Violência
A violência é um dos principais fatores que geram insegurança pública. É responsável, em grande medida, pela insegurança e pela sensação de insegurança. Toma formas diversas: violência doméstica, violência nas ruas, violência física, violência psíquica, violência de gênero, violência infantil, violência das organizações criminosas e de facções, violências nos negócios e nas empresas, violência nos presídios, dentre outras.
Em 2017, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2018 do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, registraram-se 63.880 homicídios no Brasil, ou seja, 175 mortos ao dia por conta de mortes violentas intencionais. Taxa de 30,8 por 100 mil habitantes. Nunca se matou tanto num país sem guerra declarada.
Mas o que se pode entender por violência? Em que consiste um processo social violento ou uma conduta violenta? Qual a sua gênese? O que a caracteriza? Que fatores a deflagram? Que relações se estabelecem entre violência e sociedade?
A palavra violência tem sua raiz etimológica ligada ao latim “violentia”, que se refere à “veemência”, “impetuosidade”, que atua pela força, mas com uma característica singular: a de “violare”, ou seja, uma ação que viola, que transgride, que trata com brutalidade, que provoca o ultraje e a desonra, que ofende a dignidade e causa dano.
Violência é conceituada pela Organização Mundial da Saúde como “o uso intencional de força física ou poder, ameaçados ou reais, contra si mesmo, contra outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade, que resultem ou tenham grande probabilidade de resultar em ferimento, morte, dano psicológico, mal-desenvolvimento ou privação.”
A violência é uma ação ou omissão ilegítima, porém há situações em que é possível legitimá-la, seja em defesa da vida, da liberdade, da integridade ou outro bem jurídico do indivíduo, da coletividade e da ordem pública.
A violência, enquanto impetuosidade ou veemência ilegítima, expressa o emprego da agressividade de forma intencional e exacerbada ao ponto de ameaçar ou praticar ato que resulte em dano, prejuízo, trauma psicológico, ultraje, lesões e morte.
A violência, legítima ou ilegítima, pode manifestar-se de várias formas: desarticulada ou organizada, física, simbólica, moral, armada de palavras ou de objetos. A violência pode ter motivações subjetivas ou objetivas, razões preconceituosas, passionais, ressentimentos, revides, motivos étnicos, religiosos, econômicos, políticos, dentre outros.
A violência pode ser nomeada ou identificada como violência contra a criança e o adolescente, violência contra a mulher, violência contra o idoso, violência urbana, violência esportiva, violência institucionalizada, violência revolucionária, violência nas escolas etc.
A violência é um processo sociológico, diria o sociólogo francês Émile Durkheim –um fato social, variando de significação e de formas de acordo com a sociedade, mas presente em todas elas.
Não obstante as diferenças de contexto, em geral, a violência tem origem em processos subjetivos e interativos, instintos, desejos e impulsos humanos (agressividade, instinto de sobrevivência, de reprodução, ímpeto de prazer, apego a objeto de paixões, de status, de poder, de visibilidade, de consumo…), sendo eles todos manipuláveis e resignificáveis de acordo com o ambiente cultural. Daí a relevância de políticas públicas que contribuam para promover a educação e a socialização dos indivíduos para uma cultura de lucidez, de esclarecimento, de liberdade, de justiça e de solidariedade, além de zelar pela saúde mental. Essas são condições imprescindíveis na formação de um ambiente coletivo em que prevaleça a dignidade humana, a liberdade com justiça e a segurança pública.
A violência quase sempre implica em privação ou violação de direitos, em especial de bens jurídicos dos fundamentais e resulta em ofensa e injustiça. A violência é sempre repudiável em todas as suas formas, exceto em caso de excludente de ilicitude para combater uma injustiça ou evitar um mal ainda pior. Mesmo assim, importa não esquecer a realidade das palavras de Friedrich Schiller “A violência é sempre terrível, mesmo quando a causa é justa.” E do filósofo Jean-Paul Sartre, “A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota.” Mahatma Ghandi era bastante pragmático ao lidar com o tema, por isso, afirmava: “Eu sou contra a violência porque parece fazer o bem, mas o bem só é temporário; o mal que faz é que é permanente.”
A violência não tende a construir, mas destruir, por isso é antes força destrutiva, por isso, expõe Benedetto Croce: “A violência não é força, mas fraqueza, nem nunca poderá ser criadora de coisa alguma, apenas destruidora.” É antigo o ensinamento de que “violência gera mais violência”: ignorância, injustiça, falta de educação, de oportunidades e de respeito aos direitos das pessoas estão na raiz dos problemas de violência sistêmica e institucionalizada, que resultam em crônicas epidemias de miséria, de doenças, de intolerância, de preconceito, de esgotamento ambiental e de mais violência.
Não há fórmulas prontas nem modelos infalíveis, mas já se sabe há tempos que a “arma” mais efetiva de combate à violência não é tão somente a repressão, mas principalmente o processo de socialização para uma cultura de cidadania, de paz e de liberdade com justiça. Esse ambiente cultural é condição para se fomentar a valorização da dignidade da pessoa humana e direcionar a sociedade a melhores perspectivas. Enfim, o principal e mais seguro caminho para lidar e suplantar a violência é o da não-violência.
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