O Fórum Econômico Mundial começou nessa terça-feira, 21 e terminará na sexta-feira, 24, em Davos, na Suíça com representação do governo brasileiro. Fundado pelo professor de administração Klaus Martin Schwab, Fórum Econômico Mundial ocorre na Suíça, desde 1971, com o objetivo de debater anualmente as estratégias da economia mundial. Neste ano, cerca de 3 mil pessoas participam das discussões dos negócios para os próximos 12 meses, dentre eles, os 100 maiores bilionários mundiais.
De acordo com a organização do evento, na sua página oficial, o objetivo deste ano é “ajudar governos e instituições internacionais a acompanhar os progressos em direção às metas estabelecidas no Acordo de Paris e facilitar discussões sobre tecnologia e comércio exterior”. Além disso, um conjunto de temas definidos como alta prioridade serão discutidos ao longo desta semana: como salvar o planeta; sociedade e futuro do trabalho; tecnologia para o bem; economias mais jutas; melhores negócios; futuros saudáveis e a geopolítica mundial.
A depender do objetivo e das temáticas prioritárias, o Fórum Econômico Mundial aparentemente estaria bastante decidido a intervir na economia mundial em nome de “um mundo mais justo”. Entretanto, a pauta principal do evento é, na verdade, o debate dos negócios mundiais pautados na agenda neoliberal capitalista que não tem nenhum interesse em resolver as desigualdades econômicas e suas contradições em nível mundial. Pelo contrário, historicamente, as discussões priorizam a defesa dos interesses das grandes corporações capitalistas ao redor do mundo.
A abertura do evento coincidiu com a divulgação do relatório das desigualdades sociais, produzido pela Oxfam Internacional, uma respeitada confederação que reúne 19 organizações mundiais com o objetivo de estudar a produção capitalista da pobreza e das desigualdades. De acordo com o relatório da Oxfam, atualmente, a desigualdade econômica está fora de controle. Em 2019, os bilionários do mundo, que somam apenas 2.153 indivíduos, detinham mais riqueza do que 4,6 bilhões de pessoas que representam mais de 60% da população mundial. Ainda, de acordo com o relatório, os 22 homens mais ricos do mundo têm mais riqueza do que todas as mulheres da África.
Contraditoriamente, os analistas do Fórum Econômico apresentam uma balança positiva para o crescimento econômico mundial, inclusive do Brasil. Comparando o relatório das desigualdades sociais apresentado pela Oxfam e o crescimento econômico apresentado pelos economistas, conclui-se que a produção da economia neste modelo capitalista de produção não representa igualdade de direitos nem justiça social. Muito pelo contrário. Quanto maior a economia, maior e mais drástica é a pobreza. A produção da miséria acompanha a mesma proporção da produção da riqueza em grande escala.
O relatório da Oxfam denuncia que a produção da miséria pesa mais aos ombros das mulheres sobrecarregadas de responsabilidades que não são cobradas dos homens na mesma proporção como o que ocorre na área dos cuidados em que as mulheres são as principais prestadoras de serviços sem remuneração dedicados às crianças, aos idosos e às pessoas com deficiência.
A análise destes relatórios nos faz concluir que produção mundial da miséria faz parte da essência do sistema capitalista neoliberal que coloca os negócios e seus lucros acima dos valores humanos, éticos, morais e religiosos. O lucro é tão imoral que não conhece fronteiras e esta é uma das grandes contradições das discussões do Fórum Econômico Mundial que quer “salvar o planeta” ou apresentar “economias mais jutas” em meio à busca de estratégias para os “melhores negócios”. São questões contraditórias que não apresentam nenhuma convergência. Outra contradição é a discussão de “futuros saudáveis” sem considerar a possibilidade de mudanças radicais no modo de vida consumista promovido pelos “valores capitalistas”.
Em sua Encíclica Laudato Sì do Papa Francisco, apresenta discussões que não são pautadas no Fórum Econômico porque incomodam os “valores capitalistas”. Talvez por isso o Papa Francisco seja atualmente uma das personalidades mais influentes do mundo e mais odiada e perseguida pelos capitalistas, inclusive no interior da própria igreja.
De acordo com o Papa Francisco, não é possível planejar “futuros saudáveis” sem uma profunda conversão ecológica que assume dimensões pessoais e coletivas simultaneamente. O artigo 220 da Laudato Sì afirma que trata-se de uma conversão que comporta várias atitudes que se conjugam para definir um cuidado generoso e cheio de ternura. Em primeiro lugar, implica gratidão e gratuidade, ou seja, um reconhecimento do mundo como dom recebido do amor do Pai, que consequentemente provoca disposições gratuitas de renúncia e gestos generosos, mesmo que ninguém os veja nem agradeça. Implica ainda a consciência amorosa de não estar separado das outras criaturas, mas de formar com os outros seres do universo uma estupenda comunhão universal”.
Na contramão do Fórum Econômico Mundial o Fórum Social Mundial tem questionado a simultaneidade da produção dos super ricos e dos super pobres vinculada às agendas neofascistas, neoliberais e a retirada de direitos que se aprofundaram tanto no Brasil como no resto do mundo. Questiona a agenda defendida pelo mercado capitalista e incorporada pela extrema-direita que visa a retirada de direitos sociais, a restrição de direitos políticos das classes populares, a exploração sem precedentes da natureza e o aprofundamento da concentração de riquezas nas mãos de apenas 1% da humanidade.
Outras iniciativas como o Fórum Social Panamazônico, que será realizado de 22 a 25 de março de 2020 em Mocoa – Colômbia representam importantes debates das contradições do Fórum Econômico Mundial.
Marcia Oliveira é doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia (UFAM), com pós-doutorado em Sociedade e Fronteiras (UFRR); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia, mestre em Gênero, Identidade e Cidadania (Universidad de Huelva - Espanha); Cientista Social, Licenciada em Sociologia (UFAM); pesquisadora do Grupo de Estudos Migratórios da Amazônia (UFAM); Pesquisadora do Grupo de Estudo Interdisciplinar sobre Fronteiras: Processos Sociais e Simbólicos (UFRR); Professora da Universidade Federal de Roraima (UFRR); pesquisadora do Observatório das Migrações em Rondônia (OBMIRO/UNIR). Assessora da Rede Eclesial Pan-Amazônica - REPAM/CNBB e da Cáritas Brasileira.
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