BRASÍLIA – Os membros do Conselho de Ética da Câmara articularam a indicação de última hora de dois parlamentares e conseguiram aprovar a cassação do deputado André Vargas (sem partido-PR). Ex-petista, Vargas é acusado de envolvimento com o doleiro Alberto Youssef, preso pela Polícia Federal no âmbito da operação Lava Jato, que investiga um esquema de lavagem de dinheiro suspeito de movimentar cerca de R$ 10 bilhões.
Para ser confirmada, a perda de mandato de Vargas precisará ainda ser votada pelo plenário da Casa, mas parlamentares consideram improvável que isso aconteça antes das eleições. O ex-petista não compareceu à reunião da tarde desta quarta-feira. Sem quórum para deliberar sobre o relatório que recomendava a perda do mandato de Vargas, o relator Júlio Delgado (PSB-MG) e o presidente Ricardo Izar (PSD-SP) mobilizaram a nomeação de novos conselheiros para garantir o número mínimo de votantes.
O PSD indicou o líder do PPS Rubens Bueno (PR) para uma vaga em aberto e o deputado Mandetta (DEM-MS) – ausente da Câmara hoje – renunciou ao seu lugar no colegiado para que o pessebista Pastor Eurico (PE) pudesse ocupá-lo. Dessa forma, o pedido de cassação de Vargas foi aprovado pela unanimidade dos presentes, com 11 votos a favor.
O advogado Michel Saliba, que representa o ex-petista, afirmou que as nomeações de última hora configuraram vícios no processo e anunciou que recorrerá à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). “A composição do Conselho era uma (no início da reunião) e a votação se dará com outros deputados, o que nos surpreende”, disse na reunião.
A ligação de Vargas com Youssef veio a público quando foi revelado, no início do ano, que ele pegou carona em um jatinho do doleiro. Ele é apontado, ainda, nas investigações como o responsável por indicar um ex-assessor do Ministério da Saúde para trabalhar no Labogen, laboratório que, de acordo com a PF, centralizava o esquema de lavagem de dinheiro comandado por Youssef. O laboratório havia fechado uma parceria com a pasta para o fornecimento de remédios, operação desfeita após a investigação da PF.
Vargas nega ter intermediado essa indicação. Em seu parecer, apresentado no início de agosto, Júlio Delgado argumentou que Vargas se insere no contexto de uma “imensa rede criminosa especializada na lavagem de dinheiro e na evasão de divisas”. “O deputado representava, perante a administração pública federal, os interesses das empresas controladas por Alberto Youssef e seus testas-de-ferro”, disse. Ao final de seu relatório, o socialista, cujo partido disputa a presidência da República, também criticou o PT e fez uma comparação com o escândalo do mensalão. “Vêm à tona novos fatos que dão conta de que a Hydra de Lerna chamada corrupção está viva e espalhou cabeças pelos mais diversos órgãos da administração pública federal”, concluiu, em referência ao animal da mitologia grega.
Recurso
A defesa do deputado André Vargas vai recorrer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. “O que houve aqui hoje foi um golpe”, disse o advogado do deputado, Michel Saliba, por meio de nota à imprensa. Saliba refere-se à substituição e indicação de membros do Conselho de Ética depois do início da sessão do colegiado. A defesa de Vargas questiona as indicações e afirma que os novos integrantes do Conselho de Ética não tiveram tempo para conhecer o teor do relatório que pediu a cassação do parlamentar. Para o advogado, a punição “foi exagerada e houve desrespeito ao devido processo legal nas investigações conduzidas pelo conselho”.
A avaliação de Saliba é que a decisão sobre a perda do mandato foi desproporcional, uma vez que, em outras investigações, motivadas por razões mais graves, houve apenas a decisão pela pena de suspensão. Saliba avalia ainda que houve violação ao princípio da ampla defesa e atropelamento dos prazos regimentais. “As testemunhas foram ouvidas sem que a defesa tivesse acesso aos documentos vindos do Supremo Tribunal Federal. E o deputado teve seu pedido de oitiva recusado pelo conselho, fatos que comprometem a constitucionalidade de todo o processo”, afirma em nota.
Para Vargas, o processo foi conduzido com “açodamento e politização excessiva”. “Todo o processo foi conduzindo sem quórum e de forma autoritária, sem permitir o livre exercício da minha defesa”, acrescentou o deputado. “A instrução é nula e procuraremos demonstrar isto na CCJ e no Judiciário. Testemunhas chave não foram ouvidas e nem mesmo eu fui ouvido.” Para ser confirmada, a perda de mandato de Vargas ainda precisa ser votada pelo plenário da Câmara. Parlamentares, no entanto, consideram improvável que isso aconteça antes das eleições.
Argôlo
Na sessão desta tarde, o Conselho de Ética ouviu ainda uma testemunha do processo por quebra de decoro parlamentar contra o deputado Luiz Argôlo (SD-BA), que também é investigado no colegiado por suas relações com o doleiro. Questionado sobre a movimentação financeira de Argôlo, o gerente da agência da Caixa Econômica Federal na Câmara, Douglas Bento, disse que não poderia prestar as informações aos parlamentares por conta do sigilo bancário.