
Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Com dívidas que somam R$ 101 milhões com a Prefeitura de Manaus, as empresas de ônibus que atuam no sistema de transporte coletivo ingressaram com uma ação na Justiça do Amazonas para receber R$ 21 milhões referentes a suposto déficit a favor delas apurado na intervenção financeira realizada em 2019 na gestão do ex-prefeito Arthur Virgílio Neto (PSDB).
Na ação, ajuizada em dezembro de 2020, o Sinetram (Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Amazonas) quer obrigar o município a cumprir um cronograma de pagamento da dívida que foi estabelecido na gestão de Arthur Virgílio. Esse cronograma previa que o valor seria repassado às empresas em dez parcelas, entre julho de 2020 e abril de 2021.
A cobrança foi contestada pela prefeitura em março deste ano. Entre outros argumentos, a prefeitura alegou que as empresas devem ao município R$ 101 milhões, valor apurado no período de 2011 a 2019, e que o Sinetram não tem “poder para agir, transigir, firmar acordos na esfera cível ou administrativa em substituição às pessoas jurídicas a ele filiadas”.
A prefeitura apresentou ainda um documento da CGM (Controladoria-Geral do Município), datado de 19 de outubro de 2020, contra o pagamento. “Assim, e por todo o exposto e em virtude dos débitos existentes que até a presente data não foram quitados não recomendamos o pagamento dos valores de R$ 21.185.719,46 às empresas”, diz trecho do documento.
‘Dívida reconhecida’
As empresas afirmam que o acordo para pagamento da dívida em dez parcelas está previsto em termo de compromisso assinado pelo ex-prefeito Arthur Virgílio no dia 13 de fevereiro de 2020. O documento também estabeleceu que o Conselho Gestor do FMMU (Fundo Municipal de Mobilidade Urbana) iria apurar eventuais valores devidos às concessionárias.

A apuração, conforme o termo de compromisso, tinha objetivo de verificar eventual saldo existente entre o levantamento dos valores efetivamente recebidos pelas concessionárias e valores correspondentes a pagamentos efetuados pela Prefeitura de Manaus em nome das concessionárias no período da intervenção financeira.
O Sinetram cita que, no dia 10 março de 2020, a CGM emitiu a Nota Técnica nº 001/2020 apontando que “o resultado final da apuração do equilíbrio econômico-financeiro” das empresas concessionárias no período da intervenção financeira “demonstra um déficit a favor das empresas da ordem de R$ 21.185.719,46”.
De acordo com as empresas, em maio de 2020, o IMMU (Instituto Municipal de Mobilidade Urbana) enviou ofício à Secretaria de Finanças de Manaus informando que o pagamento da primeira parcela não havia sido efetivado por conta da pandemia de Covid-19. Na ocasião, segundo o sindicato, o instituto apresentou um cronograma de pagamento.
As empresas afirmaram que, conforme o cronograma, o início do pagamento das parcelas deveria ocorrer até o dia 30 de julho de 2020, mas a prefeitura não cumpriu o acordo. “O executado (Prefeitura de Manaus) inadimpliu integralmente a sua obrigação, na medida em que nenhum das datas estipuladas foi observada”, disse o Sinetram.

Dívida maior
Ao contestar a cobrança, a prefeitura afirmou que as empresas têm dívida de R$ 101 milhões com o município, conforme a Nota Técnica nº 002/2020 da CGM emitida no dia 18 de maio de 2020. A prefeitura sustentou que as empresas esqueceram de informar à Justiça sobre a existência dessa nota técnica, que apurou “todas as dívidas tributárias das empresas”.
A conclusão da Nota Técnica nº 002/2020 traz o seguinte teor: “O resultado final da apuração do equilíbrio econômico-financeiro das empresas concessionárias (…), no período de outubro de 2011 a julho de 2019 demonstra um débito das empresas de transporte para com o município de Manaus no montante de R$ 101.422,984,59”.
De acordo com a prefeitura, no dia 5 de outubro de 2020 o IMMU solicitou manifestação da CGM sobre a dívida de R$ 21 milhões. A controladoria se manifestou contrária ao pagamento na forma solicitada, em razão de as empresas terem débitos apurados referentes ao período de outubro de 2011 a julho de 2019, conforme a Nota Técnica nº 002/2020.
Na manifestação, a CGM afirmou que a diferença entre o “crédito” das empresas e as dívidas com o município alcançava o montante de R$ 80.237.265,13. A controladoria informou que esse valor não havia sido pago ao fisco municipal, e, por isso, os R$ 21 milhões apurados na Nota Técnica nº 001/2020 não poderiam ser pagos às empresas.
“O não pagamento foi motivado pela existência de dívidas tributárias das concessionárias para com o Fisco Municipal, que superavam, em muito, o valor do déficit apurado, tendo a CGM se manifestado pela necessidade de apuração de todos os créditos e débitos apurados nas notas técnicas por si emitidas, com vistas à compensação dos valores”, disse a prefeitura.
Ilegítimo
Ao contestar a legalidade do termo de compromisso assinado por Arthur Virgílio, a atual administração da Prefeitura de Manaus lembrou que o acordo foi firmado entre a prefeitura e o Sinetram e afirmou que o sindicato não tem “poder para agir, transigir, firmar acordos na esfera cível ou administrativa em substituição às pessoas jurídicas a ele filiadas”.
De acordo com a prefeitura, o Sinetram não apresentou “qualquer autorização ou outorga de poderes” para transigir ou assinar contratos em nome das “empresas concessionárias que o compõem, que são as pessoas jurídicas às quais o Município de Manaus concedeu o serviço público em apreço, por meio dos respectivos contratos de concessão”.
Para a prefeitura, o acordo é nulo, pois as empresas “não firmaram o termo de compromisso executado” e “não há notícia nos autos acerca de autorização ou outorga de poderes ao sindicato para agir, transigir, firmar acordos na esfera cível ou administrativa em seu nome”. Por esse motivo, a prefeitura pediu a extinção da ação.
Intervenção
De acordo com publicação do ATUAL, a intervenção financeira da Prefeitura de Manaus nas empresas do transporte público de passageiros confiscou os recursos do sistema de bilhetagem dos ônibus. Além dos R$ 125,7 milhões obtidos com o pagamento por cartão eletrônico, a prefeitura concedeu mais R$ 61,8 milhões às empresas.
A reportagem solicitou informações do Sinetram, mas até a publicação desta matéria nenhuma resposta foi enviada.