Como de costume, o Brasil segue surpreendendo. Quando acham que pior não pode ficar, fica. E no meio da desgraça absoluta, por vezes surgem novidades que trazem otimismo à prática política.
Contrariando aqueles que, numa crítica rasteira, citam o Carnaval como simples pão e circo reduzindo sua importância para a população, a Paraíso do Tuiuti fez história e realizou um desfile único. De acidez exata. Importância ímpar, e alcance tremendo.
Seu conteúdo incomodou não apenas a Rede Globo que, no meio do desfile, com notável constrangimento, vinha a comentar sobre o quadril da rainha de bateria. Mas incomodou toda a direita, e de certa forma, qualquer um que pensa sobre o Brasil atual, o capitalismo, e a história.
O desfile, primeiramente evidenciou algo que já é conhecido, pelo menos, desde a eleição presidencial de 2014. Evidentemente que o provável envolvimento em corrupção tem um peso enorme na definição de simpatia para um candidato ou não, mas que, sobretudo, o tipo de governo e política econômica que ele representa é determinante na aderência popular.
Isto é, o projeto liberal, de forte austeridade, defendido por Aécio Neves em 2014, moderadamente aceito por Dilma, e absolutamente exercido por Michel Temer, não obteve aprovação popular. E mesmo que esse projeto venha sendo com força colocado goela abaixo, ele continua sendo rechaçado pela população.
Ao contrário do que vem dizendo a ala dos petistas desiludidos, o que a escola de samba fez não foi “denunciar o golpe”, – coisa que até agora eles não compreenderam muito bem – mas sobretudo denunciar “a exploração do homem pelo homem”, como disse o diretor de carnaval da escola, Thiago Monteiro. Demonstrando uma compreensão mais robusta do tema.
Essa exploração, variada e condicionada a cada tempo histórico onde foi realizada, nunca esteve separada de algo primordial no movimento da história que é a luta de classes. Além disso, fabrica também sua versão circunstancial da barbárie. Seja ela considerada no absurdo da condição de vida da classe trabalhadora, ou até mesmo a quase corriqueira guerra nas favelas e regiões urbanas e rurais do país.
Barbárie essa que teve nesta semana o anúncio de mais um novo capítulo. Após reunião com o Exército, o governo federal anunciou a intervenção militar para tentar controlar a criminalidade no Rio de Janeiro. Além de lembrar que a função dos militares não é de garantir a segurança pública, é preciso lembrar que essa estratégia, ou pelo menos algo parecido, já havia sido tentado no passado.
Essa atitude, não apenas declara a total falência das forças policiais – que deveriam, pela lei, agir nesse tipo de situação, mas que não tem a capacidade, obviamente, de continuar enxugando o gelo. – como também preocupa o morador desses centros urbanos e qualquer um que imagina que o problema do Rio não se dá pela falta de bala ou policiamento.
As estatísticas demonstram um cenário de guerra no país – aqui são assassinadas mais pessoas do que em qualquer outro lugar do mundo. E mais do que as mortes causadas pelos conflitos entre grupos armados – seja esse grupo de policiais ou não – esse cenário traz a calamidade em todos os níveis. Postos de saúde fechados, aulas canceladas, pessoas feridas física e psicologicamente, com o medo de sair nas ruas, e perder suas vidas ou as de seus familiares.
A barbárie bate à porta para dar mais um novo capítulo ao Brasil. Tuiuti fez um grande papel para o diálogo popular, mas começou apenas a elucidar de onde isso vem.
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