EDITORIAL
MANAUS – O governo de Jair Bolsonaro entra para a história como um tempo de atraso. Aos fanáticos adoradores do “capitão” foi o melhor governo da história do Brasil. Imaginem. Há quem avalie que o ex-presidente não teve o apoio necessário e teve que enfrentar com adversários terríveis. Na prática faltou a Bolsonaro um ingrediente imprescindível para a governabilidade e para a vida: o diálogo.
Bolsonaro nunca soube dialogar. Sempre foi, no Congresso Nacional nos seis mandatos que exerceu como deputado federal, uma voz destoante das demais, não pela genialidade dos discursos, mas pelos arroubos lamentáveis que dizia em plenário e fora dele.
Ao chutar o balde do “politicamente correto” e dizer o que o imaginário popular queria ouvir, ganhou uma legião de fãs e seguidores, alguns fanáticos outros nem tanto.
Vencida a eleição embalado por um discurso que prometia uma nova forma de fazer política, o presidente se comportou como adversário de todos, inclusive dos aliados que ousavam a desagradá-lo.
Desde os primeiros dias, o Governo Bolsonaro foi marcado decisões absurdas, que não se sustentavam às mais brandas críticas. O primeiro ano foi assim: Bolsonaro decretava, enviada uma proposta ao Congresso, recebia uma enxurrada de críticas e recuava. O ano de 2019 foi um ano perdido em relação às promessas de consertar o Brasil.
Em grande medida, Bolsonaro levou ao governo o mesmo pensamento do discurso de campanha, fantasioso, diga-se, de que o Brasil estava mais uma vez ameaçado pelo comunismo, e precisava livrar-se desse mal.
Para combater o “comunismo”, o presidente da República e seus ministros passaram a atacar as universidades públicas e a desmontar o já combalido sistema de financiamento de pesquisa e inovação. O discurso reinante era o de que nas universidades públicas estava enraizado o “comunismo brasileiro”, que precisava ser esmagado. A perseguição durou até os últimos dias de governo.
No segundo ano, em 2020, surge a pandemia de Covid-19. Bolsonaro perdeu a chance de mostrar grandeza e espírito público. Diante de um mal que assolava a Europa e os Estados Unidos, o presidente brasileiro se mostrou insensível e passou a atacar qualquer medida recomendada pela Organização Mundial de Saúde e pelos representantes da ciência.
Bolsonaro se mostrou o inimigo de qualquer medida recomendada pelas autoridades de saúde, inclusive seu ministro da pasta, que ele demitiu meses depois.
As medidas de isolamento foram as mais combatidas pelo presidente; mas ele também se posicionou contra o uso de máscaras, contra os procedimentos de tratamento de pacientes – que deveriam ser tratados com os medicamentos do chamado kit-Covid – e contra as vacinas de proteção ao vírus.
Isolado, Bolsonaro fazia piada das mortes, que chegaram a mais de 4 mil diárias no período mais crítico da pandemia. Brigou com todos os ministros, governadores e prefeitos que não pensavam como ele em relação à Covid-19.
Em 2021 a Covid-19 ainda se manteve fora de controle até o fim do primeiro semestre. Mas já era hora de cuidar da reeleição. E assim se fez. Com a chegada das vacinas e o arrefecimento das mortes pela doença, Bolsonaro passou a mirar os adversários que poderiam atrapalhar seus planos de reeleição.
As medidas adotadas a partir de então foram para angariar votos em 2022. O Auxílio Emergencial de R$ 400 foi uma delas. O governo, inicialmente, queria manter um valor bem menor, mas o presidente foi alertado pela ala política que a medida não o ajudaria a reduzir a rejeição à candidatura dele.
Chegou o ano da eleição e novas medidas foram “necessárias” para tirar a vantagem aberta por Lula sobre Bolsonaro. Houve, portanto, a desoneração tributária dos combustíveis, aumento do valor do Auxílio Emergencial, bolsa combustível para caminhoneiros entre outras benesses caça-votos.
No segundo semestre de 2022, Bolsonaro abandonou as atividades do cargo e dedicou-se inteiramente à campanha, usando o governo em benefício da reeleição.
Contam-se nos dedos as medidas adotadas pelo Governo Bolsonaro que não estivesse em curso por governos anteriores. O presidente gaba-se do PIX, uma ferramenta cujo desenvolvimento já estava em curso e que foi apressada pelo advento dos pagamentos via redes sociais (WhatsApp e Facebook) e por pressão dos bancos.
O controle da inflação, tão comemorada pelo governo anterior, foi feita com a alta de juros e depois de a inflação derreter o poder de compra dos salários dos trabalhadores.
A queda nos preços dos combustíveis, outra medida que ajudou a derrubar a inflação, não mexeu com quem encheu os bolsos às custas dos consumidores, ou seja, os acionistas da Petrobras. Os governos estaduais e o governo federal precisaram abrir mão de impostos, sem qualquer contrapartida dos investidores privados.
No campo da cultura, nunca um governo no Brasil havia promovido tanta perseguição aos artistas. A educação andou para trás por quilômetros num governo em que os ministros da pasta protagonizaram os piores momentos da história do MEC.
Depois da derrota nas urnas, Bolsonaro isolou-se, deixou de trabalhar por completo, e, na véspera do fim, fugiu do país. O comportamento é típico dos fracos, daqueles que entram para a história apenas como alguém que nunca será lembrado por sua grandeza.
Por isso, o Governo Bolsonaro jamais deverá ser esquecido, para que jamais se repita. Ele sim, a história se encarregará de sepultar.