Por Frederico Vasconcelos, da Folhapress
SÃO PAULO – Alvo de duas representações do PSL no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, recebeu apoio em carta pública assinada por 350 procuradores.
Subprocuradora-geral da República, Duprat é reconhecida no MPF como defensora de minorias e pessoas vulneráveis.
Ao longo de mais de três décadas de atuação no MPF, Duprat “é um símbolo da função ministerial de caráter contramajoritário, que se destaca nos espaços da jurisdição e tem presença ativa em territórios e comunidades que clamam por acesso à justiça”, afirma o manifesto.
“Eventual punição por desempenho desse papel significa grave enfraquecimento ao sistema de proteção dos direitos humanos.”
Em um dos casos, segundo informou a Folha de S.Paulo, Duprat acionou o MEC contra uma nota enviada a escolas proibindo professores, pais e alunos de convocarem atos políticos em horário letivo.
A carta é assinada pelos ex-procuradores gerais Claudio Fonteles e Rodrigo Janot, e cinco procuradores que exerceram o cargo de procurador (a) dos Direitos do Cidadão: Álvaro Augusto Ribeiro Costa (1991-1996); Wagner Gonçalves (1996-2000); Ela Wiecko Volkmer de Castilho (2004-2008); Gilda Pereira de Carvalho (2008-2012) e Aurélio Virgílio Veiga Rios (2012-2016). Assinam o documento mais 343 procuradores.
Em fevereiro de 2018, Duprat encabeçou a nota técnica sobre a intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro. O MPF considerou que o Decreto nº 9.288 “ressente-se de vícios que, se não sanados, podem representar graves violação à ordem constitucional e, sobretudo, aos direitos humanos”.
Em maio de 2018, Duprat foi reconduzida ao cargo para o biênio 2018-2020 em decisão unânime do Conselho Superior do Ministério Público.
Eis a íntegra da manifestação:
“Em defesa da atuação do Ministério Público em direitos humanos
As recentes representações promovidas contra a Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão no CNMP constituem tentativa de intimidação pessoal e ataque à atuação do Ministério Público brasileiro na defesa de direitos humanos.
As representações tratam como irregularidades aquilo que é dever de todos os membros do Ministério Público: a atuação pela concretização dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, estabelecidos na Constituição, notadamente os de construir uma sociedade livre, justa e solidária, erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º).
Os membros do Ministério Público assumem desde a posse o compromisso com a concretização desses objetivos e com a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127).
A atuação em direitos humanos não é sinônimo de ‘postura ideológica’, mas de cumprimento de um dever constitucional.
A defesa de minorias e pessoas vulneráveis pelo Ministério Público viabiliza a efetivação dos direitos de grupos cuja representação política se mostra assimétrica em conflitos sociais. A Subprocuradora-Geral da República Deborah Duprat, ao longo de mais de três décadas de atuação no MPF, é um símbolo da função ministerial de caráter contramajoritário, que se destaca nos espaços da jurisdição e tem presença ativa em territórios e comunidades que clamam por acesso à justiça.
Cabe destacar que o exercício do cargo de Procurador/a Federal dos Direitos do Cidadão requer, diante de seu papel de ombudsman, intenso diálogo com a sociedade civil e cobrança de respeito e zelo aos direitos humanos pelo Estado brasileiro, nos moldes do art. 39 da Lei Complementar n° 75/1993. Eventual punição por desempenho desse papel significa grave enfraquecimento ao sistema de proteção dos direitos humanos.
No atual cenário de danos sistemáticos a direitos individuais e sociais, como direito à informação e participação e direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, entre outros, e de naturalização da violência, o Ministério Público torna-se ainda mais essencial à preservação do regime democrático.
A provocação da via correicional para tolher o debate sobre certas pautas, especialmente das minorias, não visa a atingir apenas a titular da PFDC; objetiva constranger e intimidar a atuação de todo o Ministério Público, ao pedir uma intervenção indevida do CNMP na atividade fim de seus membros, em contrariedade ao artigo 130-A, §2º, I, da CF. Caso acatado, o controle disciplinar da atividade-fim ameaçaria a independência funcional garantida pela Constituição para que, balizados pelo ordenamento jurídico, os membros tenham a necessária liberdade para fazer valer os valores constitucionais.
Não é a primeira, nem será a última vez que a atuação do Ministério Público em defesa dos direitos humanos é alvo de ataques ou retaliações. Hoje, tal como ao longo dos últimos 30 anos, os Procuradores e Procuradoras seguirão com a mesma resposta: trabalho sério, independente e técnico, em diálogo com a sociedade e compromissado com a efetivação dos direitos fundamentais.”