Por Rosiene Carvalho, da Redação
MANAUS – Na semana passada, o jornal Folha de S. Paulo apresentou dados que mostravam um aumento do número de homicídios no Amazonas nos primeiros dias de fevereiro na comparação com o mesmo período do ano passado e atribuía esse crescimento à fuga de detentos no início do ano e a liberação de presos do sistema carcerário do Amazonas, depois dos mutirões realizados pela Defensoria Pública, Ministério Público e Judiciário, após as chacinas de janeiro, que deixaram 64 mortos. Em entrevista ao ATUAL, o secretário de Segurança Pública do Amazonas, Sérgio Fontes, não contesta os números, mas diz que o crime é um fenômeno dinâmico e quase no fim do mês o quadro é outro: dos 80% de aumento no dia 11, data em que a Folha analisou os dados, o número de homicídios caiu para 4% no dia 21. Sobre a relação crime-soltura de presos, o secretário afirma que é indevida, porque não há elementos que possam comprovar tal afirmação. Fontes compara o número de homicídios registrados em janeiro de 2017 em Pernambuco e no Amazonas para dizer que a situação do Estado “está longe de ser uma situação das piores”. Sobre os inquéritos que apuram as mortes nos presídios em janeiro, o secretário diz que um está pronto, outro está em fase final de conclusão e o terceiro deve ser concluído em até dois meses. A seguir a entrevista concedida à jornalista Rosiene Carvalho, na sede da SSP-AM, na quarta-feira, 22.
ATUAL – Nós gostaríamos que o senhor comentasse os dados divulgados nacionalmente sobre o aumento da violência em Manaus até o início de fevereiro, principalmente o número de homicídios, e o que fez com que esses dados mudassem nos últimos dez dias.
SÉRGIO FONTES – Pois é… Como eu havia comentado, o crime é um fenômeno dinâmico, está em constante mudança. Nós terminamos o mês de janeiro com índices inferiores aos de janeiro de 2016, em que não houve nenhum problema. Se você retirar as 64 mortes do sistema prisional – que a Secretaria de Segurança não teve como intervir nesse processo –, nós tivemos uma diminuição de 11% em janeiro. Em números, em janeiro de 2016 foram assassinadas 90 pessoas; em janeiro de 2017 foram 80. Uma diminuição de 11%. O mês de fevereiro começou, de fato, com a criminalidade em alta, por vários motivos, inclusive, a questão do combate que se instalou entre duas facções aqui no nosso Estado e no Brasil inteiro. Então, de fato, quando a Folha de S. Paulo fez a sua reportagem, nós tínhamos 80% de aumento no mesmo período, mas é uma amostra muito pequena. Foi no dia 11 de fevereiro, então, havia só 11 dias. Então, nós saímos de 80 e poucos por cento de aumento e hoje, dia 21, com uma diminuição de 4%. O que aconteceu? Nós reunimos constantemente o sistema, e a gente percebeu, no começo de fevereiro, essa tendência de aumento e intensificamos [o policiamento] nas áreas vermelhas e nos horários em que estavam acontecendo esses homicídios. Com isso, conseguimos baixar para menos de 4%. Nós temos que acompanhar os números dia a dia. Isso significa que vamos terminar o mês de fevereiro com diminuição? Não! Eu espero, sinceramente, que sim. Nós vamos estar na rua, mas temos o carnaval. E basta que um dia eu tenha um desvio na curva, e a gente termina alto. Fazer segurança pública e viver cada dia com a sua agonia.
ATUAL – Esse aumento da criminalidade no início do mês está relacionado a uma repercussão de crise do sistema prisional que a gente ainda vive?
FONTES – Eu diria que sim. Seria ingênuo das forças de segurança pensar que a coisa parou naquele evento do começo do ano. Não. Nós temos as represálias, a possibilidade muito grande de o PCC atuar em vingança daqueles que foram mortos no dia 1° de janeiro. E isso tem ocorrido. Muitas execuções têm ocorrido fora. Mas com a polícia na rua, com inteligência e com muitas prisões de assassinos, nós conseguimos baixar. Pode-se dizer que está tudo sob controle? Não. Tem um equilíbrio tenso, que pode ser rompido a qualquer momento.
ATUAL – É correto fazer relação desse aumento de homicídios em fevereiro com a soltura de presos que estavam nas cadeias depois dos mutirões carcerários?
FONTES – É a teoria do “tostine”, você não sabe exatamente. A gente não pode descartar essa possiblidade, mas não temos nenhum elemento que possa garantir essa afirmação. Por isso que a afirmação da reportagem que você se referiu não é 100% verdadeira nesse aspecto. Ela trabalha com suposição. É possível que tenha aumentado por conta, mas não tem elementos para isso. E que elementos seriam esses? A gente prender egressos que foram soltos nesses últimos dias cometendo novos crimes. Nós não temos esse elemento. A gente não pode dizer que é isso, até porque pode ser também – e é uma possibilidade tão razoável quanto – a briga de quadrilhas extrapolando os limites do sistema prisional. Isso talvez seja até mais provável, porque tem ocorrido não só aqui como em outros Estados [Depois da entrevista, Sérgio Fontes disse que 80% dos homicídios são de pessoas ligadas ao tráfico de drogas].
