Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Após a PGJ-AM (Procuradoria-Geral de Justiça do Amazonas) pedir a anulação de trechos de lei amazonense que garantem regalias a advogados presos provisoriamente, profissionais da advocacia pediram o fim de benesses também concedidas a membros do MP-AM (Ministério Público do Amazonas) e do Poder Judiciário.
Três advogados ouvidos pelo ATUAL afirmam que a norma apenas garante condições para que os profissionais presos continuem a trabalhar e manter o sustento da família e para que os clientes deles não sejam prejudicados. Contra as regalias, um dos advogados critica os privilégios concedidos não apenas à categoria, mas também a membros dos três Poderes.
A PGJ-AM contesta a Lei Estadual nº 5.661/2021, que define o que seria a Sala de Estado Maior – onde ficam os advogados presos. Essa norma garante ao preso o acesso a uma sala com notebook, internet, impressora e celular, as visitas de familiares duas vezes por semana e a possibilidade de prisão domiciliar diante da inexistência da Sala de Estado Maior.
Na ação protocolada no dia 5 deste mês, o procurador-geral de Justiça do Amazonas, Alberto Nascimento Júnior, afirma que a lei amazonense, ao definir o que seria Sala de Estado Maior, incluiu garantias incompatíveis com a Constituição do Estado do Amazonas e que “não encontram assento na legislação vigente e no entendimento jurisprudencial pátrio”.
“Desproporcional”
O advogado Eduardo Deneriaz Bessa afirma que a contestação da lei pela PGJ-AM é tendenciosa. “Ao meu ver, uma lei sempre tem que ser debatida, em qualquer momento que seja, tanto no nascedouro como em sua revogação. Porém, quando o debate é feito de forma tendenciosa, nasce a preocupação de toda uma classe”, afirmou o profissional.
Para ele, o posicionamento da PGJ é “desproporcional, mesquinho e inconstitucional”. “De uma vez só ele confunde a finalidade da Sala de Estado Maior enquanto espaço para estada provisória, e retira o alimento da mesa do advogado, ao querer impedi-lo de trabalhar, sem que haja uma decisão fundamentada, ou a condenação transitada em julgado”, disse.
Com duras críticas, Bessa relata que, diante de problemas, o Ministério Público do Amazonas “ou é inerte ou caminha a passos de formiga”. “Ao se deparar com isso a OAB enquanto instituição não fica discutindo a celeridade do órgão ministerial, ou fazendo retaliações contra a morosidade de qualquer órgão que esteja ligado do Poder Judiciário”, disse.
Ainda conforme Bessa, o Ministério Público nunca propôs “desarmar promotores, acabar com os carros oficiais, enxugar os cargos comissionados”. “Nunca vimos porque muitas vezes tais benesses são inerentes ao bom desenvolver do cargo e o MP sabe disso, a OAB sabe disso, e mesmo sabendo a OAB não faz pirotecnia em cima disso”, disse o advogado.
Bessa compara as benesses entre advogados e promotores de Justiça. “Em regra o advogado se for preso precisa trabalhar para manter a subsistência familiar, ao contrário de qualquer outro ator ligado ao Estado Juiz, que estará com seus proventos garantidos, estando preso provisoriamente ou solto”, afirmou o profissional.
Direito
O advogado Edigley Oliveira defende as regalias como direito do profissional preso de continuar a trabalhar e garantir o sustento da família, mas também como proteção aos clientes dos advogados presos para que não percam prazos na Justiça, por exemplo. “O advogado é indispensável à administração da Justiça”, disse Oliveira.
“Imagina que um profissional que tem mil processos de uma hora para outra fique impossibilitado de trabalhar. Imagina o transtorno que os clientes dele vão sofrer, perdendo prazos. O objetivo da lei muito mais do que beneficiar o advogado é proteger as partes que são representadas por ele”, afirmou Oliveira.
“Nesse caso, o advogado tem que ter sim algumas ‘regalias’, mas não é uma regalia para beneficiar o profissional, mas muito mais para proteger as partes que são patrocinadas por ele. Por isso que a lei exige que o Estado possibilite ao advogado os meios necessários para ele continuar trabalhando”, completou Oliveira.
Regalias
Para o advogado Carlos Santiago, a advocacia deve trabalhar não para buscar regalias, mas para “extirpar os privilégios que se tem nesse país”. “Esse deve ser o ânimo da advocacia. Uma advocacia que prima pelos princípios republicanos, não que busca privilégios, nem se iguala em privilégios às outras profissões”, afirmou.
“Se o Brasil quer ser um país republicano, tem que extirpar qualquer tipo de regalia, tanto faz da advocacia, como do Ministério Público ou do Poder Judiciário. Se a advocacia está pleiteando algo que é contra o sistema republicano e está errado, tem que reavaliar a sua postura”, afirmou Santiago.
O advogado afirma que, em um país de milhões de desempregados, a elite profissional, jurídica e política não pode estar em um “patamar de privilégios em detrimento da sociedade que paga os tributos”. “Esse país tem que acabar com o chamado foro privilegiado de magistrados, deputados e membros do Ministério Público”, disse.
“Um profissional, seja de que área for, médico, membro do MP, do poder judiciário, se trabalhar de forma honesta, séria, limpa, certamente, não precisará nunca de benefícios de lei para se proteger. O país não pode mais suportar tantos privilégios, onde amparados e dados aos senhores da república que não respeitam os princípios republicanos”, completou.
Para Santiago, a isonomia que deve ser cultuada e buscada é “do princípio republicano, no qual ninguém pode ser tratado como cidadão de primeira ou de segunda classe”. “Em uma republica como é a brasileira, deve ser buscada sempre a igualdade de todos os brasileiros”, finalizou o advogado.