Primeira onda foi causada pela CPI da Pedofilia do Senado; a segunda, com a CPI da Câmara, e a terceira, com o CNJ
MANAUS – “Conversas interceptadas pela Polícia Federal revelaram que Adail Pinheiro utilizava-se do cargo para satisfazer a própria lascívia, valendo-se de verdadeira rede de prostituição operada pela ex-Secretária de Ação Social do Município, Maria Lândia dos Santos, e pelo ex-Secretário de Administração, Adriano Teixeira Salan, contando, ainda, com a participação ou cumplicidade de outros assessores. Em alguns casos, a trama passava pela Agência Mega Models, que tinha como um de seus sócios Fabio Martins Marques.
O que há de mais dramático em tudo isso é que tal rede aproveita-se da vulnerabilidade social de adolescentes, como mostrou ser a preferência sexual de Adail Pinheiro. Na maioria das vezes, os gastos com prostituição eram pagos pelo erário da Prefeitura de Coari, como serviços prestados sob a rubrica de ‘eventos sociais’”.
Os parágrafos acima são do relatório da CPI da Pedofilia, do Senado Federal, instalada em 15 de março de 2008 e finalizada em 22 de dezembro de 2010. Os depoimentos colhidos pela CPI ocorreram em 2009, por ocasião da vinda da comissão por duas vezes a Manaus e Coari e da convocação dos denunciados a Brasília.
Primeira onda
Depois da divulgação de transcrições da Operação Vorax, em 2008, quando o documento vazou para a imprensa, a CPI da Pedofilia do Senado causou a primeira repercussão das denúncias de pedofilia envolvendo o prefeito de Coari, Adail Pinheiro. O assunto ganhou a mídia nacional, mas depois caiu no esquecimento.
No fim dos trabalhos, a CPI fez apenas recomendações genéricas e não chegou a pedir punição aos denunciados, apesar de concluir o seguinte sobre o caso de Coari: “O caso de Coari é emblemático por dois motivos. O primeiro deles mostra como os crimes sexuais contra crianças e adolescentes – não é incomum – podem ser praticados justamente pelas autoridades responsáveis por evitá-los. Nesse sentido, é simbólico o fato de que Maria Lândia dos Santos era senão a secretária de Ação Social do Município de Coari. O outro ponto a ser sublinhado é o uso de cargos públicos e de dinheiro público para patrocinar as orgias sexuais do ex-prefeito e de seus principais assessores. Isso se torna ainda mais degradante e repulsivo se considerarmos o contexto social em que vivem as vítimas.”
Entre as páginas 1465 e 1477, o relatório do senador Romeu Tuma reproduz os depoimentos de Adriano Teixeira Salan em que são questionados os principais diálogos do ex-secretário de Administração de Coari com o chefe dele, Adail Pinheiro, a então secretária de Ação Social e o sócio da Mega Models. Os diálogos em questão foram retirados do relatório da Operação Vorax, da Polícia Federal, deflagrada em maio de 2008.
Veja vídeo de parte do depoimento de Salan em que ele não respondeu a nenhuma pergunta do senador Magno Malta.
No fim, o senador Magno Malta exalta o trabalho feito pela comissão e aponta resultados que, na verdade, não foram fruto da CPI, como a cassação do prefeito Rodrigo Alves, sucessor de Adail, e a denúncia do Ministério Público das pessoas envolvidas nas conversas sobre pedofilia. Mas o relatório vale pela descrição das conversas comprometedoras, e que estão sendo usadas como provas nos processos que tramitam na Justiça do Amazonas contra Adail Pinheiro e seus aliados.
Confira o relatório da CPI da Pedofilia do Senado (o relato sobre Coari está nas páginas 1465 a 1477).
Segunda onda
A segunda onda do caso de pedofilia envolvendo Adail Pinheiro ocorreu por ocasião da visita das deputadas que integram a CPI da Pedofilia da Câmara dos Deputados, presidida pela deputada federal Érica Kokay (PT-DF). Elas visitaram Manaus e Coari para tomar depoimentos e tentar ouvir os acusados de prática criminosa. Adail Pinheiro saiu da cidade e informou que fizera uma cirurgia em um hospital de São Paulo na ocasião da visita da comissão a Coari.
A comissão pressionou o Poder Judiciário, inclusive com uma oitiva com o presidente do TJAM, desembargador Ari Moutinho, para pedir explicações sobre a demora na tramitação dos processos envolvendo pedofilia e Adail Pinheiro. Os processos de Adail tramitavam na Comarca de Coari, mas como ele se tornou prefeito, em 2013, os processos subiram para o TJAM, a segunda instância da Justiça estadual.
Terceira onda
Nenhum dos processos contra Adail Pinheiro foi a julgamento até agora. Neste início de ano, com a vinda de membros do Conselho Nacional de Justiça ao Amazonas, criou-se a terceira onda sobre os casos de pedofilia em Coari. Duas reportagens da Rede Globo sobre o caso causaram ebulição na política local e os processos começaram a andar, novamente, na Justiça.
Nesta terça-feira, o Tribunal de Justiça julga outro processo de pedofilia, envolvendo políticos e empresários do Amazonas, resultado das investigações da Operação Estocolmo, deflagrada em novembro de 2012.
Os processos de Adail, no entanto, estão em fase de diligências. A Justiça ainda está ouvindo testemunhas e tentado confirmar as provas, que são contestadas pela defesa dos acusados. Não há prazo para julgamento.