EDITORIAL
MANAUS – O número de casos de violência contra crianças e adolescentes divulgado nesta terça-feira (28) a partir de dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, deveria envergonhar a todos os brasileiros. No entanto, produz pouco efeito, quase nenhum.
A violência praticada dentro de casa, por quem deveria cuidar das crianças, se tornou uma coisa corriqueira e quase ninguém se incomoda, exceto nos casos mais graves em que a criança não resiste e morre. A comoção, no entanto, dura pouco, e volta quando um novo caso aparece.
O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), criado em 1990, era uma promessa de que o Brasil reduziria drasticamente a violência contra crianças e adolescentes. Quando virou lei, era um dos códigos mais avançados na proteção da infância e da juventude do mundo.
Passados 32 anos, o Brasil continua no mesmo lamaçal. Bater em criança é a coisa mais natural do mundo no país. Os pais ainda usam a pancada como forma de admoestar a criança ou o/a adolescente. O exemplo dos pais é seguido pelos irmãos mais velhos, que se acham no direito de também espancar a criança que pratica qualquer ato que os desagrade.
Esse ciclo de violência é difícil de se combater, porque a criança, principalmente, tem poucas chances de se defender e de denunciar as situações em que é submetida à violência física.
Os números do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que não são pequenos (os registros criminais de maus-tratos passaram de 15.846, em 2020, para 19.136 no ano passado), mostram apenas uma parte da violência. Muitos casos ficam entre as paredes das casas. Sem falar na violência psicológica, que quase nunca é denunciada.
Em 2014, o Congresso Nacional aprovou, e a então presidente Dilma Rousseff sancionou, a Lei 13.010/2014, que ficou conhecida como Lei da Palmada. Ela proíbe o uso de castigos físicos ou tratamentos cruéis e degradantes contra crianças e adolescentes no Brasil.
Em vez de receber aplausos, a Lei da Palmada foi duramente criticada por aqueles que defendem o direito dos pais de usar a força física contra uma criança para “educa-la”.
Não há método mais ineficiente de educação do que a violência. Uma criança que sofre violência nunca vai aprender a gostar de pessoas, mas certamente aprende a reproduzir a violência da qual ela é vítima.
Mas além dessa violência “permitida” contra crianças e adolescentes dentro e fora de casa, há outra mais cruel e que o Brasil não consegue combater: a violência sexual.
São diários os casos que chegam às delegacias de proteção à criança e ao adolescente, mas todos sabem que grande parte dos casos sequer chega a ser denunciada.
Essa situação rebaixa o Brasil como sociedade evoluída. Uma sociedade que não respeita suas crianças nunca será evoluída. E o mais preocupante é que a violência sexual e física contra crianças ocorre em todas as classes sociais, entre ricos e pobres, entre pessoas instruídas e analfabetos.