Há algumas semanas fora divulgado um relatório do Banco Mundial a pedido do governo brasileiro com o intuito de diagnosticar a atual situação da economia do país e sugerir novas pautas e resoluções de problemas.
Com o título de “Um ajuste justo”, o receituário liberal do órgão se mostra, mesmo com alguns conteúdos polêmicos e discutíveis, bem superior ao nível médio do que se poderia denominar de liberalismo brasileiro – o que, na prática, aparece como entreguismo paradoxalmente gerenciado pelo Estado.
Entre algumas verdades, obviedades e ladainhas, a síntese do relatório se dá na constatação de que o Brasil não só gasta muito, mas que fundamentalmente gasta mal e de maneira injusta. O que há muito se diz e pouco se discute – e que alguns reprodutores do nível de MBL descobriram agora – é que quem paga imposto no país são sobretudo os pobres. E numa singela sugestão de reforma fiscal, é possível que alguns acusem os integrantes do Banco de comunistas.
Evidentemente não há porque discordar da necessidade de Estado gastar melhor o seu dinheiro, fato que de forma clara não significa ser desnecessário ou prejudicial gastar sistematicamente como um agente econômico – não existe Estado mínimo fora de livros de fantasia. Porém, é de fato verdade que a máquina pública precisa diminuir seus gastos.
O relatório sugere medidas para cortar despesas equivalentes a 7% do PIB. Funcionalismo público, previdência, saúde e educação – essa última com importante passagem no relatório – surgem comumente como as primeiras despesas a serem diminuídas.
Mas os ditos do não dito são frequentemente mais significativos que qualquer discurso. Tudo bem, que se diminua os gastos da União, a começar pelo primeiro, aquele que representa mais da metade do orçamento e que, de forma geral, beneficia uma parcela minúscula da população. O Brasil precisa rever e combater o rentismo se quer ter alguma perspectiva futura de desenvolvimento.
Aliás, de poucas novidades se fez o relatório. Este surgiu muito mais como uma legitimação internacional do programa de arrochos e ajustes eternos. Com raras exceções, suas pautas giram totalmente entorno do que já está em discussão em toda a periferia do capital, e no Brasil, pelo menos desde 2015.
Em tempos de crise, a democracia é fragilizada e possivelmente pode ser “flexibilizada”. Isso fica claro em épocas onde o alerta vermelho se repete com frequência. No alvoroço da gestão do medo social diante das inseguranças políticas e econômicas, o espaço deixado pelo fantasma da crise se torna o elemento que legitima que todas as medidas austeras e impopulares se efetivem o mais rápido possível. Neste sentido, o aval dos tecnocratas reverbera à exaustão para persuadir a opinião pública com suas falas monotemáticas, afinal, são eles que sabem o melhor a ser feito.
A comprovação se dá quase que semanalmente. Nesta semana, Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados – um daqueles que nem Deus sabe como ainda está lá – disse que a votação da reforma da Previdência ficou agora para fevereiro de 2018. Isto é, a votação só será feita quando tiverem a certeza da vitória. O Congresso Nacional, no limite, nada tem de casa do povo.
Tudo isso faz parte de uma enorme espiral ideológica que se retroalimenta por todos os lados. O projeto econômico está dado, e ele será implementado custe o que custar. Para isso, cada aparelho tem o seu papel bem definido. O Congresso joga contra o povo, as instituições financeiras e seus técnicos legitimam e a mídia dominante exclui o contraditório.
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