Foi aprovado no Congresso Nacional o projeto que amplia a privatização do uso da água e dos serviços de abastecimento e tratamento de esgoto. Eu votei contra esse projeto que atende os interesses de alguns grupos econômicos, e não a ampla maioria da população brasileira.
A história é antiga. Dizem que o serviço público é ruim e que a iniciativa privada é eficiente. Ora, a iniciativa privada tem interesse no lucro, não em atender toda a população e resolver os problemas de água. As empresas vão para onde é vantajoso. O exemplo é Manaus.
Em 2000, o governador Amazonino Mendes vendeu a valores abaixo do mercado e passou os serviços de água para uma empresa francesa. Esta empresa já mudou quatro vezes de sócio e até hoje não levou água para toda a cidade. Não cumpre metas. Além disso, no interior do Amazonas, a empresa estadual COSAMA atende 12 municípios e nos demais 48 municípios as prefeituras cuidam da água. Nenhuma empresa tem interesse. Esgoto muito menos. Portanto, esses serviços somente o poder público poderá atender.
No ranking das dez piores cidades em coleta de esgoto, Manaus aparece na sexta colocação, com apenas 12,43% da população beneficiada, dado do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS – base 2018). A situação da capital amazonense é pior do que Belém e Macapá. Não há investimento pela empresa privada, pois não dá lucro.
A Lei 11.445/2007, a Lei do Saneamento Básico, tratando sobre as políticas de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto, coleta e destinação de resíduo sólido, limpeza pública e canalização de águas pluviais (águas de chuva), foi um grande avanço no Governo Lula, com recursos para estados e municípios. Mas já no governo Temer começaram a cortar verbas para saneamento e agora, no governo Bolsonaro, fizeram alteração da lei para beneficiar a iniciativa privada e prejudicar os serviços públicos.
Se a privatização fosse a solução, mais de 260 cidades do mundo, como Paris, não estariam desprivatizando. Pois as empresas privadas não querem cuidar da água e esgoto em cidades menores e mais pobres do país, pois não tem retorno econômico.
A aprovação final do PL das Privatizações das Águas, o PL 4162/19, que já tinha passado pela Câmara dos Deputados, onde teve grande debate e com meu voto contrário, cria o monopólio privado da água e esgoto no Brasil. Foi criticado por dezenas de organizações da sociedade civil, que lutam pelo direito à água. Ou seja, entendem que a água não pode ser considerada uma mercadoria, em que o acesso é para quem tem dinheiro. Ninguém vive sem água. E o poder público deve garantir que todas as pessoas tenham acesso a esse bem fundamental à vida.
O Partido dos Trabalhadores foi contra esse projeto, relatado pelo senador Tasso Jereissati, do Ceará, um dos homens mais ricos do país, que tem empresas de refrigerante interessadas nos estoques hídricos do Brasil.
Neste período da pandemia, onde no Brasil já morreram 60 mil pessoas e no AM 2.843 pessoas, a prioridade deveria ser no combate à doença, incluindo investimentos públicos para que a população pudesse ter água em sua casa. Mas os interesses econômicos têm falado mais alto, representados por uma bancada no Congresso que faz negócios se aproveitando do momento de sofrimento da população, que está morrendo pela pandemia.
Muitas pessoas e entidades se manifestaram contra a privatização da água. A professora Elisiane Souza de Andrade pergunta: a quem interessa a privatização da água? O também professor Waldemir José, ex-vereador, lembra que foi Lula quem investiu para construir o Proama, com recursos públicos, e levar água para as zonas Leste e Norte de Manaus. O delegado João Victor Tayah lembra que o AM é o 3º Estado do Brasil com maior desperdício de água tratada, prejudicando a população. O Francisco Praciano, que foi vereador e deputado federal, lá do Ceará, enfatiza a luta em 2000, contra a venda da Cosama e entrega da água para dar lucro para uma empresa. E em Manaus, o Padre Sandoval, dos Jesuítas, escreve artigo onde diz que são 20 anos de conflitos, descaso e insatisfação em relação ao serviço de água em Manaus.
Água não é mercadoria. É vida. É direito do povo. Obs. Foi aprovado no Congresso Nacional, esta semana, a prorrogação das eleições municipais. A campanha começa dia 26 de setembro, com 1º turno marcado para 15 de novembro e 2º turno no dia 29 de novembro.
José Ricardo Wendling é formado em Economia e em Direito. Pós-graduado em Gerência Financeira Empresarial e em Metodologia de Ensino Superior. Atuou como consultor econômico e professor universitário. Foi vereador de Manaus (2005 a 2010), deputado estadual (2011 a 2018) e deputado federal (2019 a 2022). Atualmente está concluindo mestrado em Estado, Governo e Políticas Públicas, pela escola Latina-Americana de Ciências Sociais.
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