Por Patrícia Campos Mello, da Folhapress
SÃO PAULO – Ainda que reúnam quantidade muito menor de desinformação do que sites de direita, domínios de esquerda também veiculam conteúdos falsos e são usados para propaganda eleitoral.
O NetLab, que monitora 556 grupos políticos no WhatsApp desde 2018 e 588 no Telegram desde 2020, identificou os sites mais compartilhados em grupos bolsonaristas e de esquerda e acrescentou à amostra páginas que surgiram nos últimos meses e estão sendo ativamente disseminadas nos grupos.
A Folha de S.Paulo, em parceria com o NetLab, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), e o Tow Center, da Universidade Columbia (EUA), investiga o conteúdo e a monetização de sites políticos no período eleitoral.
Em julho, os principais sites de esquerda compartilhados em grupos de WhatsApp e Telegram tiveram 23,48 milhões de acessos, menos da metade do número de visitas recebidas por domínios bolsonaristas e conservadores, com 48,22 milhões, segundo dados da empresa de medição de audiência SimilarWeb.
A maioria dos sites esquerdistas se apresenta como de esquerda e não diz ser imparcial, como fazem os de direita, e em geral incluem identificação dos donos, diferentemente de muitos veículos bolsonaristas.
O site Plantão Brasil, por exemplo, usa títulos como “Bolsonaro destroçado no debate! Plano dele deu tudo errado!!” e “Bolsonaro chora!! Descartado e abandonado na véspera da eleição”.
Thiago dos Reis, criador do Plantão Brasil, postou no site recentemente um vídeo anunciando sua candidatura a deputado federal pelo PT e pedindo votos e doações para a campanha.
A página do site no Facebook também traz propaganda da candidatura dele. “Deixo claro que sou dono do site e petista. O site tem posicionamento claro de esquerda. É transparente, muito diferente de sites que fingem ser noticiosos, dizem ser imparciais e que não sabemos quem são os donos”, afirma Reis.
O site Hora do Povo manifesta posicionamentos políticos em textos supostamente factuais, não só em artigos de opinião. Algumas publicações têm frases como “ele tentou enganar a população”, “Bolsonaro foi recebido com protestos por sua desastrosa administração e irresponsável atuação diante da pandemia de Covid-19” e “a mentira é a principal ‘arma’ de campanha do presidente Jair Bolsonaro (PL)”.
O editor do site, Clóvis Monteiro Silva, afirma que todos os veículos de comunicação recorrem a tal expediente, “de maneira mais ou menos disfarçada”. “A gente acha que o Bolsonaro é uma coisa ruim e deixamos isso claro, somos um jornal da esquerda nacionalista.”
Também há desinformação em sites de esquerda, mas em número bem menor do que nos de direita. Entre 2018 e 2022, a Agência Lupa, o Projeto Comprova e o Aos Fatos, agências de checagem, identificaram 137 conteúdos falsos nos sites bolsonaristas de maior audiência, e 20 nos de esquerda mais acessados.
Em texto publicado em fevereiro, o Brasil 247, líder de audiência entre os domínios de esquerda, chamou o atentado sofrido por Bolsonaro em 2018 de “suposta facada”. Conteúdos que afirmam ter havido uma conspiração para fingir a ocorrência do ataque foram considerados “falsos” por agências de checagem.
Em agosto, o YouTube excluiu vídeos do site, entre os quais o documentário “Bolsonaro e Adélio: uma fakeada no coração do Brasil”, que fala em “fakeada”, junção de “fake” -falso, em inglês- e facada. Segundo a plataforma, os materiais violam as regras da empresa contra discurso de ódio, “como conteúdo que negue, banalize ou minimize eventos históricos violentos, o que inclui o esfaqueamento de Bolsonaro.”
O Brasil 247 recebeu 11,8 milhões de visitas em julho. Para Leonardo Attuch, editor-responsável pelo Brasil 247, “a exclusão dos vídeos fere a liberdade de expressão e foi classificada de censura pela Federação Nacional dos Jornalistas e pela Associação Brasileira de Imprensa”.
“Os vídeos de Joaquim de Carvalho, finalista do Prêmio Comunique-se de 2022 como um dos melhores repórteres do Brasil, não negam o episódio ocorrido em Juiz de Fora, mas cobram a investigação da hipótese de um autoatentado”, diz ele.
“Além disso, o conteúdo do documentário jamais foi questionado judicialmente pelo próprio Jair Bolsonaro ou por qualquer um de seus familiares. Portanto, houve exclusão de conteúdo jornalístico por decisão unilateral das plataformas, sem qualquer amparo judicial.”
A legislação eleitoral é vaga sobre propaganda eleitoral online. Em TVs e rádios, é preciso dar “tratamento isonômico” aos candidatos, mas essa regra não vale para a internet, pois não envolve concessão pública.
Assim, sites estão sujeitos a responsabilização pela divulgação de material “sabidamente inverídico” ou afirmações difamatórias, com possibilidade de direito de resposta e remoção de conteúdo pela Justiça.
Além disso, propaganda eleitoral não paga só pode ser veiculada nos sites oficiais dos candidatos e das coligações e naqueles previamente informados ao TSE.
Outra possibilidade são impulsionamentos de posts ou anúncios contratados diretamente de plataformas como Facebook e YouTube – pagar sites para divulgação de propaganda eleitoral ou fatos inverídicos, entretanto, é crime eleitoral.