Por Gustavo Uribe e Julia Chaib, da Folhapress
BRASÍLIA – O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) acusou nesta terça-feira, 5, o ex-ministro da Justiça Sergio Moro de vazar relatórios sigilosos a veículos de imprensa e ressaltou que a iniciativa pode se enquadrar na Lei de Segurança Nacional.
“Ele [Moro] tinha peças de relatórios parciais de coisas que eu passava para ele”, disse. “E entregava para a Globo. Isso é crime federal, talvez incurso na Lei de Segurança Nacional”, afirmou o presidente.
Na entrada do Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse ainda que não tentou interferir na Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro e que em nenhum momento pediu acesso a relatório sigilosos.
“Em nenhum momento eu pedi relatórios de inquérito. Isso é mentira deslavada por parte dele. Ele disse que eu pedi em uma reunião de ministro. Em uma reunião de ministro, a gente ía pedir algo ilegal? Eu não peço ilegal nem individualizante, quem dirá de forma coletiva”, afirmou.
O presidente disse ainda que lerá ainda nesta terça depoimento concedido por Moro à Polícia Federal e que se reunirá com seu advogado para tomar providências. Segundo ele, a narrativa “não tem cabimento”.
“Não houve crime”, disse. “É mentira atrás de mentira”, criticou.
Questionado mais de uma vez sobre se teria pedido a troca da superintendência da PF do Rio, como afirma Moro no depoimento, Bolsonaro não confirmou a informação.
Mas, questionado sobre o motivo de ter um foco nas atividades da PF no Rio de Janeiro, o presidente respondeu: “o Rio é o meu estado”.
Em seguida, o presidente relembrou o caso de um porteiro de seu condomínio no Rio que o citou durante a investigação da morte da ex-vereadora Marielle Franco.
“Eu fui acusado de tentar matar a Marielle, quer algo mais grave do que isso? Não interessa quem seja, mas o presidente da República acusado de um assassinato. A Polícia Federal tinha que investigar, por que não investigou em profundidade?”
À época, o porteiro havia dito que um dos suspeitos de assassinar a vereadora teria ido à casa dele, o que posteriormente não foi comprovado.
Bolsonaro repetiu também o que havia dito em declaração no dia 24, de que pediu a Moro que a PF investigasse a suposta citação no inquérito de que o seu filho mais novo namorou a filha de um dos suspeitos do assassinato.
O presidente afirmou ainda que, caso tivesse problemas com o superintendente Carlos Henrique Oliveira, que chefia a PF no Rio, ele não tinha sido convidado para ser o novo diretor-executivo da corporação policial.
“Como eu estaria escolhendo um desafeto para ser o 02 da Polícia Federal?”, questionou. “Nem eu nem meus filhos respondemos a qualquer processo junto à Polícia Federal”, disse.
O presidente também buscou rebater nesta terça uma das acusações de Moro, de que ele havia pedido a troca do diretor-geral da PF em razão de investigações da corporação contra seus filhos.
Moro apresentou como provas em seu depoimento uma troca de mensagens mostradas pelo Jornal Nacional, da TV Globo, no dia 24, logo após o presidente o chamar de mentiroso.
Na troca de mensagens, Bolsonaro lhe envia uma matéria do site O Antagonista intitulada “PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas”. Em seguida, o mandatário escreve: “Mais um motivo para a troca”, se referindo à sua intenção de tirar Valeixo do comando da corporação.
Nesta terça, Bolsonaro mostrou na imagem de seu celular um diálogo que teve com Moro no dia anterior, em 22 de abril, no qual ele envia o link com a mesma matéria ao ex-ministro.
Na conversa, aparece a seguinte resposta de Moro à notícia: “Isso é fofoca. Tem um DPF (delegado da PF) atuando por requisição no inquérito das fake news e que foi requisitado pelo min Alexandre”, escreveu o ministro. “Não tem como negar o atendimento à requisição do STF”, continua Moro na troca de mensagens.
Bolsonaro usou a conversa para dizer que, pelo que disse Moro, seus filhos não seriam investigados pelo inquérito. O presidente também questionou a mudança na resposta do ex-ministro ao mesmo link enviado no dia seguinte.
Após a divulgação das mensagens, o ex-ministro Sergio Moro afirmou, em nota, que Bolsonaro deu outro contexto ao termo “fofoca” que usou no diálogo.
“Nas duas vezes [em que Bolsonaro mandou os links], ciente da intenção do presidente de substituir o diretor-geral da PF, busquei minimizar o fato, afirmando que quem conduzia o Inquérito era o ministro Alexandre de Moraes e que a PF só cumpria ordens. A ‘fofoca’ empregada na resposta à primeira mensagem tem esse sentido, de que a PF nada fazia além de seu trabalho regular”, diz Moro.
“Já em relação à segunda mensagem do presidente, não consegui responder à afirmação dele de que a existência deste inquérito seria ‘mais um motivo para troca na PF’. Entendo, respeitosamente, que cabe ao presidente da República explicar como o inquérito se relacionaria com a substituição do diretor-geral da PF”, continua o ex-ministro.
Nesta terça, Bolsonaro foi questionado sobre o motivo de ter escrito que era um motivo para a troca, mas não respondeu.
Durante a entrevista na frente da porta do Alvorada, em que evitou perguntas da imprensa e ameaçou deixar o local caso fosse questonado, porque não era um “interrogatório”, Bolsonaro também se referiu ao episódio desta terça pela manhã em que mandou repórteres calarem a boca.
Bolsonaro disse queria se desculpar “por ter sido grosseiro com uma senhora e um senhor aqui mais cedo”.
Em depoimento à Polícia Federal no último sábado (2), o ex-ministro da Justiça Sergio Moro afirmou que o presidente Jair Bolsonaro pediu a ele no começo de março deste ano a troca do chefe da Polícia Federal no Rio de Janeiro.
“Moro você tem 27 Superintendências, eu quero apenas uma, a do Rio de Janeiro”, disse Bolsonaro a Moro, por mensagem de WhatsApp, segundo transcrição do depoimento do ex-ministro à PF.
A íntegra do depoimento foi divulgada pela CNN Brasil inicialmente. A reportagem também teve acesso ao material.
Os investigadores perguntaram a Moro se ele identificava nos fatos apresentados em seu pronunciamento de saída do governo alguma prática de crime por parte de Bolsonaro. O ex-ministro disse que os fatos narrados por ele são verdadeiros, mas não afirmou se o presidente teria cometido algum crime.
“Quem falou em crime foi a Procuradoria-Geral da República na requisição de abertura de inquérito e agora entende que essa avaliação, quanto à prática de crime, cabe às instituições competentes”, disse Moro.
Segundo Moro disse em depoimento, o então diretor da PF, Maurício Valeixo, “declarou que estava cansado da pressão para a sua substituição e para a troca do SR/RJ”. “Que por esse motivo e também para evitar conflito entre o presidente e o ministro o diretor Valeixo disse que concordaria em sair”, afirmou o ex-ministro.
De acordo com Moro, em seguida o presidente Bolsonaro “passou a reclamar da indicação da Superintendente de Pernambuco”. Segundo ele, “os motivos da reclamação devem ser indagados ao Presidente da República”.
Segundo o ex-ministro, “o presidente lhe relatou verbalmente no Palácio do Planalto que precisava de pessoas de sua confiança, para que pudesse interagir, telefonar e obter relatórios de inteligência”.