Por Vívian Oliveira, da Redação
MANAUS – De 1,7 milhão de quelônios consumidos em um único ano no Amazonas, 900 mil acabaram no prato de famílias com domicílios em Manaus. É o que mostra pesquisa do Departamento de Conservação de Peixes e Fauna Silvestre da Universidade de Virgínia Tech (EUA), em parceria com a Universidade de Princeton. A exploração predatória para consumo humano ameaça a espécie no estado, conclui o estudo.
“Se pararmos para pensar nos números, são 90 quelônios mortos por hora só na capital. E a principal causa é o consumo exagerado de ovos e carnes desses animais”, diz Camila Ferrara, da WCS Brasil (Wildlife Conservation Society). “A partir daí decidimos que precisávamos fazer alguma coisa porque existem inúmeros projetos com quelônios em campo, onde vivem as espécies, mas falta em zonas urbanas”.
Com base nesses dados, a WCS Brasil, em parceria com a Cequa/Inpa (Centro de Estudos de Quelônios da Amazônia do Instituto de Pesquisas da Amazônia), lançou a campanha “Juntos pelos Quelônios” para sensibilizar as pessoas sobre o consumo da espécie.
Para elaborar a campanha, a WCS Brasil ouviu 350 estudantes do ensino público e privado, entre 12 a 17 anos, durante seis meses. A intenção era saber se os jovens conhecem a espécie, sabem sobre a ameaça de extinção e se consumem carne de quelônios. O levantamento mostrou baixo conhecimento sobre o assunto e 50% deles acreditam que as principais ameaças são a poluição dos rios e a perda de habitat.
Segundo Camila Ferrara, a escolha do público jovem foi devido à facilidade de acesso. A segunda fase consistiu em novas visitas às escolas para esclarecer sobre os quelônios.
“Tudo o que a gente aprendeu com o público jovem vamos usar para atingir uma massa maior. Hoje, entendemos um pouco sobre o conhecimento desse público. Nós vimos que, apesar de Manaus ser cercada pela floresta, esperávamos que as pessoas tivessem uma intimidade maior com animais, maior acesso, maior conhecimento. A maioria nunca viu um quelônio em ambiente natural e têm até medo dessa espécie que não faz absolutamente mal a ninguém”, disse Camila.
Camila diz que a campanha “Juntos pelos Quelônios” quer esclarecer a população sobre a importância do animal para o homem e para a natureza, o que está acontecendo com essas populações, porque a espécie é um símbolo para a Amazônia e a necessidade de conservá-los.
“Não vamos manter essa quantidade de 1,7 milhão de quelônios mortos por ano. Eu entendo que é um hábito, na região Norte, comer a carne e os ovos dos quelônios. Ninguém está proibindo, mas temos que aprender a consumir de uma maneira mais sustentável. Então, é isso que nós queremos com a campanha: informar e conscientizar”, afirma.
Conforme a pesquisa, apenas 13% dos entrevistados afirmaram já ter comido quelônio contra 62% que disseram que nunca comeram. No entanto, 12% dos jovens afirmam que gostariam de experimentar.
O levantamento revelou que 35% das famílias dos entrevistados já consumiram ou consomem quelônio. O levantamento da WCS Brasil mostrou ainda que 48% dos jovens nunca viram um quelônio no ambiente natural. Dentre as 21 espécies de quelônios, os entrevistados conheciam somente oito, sendo as mais citadas as tartarugas-da-amazônia, tracajás e os jabutis.
A pesquisa revela ainda que 53% das pessoas tiveram ou têm um quelônio como animal de estimação, sendo o jabuti como a espécie mais comum nas casas.
“Esses dados vão nos ajudar a desenhar melhor a campanha de conservação. Vamos entender a relação das pessoas com a natureza e ter um conhecimento melhor de como abordar essa população no futuro, de quais atividades podemos oferecer a elas dentro da campanha. Nosso objetivo é promover mudança de comportamento e ajudar a manter vivos estes animais tão fascinantes”, afirma a pesquisadora.
“Os quelônios dispersam sementes, fazem parte de cadeias alimentares, consomem plantas aquáticas, então se retirarem esses animais da natureza nós vamos ter uma quebra nessa cadeia alimentar, fazendo com que outras espécies também desapareçam ao mesmo tempo que outras espécies vão se proliferar”, explica a bióloga Sabrina Barroso, do Centro de Estudos dos Quelônios da Amazônia.
O grupo dos quelônios – representado pelas tartarugas, cágados e jabutis – é o segundo grupo de vertebrados mais ameaçado do mundo. Na Amazônia existem 21 espécies de quelônios, sendo duas terrestres e 19 aquáticas.
Sobre o projeto
“Juntos pelos quelônios” é uma iniciativa da WCS Brasil, com apoio do Cequa/Inpa (Centro de Estudos dos Quelônios da Amazônia) e em parceria com a Semed (Secretaria Municipal de Educação.
A iniciativa conta com financiamento da TCF (Turtle Conservation Foundation), Re:Wild, União Europeia, por meio da Aliança pela Fauna Silvestre e as Florestas, e da USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional), por meio do projeto “Conservando Juntos”.