Soa muito estranho que, em meio à profunda crise institucionalizada no âmbito dos poderes políticos e do modelo representativo no país, nada efetivamente tenha sido feito em termos de reforma política.
Causa perplexidade e indignação o fato de que, mesmo diante de tamanha crise que se abate sobre o ambiente institucional e econômico no Brasil, as instituições de mediação política persistam em reduzir quase tudo ao “jogo político”, sendo indiferentes aos reais problemas da nação, os quais não serão resolvidos com mera troca de “seis por meia dúzia” ou “de um quadrilheiro por um gangster”. Contudo, a única coisa que parece importar para a elite política brasileira é a viciada jogatina político-eleitoral.
Um verdadeiro fight no pior estilo de rua, cujo propósito é apenas a estéril luta do poder pelo poder. Como se mudar o “maquinista” fosse alterar substancialmente a rota do trem. Como se instrumentalizar o impedimento ou impeachment em favor da manutenção do viciado joguete político fosse melhorar alguma coisa no país. Como se Temer, Cunha, Calheiros ou qualquer outro na atual linha de sucessão representasse alguma alternativa ou perspectiva de superação do velho e corrompido modelo de presidencialismo de coalizão ou de cooptação mafiosa em que o país está atolado. Uma práxis política tacanha e viciada apenas no jogo de disputa pelo poder.
Enquanto a “jogatina” política torna-se prioridade nacional, nenhuma das promessas de reformas fundamentais toma forma concreta. Ignora-se o combate ao carreirismo político, a erradicação da patrimonialização de mandatos e de partidos, a compra de votos viabilizada com o financiamento privado de campanhas, o abuso do poder econômico, a dinastização de instituições de mediação política, as infindáveis reeleições de parlamentares, dentre outras hediondas práticas que ferem de morte a democracia. Difícil é sustentar qualquer perspectiva democrática de representação quando é violada a democracia eleitoral desde o nascedouro, quando a igualdade de condições na disputa das eleições é viciada na gênese, inclusive na dinâmica intra-partidária.
Quando se percebe o que se efetivamente se aprovou em termos de reforma política, visando revisar e aprimorar as instituições e processos de mediação política, como parte da tarefa de desenvolver a própria experiência democrática, constata-se que mais uma vez nada foi realizado, tudo não passou de promessas demagógicas. Estacionou-se na lei da “filha limpa”, contra a qual não faltam projetos para relativizá-la e enfraquecê-la. Aliás, essa lei somente foi aprovada e efetivada, não por interesse maior do parlamento, mas porque se converteu em iniciativa popular, a partir do grande clamor público e da mobilização popular. Fora isso, nada mais houve de significativo na ordenação da prática política brasileira que contribuísse para o desenvolvimento da experiência democrática e representativa no país.
A legislação que rege a disputa por cargos públicos eletivos, com vistas ao exercício da representação popular ou do ente estatal, é responsável por condicionar o comportamento político. Por conta disso, dá-se a necessidade de se mudar as regras do processo político-eleitoral e suas instituições. Não é possível continuar convivendo, por exemplo, com o atual modelo de financiamento de campanhas eleitorais, que converte as supostas “doações” em maneiras lícitas de suborno, operacionalizado por meio da transferência de dinheiro público via licitações para celebrar contratos superfaturados. Será uma afronta repugnante que, depois da operação “Lava a jato”, alguém – ainda mais o próprio parlamento – defender ou continuar a admitir o direito de empreiteiras e de empresas bancarem candidaturas eleitorais.
A população, exaurida com a reiterada encenação política protagonizada pela oposição e propagada pela grande mídia, não atendeu aos apelos para o comparecimento em massa aos protestos e às manifestações contra o governo federal no último final de semana, agendadas para o domingo (13.12.15). A participação popular nas ruas deu-se maneira tímida e pouco expressiva. Os acanhados protestos mostraram claramente que o povo cansou de ser mera peça manipulável ao sabor dos joguetes demagógicos e “games” eleitoreiros, sem quaisquer reflexos para a qualidade de vida do povo e sem maiores conseqüências para o amadurecimento da democracia no país.
Os representantes políticos brasileiros, na grande maioria, profissionais da arrecadação eleitoral, ainda insistem em ignorar o fato dos cidadãos do país não suportarem mais o velho “game”, a mera jogatina eleitoreira, que apenas troca de nomes e de grupelhos que se apoderam do Estado, mas que mantém semelhantes esquemas e se beneficiam das mesmas práticas viciadas.
Apesar da resistência dos representantes de fazer a devida reforma política e mudar o que deve ser mudado, é crescente a insatisfação popular com a qualidade da representação política e aumenta a cobrança por novas práticas, posturas e rumo na vida política e institucional do país. O povo não admite mais ser tratado como mera massa de manobra ou objeto manipulável pelas obsoletas disputas do “game” político ou da jogatina eleitoreira. Por isso, de modo amplo, persiste a questão: cadê a reforma política?
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