Deformar a ciência, reduzindo-a a mera opinião ou desinformação (fake news), produz sem dúvida grave insegurança social com reflexos na saúde e na segurança pública.
No contexto de polarizações irracionais e intolerâncias, em que se abusa do uso das fake news e do potencial de manipulação delas, as formas de conhecimentos, em especial as ciências, não têm sido poupadas.
Confunde-se ou degenera-se intencionalmente o conhecimento científico, tentando torná-lo similar ou mesmo equivalente a opiniões, a teorias conspiratórias e até mesmo desinformações (fake news).
Qualquer pessoa pode ter opinião sobre o que quiser opinar. É decorrência do direito fundamental de livre expressão, protegido juridicamente nas democracias. Contudo, deve-se discernir claramente que a opinião, seja de quem for, não é ciência (episteme), mas apenas uma hipótese ou ilusão (doxa). Por mais que venham de profissionais competentes da área em que atuam, uma opinião não constitui necessariamente um conhecimento com cientificidade.
Não se faz ciência com mera opinião nem muito menos com desinformação. O conhecimento científico se caracteriza predominantemente, em especial na área de ciências naturais e da saúde, por certos critérios e procedimentos de verificação e de testes que buscam alcançar determinados graus de segurança e certeza. Dentre estes critérios, ressalta-se o de que os resultados alcançados possam ser testados e retestados em toda parte, de maneira, universalmente válida. Com base nesses testes e verificações, é que se pode reconhecer como válidos os remédios, as terapias, as vacinas produzidas e disponibilizadas nas redes de saúde pública, privada e, de modo geral, nos mercados.
Por esse motivo, na área de médica, inclusive na de infectologia, não se pode trabalhar com meras opiniões, por mais competente que seja o profissional, mas com procedimentos e técnicas verificáveis, comprovadas e continuamente testáveis, que possam ser reproduzidos em qualquer lugar.
Muitos creem que determinados remédios, como a cloroquina ou a hidroxicloroquina, são a cura da doença e a solução para a pandemia. A medicação ajudou e deu certo com vários pacientes. Mas também ocorreu de muitos, mesmo com o uso do citado remédio, terem ido a óbito por causa da covid-19. Então ainda não é um medicamento seguro, que possa ser indicado como “antídoto” a todos. As pesquisas seguem com estes e vários outros remédios, bem como os esforços para se chegar a uma vacina eficaz.
Essas questões não podem ser tratadas de maneira superficial e com base no mero achismo. Se um remédio é indicado oficialmente e não tem os resultados esperados expõe o sistema de saúde e a administração pública a uma avalanche ações judiciais, as quais podem comprometer as já abaladas finanças públicas. É preciso estar devidamente fundamento em resultados de pesquisas e testes científicos, universalmente válidos e aplicáveis, para dar respostas adequadas às pandemias e quaisquer outras doenças.
De fato, é essencial para a saúde e a segurança pública evitar tratar certas questões sanitárias e problemas da medicina com base em opiniões e desinformações (fake news). É preciso dar mais crédito ao que efetivamente apresentam os resultados das pesquisas científicas do que a opiniões, achismos, pareceres, vídeos indignados, discursos de redes sociais etc. A ciência testa, verifica, pode reproduzir e provar. Já os demais são apenas posições ou mesmo ilusões, fantasias e teorias conspiratórias. É crucial ouvir mais a ciência.
Nesse sentido, o isolamento social tem gerado melhores resultados aos países que o adotaram, evitando maior número de infectados, de mortos e o colapso nas redes de saúde pública e privada. Lamentavelmente, a economia tem sido muito impactada. E a situação poderá ser tornar pior caso o número de perdas humanas seja muito maior. Por isso, a recomendação da OMS pelo isolamento social acaba sendo a mais consequente para lidar com o atual cenário de pandemia do coronavírus.
Portanto, tentar defender a todo custo posições ideológicas, de governo ou de mercado sem fundamento no conhecimento, principalmente sem base nas metodologias da ciência médica atual, é uma atitude irresponsável, danosa e até assassina para com toda a sociedade. A violência ideológica é um desdobramento irracional da cultura do ódio. A manipulação politica, produzida em grande escala pelo surto da desinformação (fake news) e da violência ideológica, deve ter como limites a proteção e o cuidado para com a vida, a segurança e a saúde pública.
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