ATUAL – Existem episódios no passado de picos de registro de homicídios em função de brigas de facções?
FONTES – Existem. Existe, por exemplo, um episódio que acho que você não esqueceu, que foi aquela chacina que ocorreu em 2015. Em um final de semana morreram 37 pessoas. Isso a gente tem que tomar cuidado. Na verdade, o sistema prisional precisava ser avaliado. Nós compreendemos a necessidade de uma reavaliação da população carcerária, e não podemos dizer, sob pena de estar cometendo um erro, que uma coisa tem necessariamente a ver com outra. Ou seja, o aumento da violência tem a ver com a soltura dos presos. Não podemos fazer essa afirmação.
ATUAL – Como está o número de fugitivos do sistema prisional no inicio do ano que foram recapturados?
FONTES – Em determinado momento, nós concentramos muito no seguinte: dos que fugiram nos primeiros dias do ano quantos foram recapturados? Nós paramos de fazer essa conta porque foragido é foragido. Então, começamos a somar todos os foragidos que foram recapturados e já estamos em quase 130 detentos que voltaram aos presídios.
ATUAL – Nessa conta o senhor leva em consideração também aqueles que não se reapresentaram depois de liberados para as festas de fim de ano?
FONTES – Não, foragidos… Foragidos de outras fugas, de outras cidades. Estamos contando com a ajuda da população. O telefone 181 é muito importante. Eu diria que a maior parte dessas prisões são decorrentes da atuação do cidadão comum, que passa a informação, através do 181 ou através do nosso WhatsApp que foi montado pra isso. Ainda temos em torno de 100 presos foragidos do início do ano para recapturar.
ATUAL – O senhor disse que foram abertos três inquéritos para apurar as mortes nos presídios. Como estão esses inquéritos? Qual a previsão de conclusão?
FONTES – O inquérito da Cadeia Pública [Raimundo Vidal Pessoa], das mortes ocorridas no dia 8 de janeiro, já está pronto. Eu ainda não recebi o relatório, mas tenho informação de que ele está pronto. O do Compaj, onde ocorreu a maioria das mortes e talvez fosse o mais difícil, também já está em fase final de conclusão. Mais uns 15 dias, 20 dias ele será concluído. O do [presídio] do Puraquequara é que está um pouco mais complicado por motivos que a investigação vai esclarecer, mas está um pouco mais atrasado. Eu tenho um pronto, um para aprontar e outro que está um pouco mais atrasado e precisa de um pouco mais de atenção.
ATUAL – Mas todos devem estar prontos em quanto tempo?
FONTES – No máximo em dois meses. Nós precisamos muito saber o que exatamente aconteceu naqueles dias do começo do ano.
ATUAL – As denúncias devem ser apresentadas em conjunto ou separadas por inquérito?
FONTES – Cada caso é um caso. Eu não posso falar pelo dono da ação penal, que é o Ministério Público. É ele que vai avaliar se, por exemplo, desmembra o Compaj, que teria muito mais gente indiciada. Mas eu não posso falar por eles. Eu diria que, em princípio, tenho três casos diferentes.
ATUAL – A conclusão dos inquéritos pode resultar em novas transferências de presos para fora do Estado?
FONTES – Sem dúvida alguma, sim.
ATUAL – O senhor poderia dar alguma indicação para as pessoas que ainda estão assustadas e ainda toma medidas por medo, principalmente quando veem esses dados novos da violência. O que as pessoas devem fazer por medida de segurança?
FONTES – A primeira coisa que elas devem fazer é aumentar seu senso crítico com relação ao que elas leem nas redes sociais. As redes sociais jogam tudo no mesmo balaio. A pessoa se sente insegura pelo que está acontecendo, por exemplo, no Espírito Santo. Ela abre e vê um monte de coisas acontecendo no Espírito Santo e tende a somatizar essa sensação de insegurança. O que eu quero dizer é que os nossos números – e números não mentem – estão aí pra qualquer um ver. Como é que a situação pode estar pior do que no ano passado? O que está pior é a sensação do cidadão. Ele liga a televisão, vê Natal; ele liga a televisão, vê Roraima; ele liga a televisão, vê o Espírito Santo; ele olha seu WhatsApp… Mas o que quero dizer pra ele é o seguinte: realmente há uma situação difícil na segurança pública, que não está passando por um momento fácil… Ontem, eu vi no Jornal Nacional uma informação que não sei se é verdade, mas creio que o Jornal Nacional tenha tomado o cuidado, de que no mês de janeiro deste ano morreram 479 pessoas assassinadas em Pernambuco. Olha esse número: 479, um aumento de 35% em relação a janeiro de 2016, lá em Pernambuco. Aqui, morreu, na minha opinião, um absurdo de gente – 90 pessoas – em janeiro de 2016, e, na minha opinião, morreu também um absurdo de gente em janeiro deste ano: 80 pessoas. Mas comparado com Pernambuco, que não teve a crise que tivemos, a nossa situação está longe de ser uma situação das piores. Nós estamos trabalhando muito. A determinação de todo o sistema, comandante-geral, delegado-geral deu para que os policiais administrativos vão para as ruas ainda está valendo.