário. Ou seja,
a devastação, já em curso, seria consolidada. Soube-se mais
tarde que toda essa gritaria fora encomendada e financiada
por uma indústria local de plásticos, interessada em ganhar
a concorrência utilizando produto similar à madeira.
A tragédia chamada Balbina
Quem conhece os estragos ambientais provocados pela
construção de Balbina facilmente concluirá que, usando
apenas parte dos recursos nela investidos, teríamos menos
danos se, em seu lugar, fossem feitas usinas de carvão vegetal
para gerar a mesma quantidade de energia. E com a vantagem
da geração permanente de empregos, o que não se dá nas
hidrelétricas. Na segunda hipótese teríamos o benefício
adicional da renovabilidade da floresta, embora não esteja aí
nossa principal opção energética. Sugiro, também, a título
de intuição cabocla, uma prospecção mineral no subsolo onde
está construída Balbina, quem sabe não encontremos a
explicação 'para essa tão descabida aventura ...
Hoje para construir usinas de gás natural com capacidade
quatro vezes superior à de geração energética da hidrelétrica
de Balbina, estima-se um orçamento de 300 milhões de
dólares, com danos ambientais mínimos e com capacidade
para abastecer por cem anos a cidade de Manaus, utilizando-
se apenas o gás natural da região de Urucum, situada na "
calha do rio Juruá, cuja potencialidade está avaliada pela
Petrobrás em 55 bilhões de metros cúbicos.
Além de Urucum, temos uma quantidade extraordinária
de gás natural, que se constitui na alternativa ecologicamente
mais correta entre os combustíveis fósseis e muito promissora
do ponto de vista econômico. O sol, porém, é a nossa maior
fonte de energia. Excetuando algumas formas de energia,
como a nuclear e a das marés, é do sol que provêm as
principais fontes de que dispomos, renováveis ou não: a
eólica, a hidrelétrica, os combustíveis fósseis e sobretudo a
biomassa, nossa tradição histórica e natural de energia.