EDITORIAL
MANAUS – O anúncio feito pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) na noite de quinta-feira (5) de que o PL vai encomendar uma auditoria independente e privada nas eleições dete ano está carregada de significados. O principal deles, o de que tal auditoria tem credibilidade zero, para usar uma expressão muito comum do próprio presidente.
Bolsonaro deu a dica ao fazer o anúncio. A empresa, segundo ele, “pode daqui a 30, 40 dias, chegar à conclusão que dada a documentação que tem na mão, dado o que já foi feito até o momento para melhor termos eleições livre de qualquer suspeita de ingerência externa, pode falar que é impossível auditar e não aceitar fazer o trabalho”.
Uma empresa séria aceitaria fazer o trabalho de qualquer forma, ao menos para dizer que o sistema do TSE não pode ser auditado, como quer provar Bolsonaro. Mas o próprio anúncio traz a marca da falsidade que permeia as falas de Bolsonaro neste tema. O próprio presidente levanta suspeitas de que a contratação é uma trama arquitetada por ele para desmoralizar o processo eleitoral brasileiro.
“Olha a que ponto podemos chegar”, diz Bolsonaro, numa mistura de cinismo e demência, e acrescenta que “estamos vendo o TSE” e alguns de seus ministros “ficarem numa situação bastante complicada”.
Aqui, o presidente da República sinaliza que já sabe o resultado do trabalho que a empresa que ainda nem foi contratada para fazer o serviço pode chegar. “Estamos vendo o TSE”? Quem está vendo? Ministros em “situação bastante complicada”? Por que? Sá se sabe o resultado antecipadamente?
Bolsonaro também ironiza o processo eleitoral brasileiro: “Afinal de contas, é o momento de o TSE mostrar para o mundo, através dessa empresa de autoria, que nós temos o sistema mais confiável do mundo no tocante às eleições, inclusive, vamos dar os parabéns pra Bangladesh e Butão também, que são os dois países apenas que fazem eleições com esse sistema eleitoral”. No fim, ele olha para os apaniguados, abre um sorriso cínico, levanta o polegar direito e pergunta: “alguma dúvida aí?”
Bolsonaro não desiste de tentar desacreditar as eleições brasileiras por um simples motivo: o desespero diante das pesquisas de intenção de voto. Se ele estivesse em situação confortável, nada disso seria necessário.
O leitor deve saber que existem dois tipos de pesquisa de intenção de voto: as dos institutos independentes para divulgação e as internas, encomendadas pela própria campanha do candidato. Estas segundas são mais confiáveis para quem as encomenda, porque quem aparece em posição desconfortável nas pesquisas sempre acha que há manipulação dos números.
Mas a pesquisa para consumo interno é feita por empresa ou instituição da maior confiança de quem contrata, e seu objetivo é falar a verdade para o candidato. Por enquanto, o quadro pintado a Bolsonaro não lhe agrada. Isso não significa que a eleição está perdida.
As pesquisas internas apontam caminhos que devem ser trilhados pelo candidato para convencer o eleitorado, mostra onde ele precisa trabalhar. E o quadro no momento é desesperador para quem está no poder e busca a reeleição.
Um candidato que busca a reeleição deve, a seis meses das eleições, estar com pelo menos 40% das intenções de voto para se sentir confiante. Bolsonaro patina entre 30% e 35% desde o ano passado. Tem mostrado crescimento dentro da margem de erro.
Por isso, é preciso jogar a sociedade contra as urnas eletrônicas. Bolsonaro sabe mais do que ninguém que aquela multidão que o segue nas visitas que faz aos municípios brasileiros não reflete o resultado das pesquisas. É um eleitorado fiel que faz sacrifícios pelo seu candidato, mas é um público limitado.
A única forma de não entregar os pontos é tisnar o processo eleitoral, desacreditar o TSE e as urnas eletrônicas para depois questionar o resultado das eleições.
Se Bolsonaro vai ganhar ou perder, ainda não é possível saber. A única certeza que se tem até aqui é que ele não aceitará o resultado das urnas.