Por Walter Porto, da Folhapress
SÃO PAULO-SP – A crítica estrutural ao Poder Judiciário deu o tom do debate ‘Judicialização da política e politização do Judiciário’ no segundo dia do seminário Democracia em Colapso?, promovido pelo Sesc e pela Boitempo nessa quarta, 16, em São Paulo. Todos os palestrantes fustigaram aspectos que estão na medula espinhal do funcionamento da Justiça no Brasil.
Thula Pires, professora de direito da PUC-Rio, afirma que o problema remete já à formação dos cursos jurídicos do país. O Direito trouxe consigo, segundo ela, a consolidação das hierarquias de raça, classe, gênero e sexualidade, com exclusão reiterada dos minorizados e produção das identidades racializadas do negro e do índio.
“Por trás de uma suposta neutralidade e universalidade, o sistema jurídico segue sendo lido e construído sob o signo da branquitude, atuando como instrumento de manutenção de privilégios”, afirma a professora, lembrando que junto com a prática do direito no Brasil, criou-se a elite burocrática dos bacharéis.
Segundo ela, o direito colabora para normalizar uma situação de extermínio da população negra. “O Judiciário tem sido historicamente capaz de se blindar do papel que tem em perpetuar a violência no Brasil”, diz. Ela questiona se a Justiça tem se portado mais como garantidora do direito à vida ou aliada dos processos que violam a população marginalizada.
Segundo o antropólogo Luiz Eduardo Soares, o país tem se visto mergulhado na mistura de Justiça e política mais visivelmente desde a Operação Lava Jato, “uma intervenção direta na política a partir da linguagem moralista da luta contra a corrupção”. Mas a conjuntura é um “desdobramento orgânico de patologias que infectam a sociedade brasileira: o punitivismo e o proibicionismo”.
A cultura punitiva seria a sanha de vingança que instrumentaliza a Justiça para fins de encarceramento em massa e gera um dos países campeões em população prisional.
A lógica atua, segundo ele, aliada ao proibicionismo de drogas, já que grande parcela dos presos está sob acusação de tráfico (caso de 62% da população carcerária feminina e 28% da masculina). Para Soares, mesmo governos de caráter mais progressista negligenciaram o combate a esse sistema.
Pires adiciona que, desde a Constituição Cidadã de 1988, a população carcerária cresceu mais de 700%. Alysson Mascaro, professor de direito da USP, diz não nutrir esperanças de salvação vindas do direito. Segundo ele, a Justiça se articula como instrumento para “manutenção da dominação capitalista”. “Nenhum Judiciário do mundo pode salvar nenhuma luta do mundo. O espaço do direito é sempre o espaço do capital”.