O caminho para uma coexistência lícita e segura, numa sociedade livre, frente ao contexto de banalização violência, de expressivos apelos aos vícios (em especial ao do álcool, das drogas, da corrupção, do consumismo de ostentação) e da complexa rede da economia do crime, exige necessariamente um processo de socialização assentado numa educação para segurança.
Educar para segurança é formar cidadãos para a convivência social livre e responsável, com vistas a uma cultura de justiça, solidariedade e paz. Essa cultura é condição para uma ordem social estável, na qual a sociedade possa prosperar e se desenvolver numa perspectiva de inclusão lícita. Nesse sentido, educar para segurança visa também promover a justiça social numa sociedade de liberdade, trabalho e crescimento sustentado.
Esse tipo de educação não é atribuição apenas das escolas e universidades. A educação para segurança começa no lar, no diálogo aberto entre os membros da família, expandindo-se à convivência em comunidade, no meio social e no ambiente de trabalho. Daí a relevância da formação para a paternidade e a maternidade responsáveis, pois imprimem o ritmo e a direção das famílias estruturadas e sustentáveis. Impressiona o fato de que para qualquer ofício ou ocupação se exija um mínimo de formação ou preparo ou habilidade, mas quando se trata de ser pai ou mãe a coisa acontece de qualquer jeito, sem maior informação nem orientação, quase em estado bruto, num primitivismo cognitivo bárbaro. Resultado: relações afetivas embrionariamente sobrecarregadas, formação incompleta ou insuficiente, subemprego ou desemprego, famílias desestruturadas, menores abandonados, violência doméstica e sexual, gravidez precoce, iniciação infanto-juvenil na economia do crime… Histórias de vida amputadas que se reproduzem num ciclo de horrores sociais.
Espaços por excelência da educação para segurança são também os presídios, que deveriam aplicar programas de formação e ocupação integral aos detentos, sejam eles condenados ou provisórios. Qualquer que seja o tempo no qual estejam expostos à cultura do crime, enquanto estiverem no cárcere, os presos precisam ser treinados e disciplinados para a coexistência lícita e segura na sociedade aberta, com vistas a atender aquilo que a LEP (Lei de Execução Penal brasileira), em seus artigo primeiro, chama de “harmônica integração social do condenado e do internado.” Sem essa perspectiva de ressocialização ou resignificação dos presos, não há horizonte de segurança dentro nem fora dos presídios, uma vez que não há como evitar que os estabelecimentos penitenciários convertam-se em agências ou escritórios do crime quando os presos fazem o que querem por não terem nada o que fazer. A ociosidade nas prisões, já está mais que demonstrado, serve apenas para reproduzir a cultura criminógena e fortalecer a atividade criminosa.
A educação para segurança é um processo que requer a colaboração de todos no enfrentamento às distintas formas de violência e de vício, aos apelos do consumismo irresponsável e à prática da corrupção, pois o que está em questão é a liberdade e a justiça na vida em sociedade. Trata-se da responsabilidade de todos para com o rumo que toma a vida em coletividade. Uma questão que passa pelo mútuo desenvolvimento humano, pessoal e social, numa perspectiva de coexistência livre, lícita, justa e solidária. Uma sociedade segura não se constrói sem uma educação para segurança, assentada na cidadania e na dignidade humana. Uma condição que requer o efetivo e permanente compromisso individual e coletivo.
Nesse sentido, a ideia de cidadania e vida digna é fundamental à educação para segurança. Trata-se formar para o exercício de deveres e usufruto de direitos, que coexistem reciprocamente nas relações interpessoais, sociais e institucionais. O cidadão vive segundo direitos e deveres, não de privilégios. Uma lógica de vida assentada na busca de privilégios, principalmente quando diante da frustração do direito de outrem, é a deformação do princípio da cidadania e a destituição do sentido de dignidade humana. Uma vida de privilégios é o caminho para a corrupção, para a degradação ética e para a anticidadania, conduzindo o indivíduo a se portar de uma forma indigna perante a si mesmo, aos outros e à sociedade. Viver de privilégio acaba por se constituir num vício que se traduz, no cotidiano, no levar vantagem a qualquer custo, inclusive violando direitos alheios. É a “ética” do malandro, do jeitinho e da armação de esquemas, coisas que afrontam a cidadania e a própria dignidade humana. O cidadão cumpre seus deveres e usufrui seus direitos sem exorbitar, sem omitir e nem agir com desonestidade em relação aos outros. Apenas usufruir de direitos sem dar a contrapartida no cumprimento de deveres é lançar-se na lógica do crime, pois a cultura criminógena reforça isso: direitos sem deveres, obter sem merecer, usufruir esmagando o direito alheio, inclusive os direitos fundamentais: vida, saúde, privacidade, honra, propriedade… A concepção de educação para segurança assenta-se, portanto, nos imprescindíveis princípios éticos e constitucionais, pilares morais e jurídicos, da cidadania e da dignidade da pessoa humana.
Viver de forma livre, justa e solidária somente é possível quando há uma base de respeito, licitude, trabalho e confiança entre as pessoas, em todos os espaços sociais e esferas institucionais. Não é possível viver de forma digna sem moralidade. E para isso é preciso educar. Formar cidadãos com nível de consciência e atitude capaz de coexistir e se organizar de modo a edificar uma sociedade livre, desenvolvida e segura, que promova a dignidade da pessoa humana. Portanto, é na perspectiva da vida digna e da cidadania que se funda a educação para segurança.
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