Popularizou-se no Brasil nos últimos tempos um discurso fácil, quando o assunto é violência e crime. A cada assassinato, os “críticos” partem para o ataque ao sistema jurídico e às leis “brandas” que não punem os criminosos com um período mais longo na cadeia. Os adolescentes entre 16 e 18 anos têm sido o principal alvo de uma campanha por mais prisão cada vez mais cedo, como um antídoto para barrar a onda de violência que assola o país e assombra todas as classes sociais.
Esse discurso é falso, despido de qualquer base científica que o comprove. Não é a falta de prisão ou a frouxidão legislativa que alimenta a violência cada vez mais crescente. O país vive um estágio avançado de uma doença que só se agrava e contamina o tecido social de A a Z: a falta de respeito ao outro.
É pura falácia que o “bandido” age por ter certeza da impunidade. Quem conhece essa gente sabe que a última coisa que um assaltante imagina é se dá mal e acabar na cadeia. Ele age porque aposta na fragilidade dos cidadãos de bem. Com uma arma na mão, qualquer um sente-se poderoso, e vai para o tudo ou nada, sem se importar com as consequências. Na hora “h”, matar ou morrer para o bandido não faz diferença, porque a vida para ele não tem qualquer valor.
Mas se engana quem pensa que a falta de respeito é exclusiva dos bandidos. No Brasil, a maioria acha que levar vantagem em tudo é coisa de gente esperta e todos querem ser espertos. No comércio, estabelecer lucro de 100% a 200% não é abusar do consumidor e há quem pague com orgulho pelo produto mais caro só para mostrar que tem mais poder do que o outro que não topa pagar.
Em casa, as crianças alimentam-se de uma cultura da violência, que nada tem a ver com o respeito ao outro, pelo contrário. Ensina-se que a punição violenta é remédio para os “pequenos deslizes”. Aquela criança que aprendeu a responder com violência, depois ganha a rua, onde a lei é a do mais forte. O tráfico de drogas e a bandidagem rondam as famílias e aproveitam-se dessa cultura da violência para se dar bem. Lá, encontram o poder pelo poder e aprendem que nada pode lhe colocar freio.
Mas esse sistema não é coisa das classes mais pobres. Não são poucos os exemplos de filhos e filhas que mantam os pais; de irmãos ou irmãs que se matam por alguns trocados de uma herança. Essa gente não é bandida profissional; mas aculturada numa sociedade que não valoriza a vida, parte para a prática de delitos os mais absurdos. Quem em sã consciência pode imaginar que essas pessoas ao planejarem a morte de um ente querido consultam a legislação para saber quantos anos passariam na cadeia ou são capazes de medir que o delito é melhor que a liberdade?
Portanto, não é de cadeia que o Brasil precisa. A urgência é estabelecer uma nova cultura do respeito ao outro. Um respeito que deveria começar em casa e se espalhar por todos os cantos do país. Essa tarefa não é exclusiva dos cidadãos, mas também do poder público, que precisa oferecer oportunidades às pessoas que pagam uma alta carga de impostos. Nossas escolas precisam contribuir para essa cultura, além de formar cidadãos para o progresso, para os novos desafios que se impõem.
Construir mais cadeias para encaixotar um número cada vez maior de jovens que cometem crimes é uma lógica absurda que não nos levará a lugar nenhum. O país precisa encontrar outro modelo de desenvolvimento que liberte esses jovens e que os incentivem a construir um país de que todos possam se orgulhar.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
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