Toda sociedade enfrenta problemas fundamentais provocados pela escassez relativa de fatores de produção. Tem que decidir o que produzir, como produzir, para quem produzir e onde produzir, uma vez que os fatores escassos têm usos alternativos. Essas decisões podem se realizar por mecanismos institucionais de comando e controle, como em algumas experiências socialistas no século XX. Ou através dos mecanismos de mercado onde as decisões econômicas em sua maioria são tomadas por indivíduos e não por instituições ou organizações coletivas (burocracias governamentais, partidos políticos, etc). Reserva-se para essa ideologia, que é contrária à intervenção do Estado na economia, a denominação de liberalismo econômico.
A partir de 1º de janeiro deste ano, iniciou-se uma nova administração pública do Governo Federal que se declara filiada ideologicamente ao liberalismo econômico. Mas, como as principais teses do liberalismo econômico tiveram sua origem no século XVI, quando então nasciam as primeiras experiências do capitalismo na Europa, e vieram a se estruturar, principalmente no século XVIII, a partir da obra clássica de Adam Smith, é fundamental analisar como diferentes opções ideológicas foram se configurando dentro do próprio liberalismo econômico.
Pouco a pouco, a intervenção do Estado foi avançando com maior ou menor intensidade diante dos desafios de três questões estruturais à medida que as sociedades se tornaram mais complexas.
A primeira questão se refere aos mecanismos e aos instrumentos de redução das desigualdades sociais e espaciais na distribuição da renda e da riqueza nacional, assim como na redução da pobreza e da miséria na sociedade. Alguns regimes econômicos se preocupam apenas em lidar com os problemas sociais dos idosos, dos incapazes e dos deficientes físicos, deixando que os estímulos e a dinâmica dos mercados promovam autonomamente uma distribuição mais equânime da renda e da riqueza nacional no longo prazo. Outros formulam e executam poderosas e abrangentes políticas sociais compensatórias que acabam absorvendo parcelas expressivas dos recursos fiscais e financeiros dos governos.
A segunda questão estrutural está relacionada às falhas de mercado, como a formação de monopólios, a exploração predatória dos ecossistemas, os elevados custos sociais e ambientais das atividades empresariais, a insaciável especulação financeira, etc. Há regimes que são mais tolerantes com essas falhas no funcionamento dos mercados; outros impõem estruturas regulatórias para o exercício do comando e controle da economia visando a preservar a qualidade dos bens e serviços, a conservar o meio ambiente, a garantir a defesa do consumidor, etc.
A terceira questão se refere a quais responsabilidades os governos devem assumir sobre a instabilidade dos ciclos econômicos e seus impactos perversos sobre os níveis de desemprego ou da inflação. Por exemplo, nos Estados Unidos, o Federal Reserve (o Banco Central Norte-Americano) conduz a política monetária com um olho na inflação e outro na manutenção do pleno emprego na economia. Por outro lado, alguns países concentram os seus instrumentos de política econômica apenas na perseguição das metas inflacionárias, utilizando preferencialmente poucas regras discricionárias para evitar intervenções mais frequentes e erráticas nos mercados.
Essa lista mínima de questões estruturais, que levaram as economias de mercado a se diferenciarem ao longo do tempo, coloca para o cidadão brasileiro um clima de perplexidade sobre as decisões pragmáticas, casuísticas e muitas vezes contraditórias das políticas públicas que, provavelmente, poderão ocorrer a partir da nova gestão da economia nacional. O que pode levá-lo a perguntar: liberalismo econômico, afinal de que se trata?
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