Por Milton Almeida, do ATUAL
MANAUS – Fruto típico da Amazônia, com múltiplas aplicações, da alimentação à perfumaria, o açaí também é ingrediente de cerveja. A bebida é de classificação artesanal, mas dependendo da aceitação do consumidor pode ter fabricação industrial.
Também em caráter experimental, mas disponível para testar o gosto do consumidor, a cerveja à base de macaxeira é outra inovação com a raiz muito consumida frita, cozida ou purê.
Para Gilberto Tarantino, presidente da Abracerva (Associação Brasileira da Cerveja Artesanal), os ingredientes amazônicos podem fornecer composições para, futuramente, substituir itens da cerveja industrial.
“No caso da mandioca, existem várias formas de utilização. Ela pode fornecer amido para a composição do mosto que depois será fermentado. Desta forma, a mandioca poderia substituir, na forma de fécula, parte do malte de cevada, trigo, aveia, milho e outros ingredientes. Temos um projeto, chamado Manipueira Selvagem, no qual mais de 50 cervejarias do Brasil, inclusive do Amazonas, utilizam a mandioca”, diz Tarantino.
Conforme a Abracerva, há 1.847 cervejarias no Brasil, das quais 50 são de grandes grupos empresariais e o restante são independentes ou artesanais. A maioria está na Região Sudeste. O Amazonas tem uma cervejaria para cada 788.323 habitantes. “No caso do açaí, em geral, as frutas são inseridas na etapa de maturação (da cerveja), mas certamente os cervejeiros da região amazônica vão saber muito melhor do que eu”, diz.
“Antigamente, todo mundo falava só da água, que o sabor dependia da água. Mas hoje os consumidores entendem, por exemplo, que existe uma profusão de leveduras. O malte também pode ter várias pegadas diferentes, assim como o lúpulo, que funciona como se fosse a pimenta da cerveja”, diz Tarantino.
O preço da garrafa desse tipo de cerveja varia de R$ 14 a R$ 35 nos bares de Manaus. De 2022 a 2024, a Região Norte registrou aumento de 16,7% na abertura de cervejarias artesanais. São 42 fabricantes, segundo dados da Abracerva.
Com responsabilidade
O processo artesanal precisa ter registro no Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), diz Bruno Silva, proprietário da Cervejaria Rio Negro, em Manaus. “A produção da cerveja artesanal é algo muito sério. Tem gente que fabrica como hobby em casa, mas a produção é fiscalizada por órgãos federais. Não é qualquer negócio e tem uma regulamentação muito dura”, diz Bruno. Cerveja muito barata, desconfie, aconselha o empresário.
Para José Gomes, sócio da Cervejaria Saropó, em Novo Airão (a 197 quilômetros de Manaus), a fabricação de cerveja artesanal no Amazonas cumpre normas severas. “A nossa cerveja não tem como competir com as cervejas nacionais, no que se refere a preços, mas nós colocamos qualidade e valorizamos à economia local. Além disso, as pessoas ainda não estão acostumadas a tomar cervejas com ingredientes de frutas. Mas temos uma cerveja de qualidade”, diz Gomes.
A Abracerva recomenda que o consumidor olhe o número de registro do produto no Mapa que consta no rótulo. Cervejaria Rio Negro produz as cervejas Berliner Weiss com açaí e amora e a APA(American Pale Ale) com pimenta murupi.
“A cerveja com açaí é uma cerveja leve, suavemente ácida, 3,5% de álcool. Bem refrescante com o aroma do açaí e da amora. A APA com Murupi é uma cerveja também suave, com 5% de álcool, amargor suave, com pimenta murupi no aroma, no sabor, um pouco picante para os amantes da pimenta. Podem ser consumidas com saladas, peixes assados, caldeirada e bolinhos de peixes”, descreve José Gomes.
Para a Abracerva, a cerveja artesanal não é um produto “elitizado”, mas uma bebida para todos os públicos. “A cerveja artesanal é para todos. Por essência é uma bebida popular. Quando trazemos novos sabores ou quando aproximamos a cerveja da gastronomia, isso não significa elitizar ou selecionar o público, mas trazer a cerveja à mesa no brasileiro”, Tarantino.
Desafios tributários
Segundo Bruno Silva, a tributação que recai sobre a produção de cervejas artesanais e locais é “muito severa” e é um setor que “não tem benefícios fiscais”.
“Competimos com as grandes cervejarias nacionais e de fora do país. A pandemia foi um tempo muito difícil para a cervejaria artesanal, algumas fecharam. Nós temos dez anos de mercado e o processo da produção artesanal ainda não tem incentivos fiscais da zona franca”, diz.
Segundo o Mapa, a cerveja fabricada no Brasil deve cumprir a Instrução Normativanº 65, publicada em 2019, em qualidade e identidade.
O coordenador-geral de Vinhos e Bebidas do Mapa, Carlos Muller, diz que antes desta norma (IN, nº65), o consumidor não entendia as informações que constavam nos rótulos das cervejas. “Simplificando as denominações que devem estar nos rótulos, a gente torna a informação ao consumidor mais clara e direta. Isso melhora a comunicação da real natureza do produto e a comunicação do produtor com o mercado consumidor, sem omitir informações e sem usar eufemismos para falar da característica do produto”, diz Muller.