Por Catarina Scortecci, da Folhapress
CURITIBA – A recente decisão da Oitava Turma do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) que declarou a suspeição do juiz Eduardo Appio para atuar nos casos da Lava Jato utilizou argumentos dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) no processo no qual o ex-juiz da operação Sergio Moro foi considerado parcial para julgar o presidente Lula (PT), em 2021.
Appio foi declarado suspeito no último dia 6, em decisão derrubada pelo ministro Dias Toffoli nesta terça-feira (19).
O juiz foi considerado parcial em sua atuação na 13ª Vara Federal de Curitiba, onde tramitam os processos remanescentes da Lava Jato, por causa da afinidade que teria com lideranças petistas, revelada em entrevistas e redes sociais, e também em função das críticas a ex-autoridades da operação, como o hoje senador Moro (União Brasil-PR).
Até o início do ano, Appio usava o login “LUL2022” para acessar o sistema da Justiça Federal.
Ainda não está definido se o magistrado vai reassumir o posto à frente dos casos da operação. A decisão da corte regional, chamada de ilegal por Dias Toffoli, também declarou a nulidade de todos os atos assinados por ele até aquela data.
Em seu voto sobre Appio, o relator do caso no TRF-4, Loraci Flores de Lima, citou o julgamento do habeas corpus que considerou Moro suspeito para atuar nos processos envolvendo Lula.
Loraci, na ocasião, reproduziu uma longa manifestação acerca do conceito de imparcialidade feita por Gilmar Mendes, ministro do STF e um dos mais ácidos críticos da Lava Jato. “Não se cuida de discutir aqui se o juiz, na sua dimensão subjetiva, nutria afeição ou desapreço pelo acusado”.
O voto do magistrado do TRF-4, então, acrescentava: “Exatamente a situação posta neste momento!”
O julgamento na ocasião foi unânime.
Na decisão desta terça a favor de Appio, o ministro Toffoli questiona o fato de o TRF-4 ter tido posição diferente no passado, quando pedidos de afastamento de Moro foram negados. Essas solicitações, no entanto, foram julgadas em sua maioria por outros magistrados.
Em seu despacho, Toffoli lembrou que Loraci Flores também teve sua imparcialidade contestada por réus da Lava Jato. Loraci é irmão do delegado da Polícia Federal Luciano Flores de Lima, que atuou nas investigações do escândalo de corrupção da Petrobras.
Até aqui, Loraci tem analisado os casos de forma individual, se declarando impedido apenas nos processos em que entende que o irmão tenha atuado diretamente na investigação.
Appio está afastado de suas funções desde maio, quando o TRF-4 abriu um procedimento preliminar para apurar a suspeita de que ele tenha ligado para o advogado João Eduardo Malucelli, fingindo ser outra pessoa, para tentar comprovar o vínculo familiar com um magistrado do TRF-4 que era o responsável por relatar os casos da Lava Jato.
João Eduardo é sócio do senador e ex-juiz Moro. O juiz Marcelo Malucelli acabou deixando a relatoria da Lava Jato no TRF-4.
Em 24 de julho, o procedimento preliminar gerou um processo disciplinar. O afastamento temporário foi mantido, até a apuração total do caso. O processo disciplinar agora também foi suspenso por Toffoli.
O advogado de defesa de Appio em Porto Alegre, Alexandre Wunderlich, disse à Folha nesta terça que, no âmbito do processo disciplinar, “nenhuma prova foi produzida e nenhuma testemunha foi ouvida até o momento”.
Para o advogado Pedro Serrano, responsável pela defesa de Appio no STF, a decisão desta terça de Toffoli permitiria o retorno do juiz afastado à 13ª Vara Federal. Mas o ministro do STF, em sua decisão, não trata expressamente da questão do afastamento.
Ao anular a suspeição de Appio, o ministro Toffoli mencionou a correição extraordinária que está sendo conduzida pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e que faz uma espécie de varredura na 13ª Vara Federal de Curitiba e também na Oitava Turma do TRF-4.
“Faz-se necessária, por ora, a suspensão do procedimento administrativo disciplinar em face do magistrado Eduardo Appio, notadamente enquanto se aguarda o desfecho da Correição Extraordinária promovida pela Corregedoria-Nacional de Justiça, a quem competirá, igualmente, analisar eventual avocação do referido processo disciplinar”, escreveu Toffoli.
Em julho, ao analisar um pedido feito pela defesa de Appio, o corregedor do CNJ, Luís Felipe Salomão, decidiu manter o titular da 13ª Vara de Curitiba afastado até a conclusão das apurações. Na época, em sua decisão, Salomão disse que havia elementos suficientes para manter o magistrado afastado e que via “conduta gravíssima”.
Nesta terça, o TRF-4 e a Justiça Federal do Paraná não quiseram se manifestar sobre a decisão do ministro do STF. O juiz Fábio Nunes de Martino é quem atua hoje na 13ª Vara Federal, enquanto Appio permanecer afastado.