Por Felipe Campinas, da Redação
MANAUS – Ao abastecer o carro em um posto de combustível na zona centro-sul de Manaus, a professora Ana Patrícia Anunciação, de 45 anos, pagou R$ 150 por 20,57 litros de gasolina aditivada, cujo litro custa R$ 7,29. A nota fiscal da compra detalha que, do valor pago, R$ 54,75 correspondem a impostos, sendo R$ 38,25 estadual e R$ 16,50 federal.
Para a professora, o fardo tributário sustentado pelos consumidores é injusto . “A carga tributária sobre o preço da gasolina é muito pesada e até injusta para o consumidor. Diante do cenário de pandemia, penso que esses impostos deveriam ser repensados porque o impacto desse aumento desenfreado é catastrófico em todos os segmentos”, disse Ana.
No Amazonas, o imposto estadual que incide sobre a gasolina – o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) – tem alíquota de 25%. Na composição do preço da gasolina, a taxa estadual soma-se aos impostos federais (CIDE e PIS/PASEP e COFINS), que correspondem a 10%, além do custo do etanol anidro e da distribuição e revenda.
Vinte e cinco por cento do ICMS recolhido alimenta os municípios. Para a maioria das cidades amazonenses, os repasses são praticamente uma das únicas fontes de receita estadual. A partir da partilha da receita com o imposto, as administrações municipais mantêm boa parte dos serviços essenciais, assim como o pagamento do funcionalismo público.
De janeiro de 2021 a março deste ano, a Petrobras reajustou o preço dos combustíveis 13 vezes, segundo dados do OSP (Observatório Social da Petrobrás), entidade ligada à FNP (Federação Nacional dos Petroleiros). A maior alta foi registrada no último dia 10 de março, com aumento de 18,7% da gasolina e de 24,9% do diesel S-10.
Os reajustes da estatal refletiram no preço dos combustíveis na bomba e, consequentemente, na arrecadação estadual. Em 2021, a Sefaz-AM (Secretaria de Fazenda do Amazonas) arrecadou R$ 2,7 bilhões com ICMS sobre os combustíveis nos três setores (indústria, comércio e serviços), que representou uma alta de 13% em comparação com 2020, ou seja, R$ 310 milhões a mais.
De acordo com o mapa de arrecadação do governo estadual, em 2021, apenas na indústria, a apuração de ICMS sobre combustível chegou a R$ 878,644 milhões, com a média mensal de R$ 73,2 milhões. No comércio, a apuração alcançou R$ 1,828 bilhão, com média mensal de R$ 152,3 milhões; e na área de serviços, R$ 56,8 mil.
Para efeito de comparação, em 2020, a apuração do ICMS registrou alta de apenas 3,6% em relação a 2019, com incremento de R$ 2,396 bilhões na arrecadação total do Estado do Amazonas. Em 2019, a Sefaz havia totalizado R$ 2,311 milhões com os tributos sobre os combustíveis no estado.
O secretário estadual de Fazenda do Amazonas, Alex Del Giglio, afirma que o aumento da arrecadação sobre os combustíveis em 2021 é decorrente da política de preços da Petrobras, que considera o preço dos combustíveis praticado no mercado internacional para definir os valores que serão cobrados dos brasileiros.
Del Giglio explica que, com a alta do barril e do dólar no ano passado, houve aumento de preços de combustíveis no Brasil. “Como a gente teve uma depreciação do câmbio e o aumento do preço do petróleo no mercado internacional, a base de cálculo do tributo aumentou e todos os estados arrecadaram mais”, disse Del Giglio.
De acordo com o secretário, o sucesso na arrecadação em 2021 não deve se repetir este ano, pois a base de cálculo de ICMS sobre combustíveis no Amazonas está congelada desde novembro. “A tendência é redução de arrecadação em termos reais. Ainda que a gente tenha um pequeno incremento nominal, a tendencia é crescer bem abaixo da inflação”, afirmou.
A base de cálculo foi congelada pelo governador Wilson Lima em uma ação adotada pelos governadores para mostrar que o ICMS não influencia na alta de preços dos combustíveis. Para isso, os estados congelaram o valor do ICMS, inicialmente entre novembro de 2021 e o final de janeiro, mas a medida não impediu que novas altas acontecessem.
Veja como foi a arrecadação de ICMS sobre combustíveis no Amazonas em 2021.
‘Briga’
A ação dos governadores de congelar a base de cálculo do ICMS sobre os combustíveis foi uma resposta ao presidente Jair Bolsonaro (PL), que culpou os estados pela alta de preços. O mandatário disse que os impostos federais sobre os combustíveis estão congelados desde 2019, enquanto o ICMS incide em média 30% sobre o preço final na bomba.
Vinte governadores assinaram, em setembro de 2021, uma carta desmentindo o presidente – o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), não assinou o documento. No texto, eles afirmaram que a alta do preço era resultado da política de preços da Petrobras, que faz reajustes com base nas oscilações do barril de petróleo no mercado internacional.
Em fevereiro deste ano, em live nas redes sociais, Bolsonaro afirmou que o Ministério da Justiça entraria com ações contra os governos estaduais em razão da alta na arrecadação com o ICMS sobre os combustíveis. Ao defender a unificação do imposto estadual, o presidente disse que os estados “estão lucrando e muito com o ICMS”.
Em março, o Congresso Nacional aprovou e o presidente sancionou o projeto que determina a criação de uma alíquota única em todos os estados para o ICMS. A proposta foi uma maneira que o governo encontrou para tentar forçar os governadores a mudar o imposto sobre combustíveis em um momento de alta de preços e avanço da inflação.
No dia 24 de março, o Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária), formado pelos 26 estados, o Distrito Federal e representantes do Ministério da Economia, anunciou que a alíquota única sobre o diesel terá um limite máximo de R$ 1,006 no país, mas cada estado poderá conceder uma espécie de benefício fiscal.
De acordo com o Confaz, as novas alíquotas passam a valer em 1º de julho. Até lá, a cobrança de ICMS sobre os combustíveis, inclusive do diesel, continuará sendo feita sobre os preços de referência praticados em novembro do ano passado, mantendo o congelamento adotado pelos governadores.
O secretário de Fazenda do Amazonas, Alex Del Giglio, explica que, nos próximos meses, o Confaz deve fazer os ajustes em relação a gasolina, ao álcool etílico e ao gás natural. “Enquanto a gente não fizer a nova sistemática do álcool etílico, da gasolina e do gás natural, a gente vai adotar os preços referentes a novembro de 2021”, disse o secretário.