O mundo está sofrendo com os efeitos da grave situação epidemiológica causada pelo coronavírus. O Brasil, como resposta, vem adotando medidas para conter a disseminação da pandemia. Para isso, foi promulgada a Lei n˚ 13.979/2020 e editada a Medida Provisória n˚ 926/2020, as quais dispõem sobre procedimento para aquisição de bens, serviços e insumos destinados ao enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional, ensejando maior liberdade ao poder público para contratações que visam à solução da crise na saúde.
Dentre as regras flexibilizadas pela legislação, destaca-se a dispensa de licitação e outras formalidades para obras e compras de bens e serviços destinados ao combate da pandemia. O texto deixa claro que se presumem atendidas as condições de ocorrência de emergência, de necessidade de pronto atendimento da situação de emergência, de existência de risco à segurança de pessoas, obras, prestação de serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e limitação da contratação à parcela necessária ao atendimento da situação de emergência.
O objetivo de tal medida foi viabilizar o enfrentamento da pandemia, e, para isso, ações emergenciais precisariam ser tomadas. Porém, o critério adotado pelo legislador foi puramente finalístico: não adotou qualquer tipo de limite aos objetos da contratação, autorizando inclusive, a contratação de empresas sem regularidade fiscais ou trabalhistas, com inidoneidade declarada ou com o direito de participar de licitações ou contratar com o Poder Público suspensos. É como diz o ditado chinês: “Não existe crise, existe oportunidade”.
Como se verifica, foi criado um novo conjunto de regras específicas para as contratações com o Poder Público, afastando as disposições da obsoleta, burocrática e não raro contraproducente Lei de Licitações (Lei n˚ 8.666/93). Com efeito, faz-se necessário estabelecer parâmetros de segurança jurídica para que o gestor público atue de forma transparente enquanto perdurar o estado de emergência.
A licitação é regra constitucional, e a própria Lei n˚ 8.666/93 já permitia, em situações de emergência, declarar a dispensa de licitação em casos taxativos. No momento atual, há pouco tempo para formalização dos processos de licitação – ainda exigidos -, autorizando, assim, aos gestores públicos envidarem ações de forma céleres e simplificadas no combate à pandemia.
No entanto, medidas extremas, mesmo em períodos de crise, não podem também excepcionar a transparência, a qual representa um dever do poder público e corolário do princípio republicano. Se em situação de normalidade, a transparência dos atos do poder público representa um direito fundamental, muito mais razão assiste, estando diante de estado de emergência.
Ao se instalar uma crise, muitas vezes acontece no cenário local um desarranjo ético e político de nossos gestores, que se aproveitam do caos para praticarem atos ilícitos. Dessa forma, é fundamental a transparência dos atos públicos ao se disponibilizar dados íntegros e facilitar o acesso à informação para a população. Ela é a única maneira de demonstrar lisura nas dispensas de licitação. Admitir-se-á a contratação somente com existência de nexo de causalidade entre aquisição do bem ou serviço e o combate à situação emergencial.
Além de todo sofrimento físico, emocional e econômico que estamos passando, a corrupção também pode agravar este momento difícil. Justamente agora com o decreto de calamidade pública no Brasil, em que os governos podem usar das compras simplificadas para agilizarem a aquisição de bens e serviços e conter a pandemia, pessoas mal intencionadas podem aumentar absurdamente os preços de produtos e serviços ou adquirir o que não é necessário ou prioritário, fazendo com que os grandes recursos financeiros que os municípios estão recebendo sejam mal utilizados, desperdiçados ou desviados.
A omissão estatal seria inadmissível neste momento de crise, assim como a adoção de medidas arbitrárias que extrapolam a proporcionalidade de seus atos. Não podemos fazer dessa crise um bom negócio para gestores inescrupulosos e corruptos.
Assim, tão somente alterações legislativas não serão suficientes para a resolução de todos os problemas instalados pela crise na saúde. Revela-se primordial a conscientização da população quanto aos dois grandes vírus que assolam o nosso país: o COVID 19 e a CORRUPÇÃO. Façamos nossa parte, vamos nos prevenir e juntamente com os órgãos competentes fiscalizar a transparência dos atos públicos.
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