Escrevo esse breve artigo como resposta ao pedido de uma estudante da disciplina de Sociologia do Curso de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal de Roraima, leitora desta coluna, que quer saber um pouco mais sobre o que é política para se posicionar nas eleições gerais do Brasil em 2022, quando depositará nas urnas seu Primeiro Voto.
A jovem estudante quer entender o que é a política e porque tanta gente afirma que não gosta de política. Ela está preocupada com a campanha eleitoral e teme que se repitam as estratégias inescrupulosas das eleições passadas que espalharam fake News com tantas mentiras que fizeram muita gente votar enganado ou deixar de votar. De forma bem didática, proponho uma breve reflexão, a primeira ade muitas, na expectativa de contribuir com o debate das eleições do dia 2 de outubro, em primeiro turno, e 30 de outubro em segundo turno, onde houver, as quais terão cinco cargos em disputa: Presidente da República, Governador, Senador, Deputados Federais e Deputados Estaduais.
Para começo de conversa é importante reafirmar que a política nasce com a humanidade. Aristóteles, o filósofo grego considerado o intelectual da política, que viveu por volta dos anos 322 a.C., dizia que “tudo na vida das pessoas é política porque tudo o que envolve reflexão, decisão e ação faz parte da política”. Esse entendimento de Aristóteles é parecido com nossa metodologia popular dos três tempos: ver/escutar, discernir/refletir e agir.
Para esse filósofo antigo, a palavra política foi derivada do termo grego politikos, que era uma referência a todos os que viviam na polis ou a tudo o que acontecia na cidade por obra dos cidadãos que nela conviviam de forma organizada. Naquela época as cidades eram bem diferentes das de hoje. Eram pequenas comunidades, daí vem o conceito de comunas, nas quais os moradores decidiam juntos sobre os temas comuns a todo o território, como por exemplo onde conseguir água limpa e potável para todos e todas, como fazer as ruas e calçadas, os jardins e praças, os espaços públicos, a segurança e todas as outras necessidades das pessoas que viviam no mesmo território, quando ainda não existia o Estado, como o que conhecemos hoje.
Dessa forma, a política era toda a reflexão e tomada de decisão que definia as regras de convivência, os direitos e deveres de todas as pessoas e orientava a justiça na comunidade. Aristóteles costumava dizer que a política começa na vivência familiar e que desde que nascemos dependemos e participamos de decisões políticas. Com isso, “ninguém conseguirá escapar da política”, afirmava o filósofo que entendia que político (politiko) era toda pessoa que participava da vida pública.
Passados mais de dois mil anos, o tema da política continua presente na vida de todas as pessoas. A diferença é que as cidades foram crescendo e os problemas foram se avolumando e o modo de vida das pequenas comunidades foi aos poucos se perdendo ou se redefinindo. A partir do século XVIII, surgiu a concepção moderna de democracia como resultado das revoluções burguesas que derrubaram as monarquias absolutistas na famosa Revolução Americana de 1776 e a Revolução Francesa de 1789. Essas revoluções não eram completas porque havia pouca participação dos pobres, dos negros dos povos indígenas, dos jovens e das mulheres. Foram revoluções marcadas pela exclusão social.
A democracia moderna recuperou o princípio da cidadania que havia se perdido séculos atrás quando as pessoas pobres foram reduzidas à condição de súditas, subordinadas a reis (monarcas). Ao retomar a condição de cidadania, as pessoas se sentiram mais incluídas e responsáveis na sociedade. Mas, a democracia moderna criou a administração pública para cuidar da vida da sociedade e definiu que o povo indicasse seus representantes para cuidar dos assuntos políticos de interesse público. Dessa forma, o povo passou a indicar e votar nos seus representantes que, uma vez eleitos, tornaram-se delegados do povo para cuidar da administração pública na forma da gestão do Estado moderno que implica na gestão do orçamento público, da economia, das leis, da justiça, do território, dos direitos sociais e todas as outras dimensões da sociedade.
