Por Igor Gielow, da Folhapress
SÃO PAULO – A Rússia afirmou pela primeira vez que um drone estratégico de vigilância americano sobrevoou a ilha da Cobra, tomada por Moscou no mar Negro, enquanto os ucranianos tentavam retomá-la, na segunda (20).
Ainda que a presença de artefatos de espionagem da Otan, a aliança militar ocidental, na região na Guerra da Ucrânia não seja novidade, os russos nunca haviam dito ter identificado um deles durante um ataque.
Sem fazer a acusação diretamente, porque isso poderia levar a uma escalada indesejada por ambos os lados por motivos de Terceira Guerra Mundial, a divulgação sinaliza o que todos os analistas militares sabem: os EUA têm auxiliado Kiev com informações de inteligência. A ação não foi negada pela Ucrânia.
O avião não tripulado em questão era um Global Hawk, identificado pelos russos como sendo a versão operada pela Força Aérea, o RQ-4, capaz de voar por mais de 34 horas a altas altitudes, monitorando com radares e sensores uma área do tamanho da Coreia do Sul a cada missão.
Moscou diz ter havido uma barragem de mísseis e ataques com drones turcos de Kiev contra a ilha, cuja tomada foi palco da famosa e algo mitificada cena na qual soldados ucranianos de uma guarnição xingaram por rádio a tripulação do navio de guerra Moskva, no início da guerra.
O Moskva viria a ser afundado semanas depois, na maior perda naval russa desde a Segunda Guerra Mundial -ou por mísseis antinavio ucranianos, ou por um incêndio a bordo, como dizem os russos. A ilha foi palco de outros ataques, e na semana passada um rebocador russo foi afundado perto dela.
Segundo o Ministério da Defesa em Moscou, foram derrubados 13 drones ucranianos, 4 mísseis Totchka-U e 21 foguetes lançados da costa por sistemas Uragan. Logo depois, a Ucrânia retaliou atacando duas plataformas de prospecção de gás perto da Crimeia, anexada sem conflito por Vladimir Putin em 2014.
O Global Hawk não estava sozinho: sites de acompanhamento de aeronaves registraram ao menos outros cinco aviões-espiões americanos e britânicos na região do mar Negro na segunda. Mas sua presença sobre a região em conflito e, principalmente, a divulgação seca pelos russos chamaram a atenção.
Nos primeiros meses da guerra, membros da comunidade de inteligência americana divulgaram para jornalistas seu papel em fornecer orientação para ataques de Kiev, inclusive o que destruiu o Moskva ou que resultaram na morte de generais russos. Isso obviamente levou a um aumento da tensão com Moscou, e o próprio presidente Joe Biden ordenou que eles parassem de contar vantagem.
O mar Negro voltou a ver ação nesta terça (21). Em retaliação pelo ataque às plataformas, a Rússia despachou navios da frota em Sebastopol para disparar mísseis de cruzeiro contra a região de Odessa, o maior porto da Ucrânia. Um aeroporto e hangares com drones turcos TB2 Bayraktar foram destruídos.
É, contudo, um teatro secundário da guerra. O foco segue no Donbass, no leste do país, onde os russos tomaram mais uma cidade em preparação para o que Kiev afirma ser um grande ataque para tentar retomar toda a província de Lugansk até o próximo domingo (26).
Desde 18 de abril, Moscou redirecionou seu esforço para o leste, após ter fracassado em derrubar o governo de Volodimir Zelenski com um ataque por várias frentes, mas mal coordenado, iniciado em 24 de fevereiro. Agora, está perto de conquistar a província que, com a de Donetsk, compõe o Donbass.
Se tomar Lugansk, o território remanescente sob poder de Kiev em Donetsk será o próximo alvo. O que não se sabe é se um sucesso ali levaria Putin a se dar por satisfeito, dado que a tomada da região leste do território ucraniano é seu objetivo declarado a esta altura da guerra.
O chefe do Kremlin já domina o sul da Ucrânia até perto de Odessa, tendo estabelecido uma ligação por terra entre o Donbass e a Crimeia. Assim, amputou cerca de 20% do território ucraniano. Resta saber se ele tentará tomar a costa do mar Negro remanescente em caso de obter sucesso no leste.