EDITORIAL
MANAUS – Há muito se diz que a corrupção no Brasil é um câncer. Os fatos históricos corroboram essa assertiva, pois, como um câncer, atinge praticamente todos os órgãos da administração pública e grande parte das empresas privadas, quando não ocorre em simbiose, ou seja, misturando o público com o privado.
Apesar dos discursos anticorrupção que moldaram a política brasileira nos últimos anos, o que se vê, quando se tem um olhar mais atento, é que houve uma evolução da mecânica da corrupção.
Antes, em um Brasil bem distante, o gestor era extorquido por determinados espertalhões que queriam se dar bem e viam na administração pública a chave para ganhar dinheiro. Nessa época, a vida privada do administrador era um prato cheio para os sanguessugas praticarem a extorsão.
Em outro momento mais próximo dos tempos atuais, o empresário contratado pelo gestor é que passou a ser extorquido e obrigado a pagar para acessar os serviços públicos. Atraso nos pagamentos quase nunca ocorria por falta de dinheiro, mas como mecanismo para forçar o prestador de serviço a abrir mão de parte do valor a receber para ter o dinheiro em mãos.
Agora, Brasil afora, o agente corrupto é o próprio dono do contrato ou sócio de empresários contratados pelo Estado. E esse agente corrupto não está apenas em uma instância de poder, mas permeia todos os poros da administração pública, inclusive os órgãos de controle, que deveriam combater a corrupção.
Muitos criam empresas em nome de terceiros para driblar a legislação que os proíbe de firmar contratos com o Estado. A tão propalada Lei 8.666/1993 (Lei Geral de Licitações e Contratos) é solenemente burlada, e as licitações são direcionadas aos escolhidos previamente para vencer os certames.
Nessa nova configuração dos esquemas corruptos, não há mais instituições fortes. As raras exceções de vozes que se levantam para combater essa mecânica logo são silenciadas, caem no esquecimento.
As investigações que se iniciam nem chegam a ser conhecidas da sociedade, porque ganham destinos alheios à investigação. Até aquele segundo momento, quando o empresariado passou a ser extorquido, os órgãos de controle no Brasil desempenhavam papel preponderante no combate à corrupção, mas aos poucos perderam força, dando lugar a um alinhamento descarado.
Até a primeira década deste século, o Brasil registrou avanço na legislação para combater a corrução, como as que obrigaram a administração pública a dar transparência aos atos administrativos. A Lei de Acesso à Informação foi recebida com frisson, mas não goza mais de tanto prestígio.
Há grande dificuldade para qualquer cidadão que queira denunciar um esquema corrupto de encontrar a autoridade certa que vai, de fato, investigar as suspeitas.
Fica a sensação de impotência, de que não há o que fazer. Fica um sentimento de que a guerra foi perdida e que cada um deve seguir como se nada estivesse enxergando. Até quando? Como quebrar esse ciclo? Como evoluir para quebrar essa nova mecânica da corrupção no Brasil?