O problema é que muitas pessoas eleitas confundiram o direito público com os interesses privados. No Brasil, temos um histórico de apropriação da política para interesses privados. É um dos legados da colonização. A histórica da elite econômica, que pouco ou quase nunca se envolveu na luta por direitos e cidadania, foi se apropriando da administração pública a ponto de criar um distanciamento do povo das decisões políticas. Para se resguardar, ensinou o povo a odiar a política. Por isso, não é raro ouvir, especialmente entre os mais pobres, que se odeia a política.
Odiar a política, é pois, uma estratégia de determinados grupos para manter o povo longe das tomadas de decisões que beneficiam certos grupos em detrimento de prejuízos para o povo. É de interesse da elite econômica criar uma “cortina de fumaça” que faz com que parte do povo acredite que a corrupção está no Estado e que os políticos são todos corruptos e não merecem respeito. Enquanto isso, ninguém questiona a concentração da riqueza, a destruição da Amazônia com seus povos e seus recursos naturais, a apropriação dos territórios. Ou seja, se ninguém incomoda a elite econômica, ela continuará aumentando sua riqueza sem que ninguém perceba que ela está no comando do Estado.
Em meados do século XX, o dramaturgo alemão Berthold Brecht escreveu e publicou o famoso poema ‘O analfabeto político’ que dizia: “O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio depende das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo” (BERTHOLD BRECHT, 1931).
Com esse poema simples e direta, Berthold Brecht tenta explicar porque à elite interessa que tanta gente não se interesse pela política e se esqueça do seu verdadeiro sentido. É a forma que a elite econômica encontrou para não ser perturbada nem questionada pela forma como se apropria da política para manter seus interesses econômicos. Por isso, muito partidos políticos foram criados com essa finalidade. E se uma parte importante da sociedade não quer se envolver com a política ou declara que odeia a política, fica cada vez mais fácil para esses partidos dominarem todas as decisões políticas em favor da elite econômica e “passar a boiada” como bem disse certo político em tempo recente.
Essa estratégia tem funcionado muito bem para distanciar o povo da política. Muita gente reduz a política e a cidadania apenas ao voto. Outras pessoas não querem mais nem votar. Para a elite econômica, quanto mais gente nessa condição, melhor. Assim, cada vez mais pessoas não se importarão com o desemprego, com a fome e a miséria que vai tomando conta da sociedade. Quem diz que odeia política não se envolve com os problemas sociais resultantes da centralização da riqueza nas mãos de um grupo reduzido da sociedade. Essas pessoas não conseguem fazer uma relação direta entre a produção da pobreza e a omissão política.
A onda de ódio à política afasta o povo dos partidos políticos causando um grave problema na sociedade e nas democracias modernas porque partidariza a política a grupos de interesses muito reduzidos que se instalam em todas as instituições políticas que são as ferramentas de participação política mais importantes e legítimas na democracia. A dominação das instituições políticas por grupos de interesse econômico faz com que a política seja pensada a partir da economia e não a partir do conjunto das dimensões sociais, políticas e culturais da sociedade. É preciso mudar essa história!
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Parabéns Márcia pelo excelente trabalho. É o verdadeiro retrato da política brasileira. Uma ala política, que não representa o desejo e necessidade da maioria dos brasileiros, espalha o ódio e mentira, com a finalidade de enganar os menos esclarecidos e com isto tomar o poder de forma desonesta.
Li o texto sobre as eleições 2022. Bem tendenciosa a autora em suas ideias. Próprio de uma esquerdista que não consegue enxergar os danos que essa ala da “politica” vem causando à sociedade brasileira com abrangência em todo o continente americano. Uma prática camuflada se interesse pelo pobre mas que no fundo o tem reduzido a marionetes nas mãos de gente perigosa que deseja ter o controle de vidas.
Essa autora se enquadra perfeitamente no conceito de “analfabeta política”.