Do Estadão Conteúdo
BRASÍLIA – O ex-diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Adalberto Tokarski, que comandava a agência até fevereiro, afirmou ao Ministério Público Federal (MPF), em Brasília, que membros da diretoria e da gerência da Antaq atuaram de forma abusiva e pessoal em decisões atreladas à navegação entre portos brasileiros, com ações para prejudicar uma nova empresa de cabotagem, favorecendo um grupo que já atua no setor.
O Estado teve acesso exclusivo ao depoimento prestado por Adalberto Tokarski no dia 23 de junho de 2017, quando ele ainda exercia o cargo de diretor-geral. O vídeo faz parte do inquérito sigiloso instaurado pelo núcleo de combate à corrupção do MPF, que investiga a denúncia de formação de cartel e a atuação de servidores públicos da agência no setor de cabotagem.
A suspeita é que funcionários da agência teriam atuado em conjunto para reduzir a competitividade do setor, um mercado que movimenta cerca de R$ 10 bilhões por ano.
A autora da ação é a empresa carioca Posidonia Shipping, que acusa a Antaq e demais empresas do setor de dificultarem sistematicamente a sua entrada no mercado desde 2013, quando passou a atuar no transporte marítimo de carga.
Em seu depoimento, Adalberto Tokarski, que não é alvo da denúncia, admite que outros membros da agência teriam atuado em diversas ocasiões para prejudicar a empresa Posidonia, com a emissão constante de multas em volume acima da média de outras empresas, atrasos injustificados de emissão de licenças de afretamento e publicação de ofícios que restringiam a atuação da companhia.
Trechos do depoimento
“Sobre essa empresa, eu vejo assim, acabou se abrindo processos diferentes de fiscalização. Não tenho dado de outra (empresa) que tenha sido dessa forma”, comentou. “Acabaram sendo abertos vários processos junto a essa empresa, até acredito que bem mais que a média geral”, disse Adalberto Tokarski. “Acho, no meu entendimento, a gente claro, às vezes… um posicionamento pessoal contrário a essa empresa, isso de forma… ao longo dos anos, está dando para perceber isso”.
Resolução
Um dos temas mais polêmicos envolvendo a Antaq e as empresas de cabotagem diz respeito a uma resolução publicada pela agência em 2015. A Posidonia alega que a norma restringiu seu acesso ao limitar a contratação de embarcações internacionais. A Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), do Ministério da Fazenda, analisou o caso e concluiu que, de fato, a resolução restringiria o mercado. Nesta semana, o Tribunal de Contas da União (TCU) também chegou à mesma conclusão e determinou a suspensão dos efeitos da resolução.
Procurada, a Antaq, seus diretores e Adalberto Tokarski não se manifestaram até a publicação deste texto. Por meio de nota, o Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma) ao qual a Posidonia não é vinculada, declarou que não teve acesso ao processo e, por isso, não pode comentar. A Posidonia declarou que “os navios brasileiros precisam ter prioridade e preferência e é por isso que investimos em frota realmente brasileira mas, na sua indisponibilidade, todos os armadores tem de ter iguais oportunidades de buscar no mercado internacional a embarcação adequada”.