Em sintonia com a Conferência Popular pelo Direito à Cidade, o Fórum das Águas e o Fórum de Reforma Urbana (FARU) iniciaram, nesta quinta-feira (05/05/2022), uma série de mesas redondas para debater o Direito à Cidade na capital amazonense. Esses encontros são realizados no auditório do Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (SARES), nos dias 05, 06 e 07 do corrente mês, abordando diferentes frentes de luta de grande impacto na vida urbana.
A Conferência Popular pelo Direito à Cidade será realizada em São Paulo nos dias 03, 04 e 05 de junho de 2022, visando reunir representantes de todo o Brasil para viabilizar os seguintes objetivos: 1 – Construir democraticamente uma plataforma de lutas urbana voltadas para o combate à desigualdade social e à predação ambiental; 2 – participar da redemocratização do país por meio de uma articulação nacional de agentes, atores e entidades vinculados à vida urbana e produção das cidades; 3 – inserir o tema das cidades no projeto nacional a ser definido socialmente por ocasião das eleições de 2022.
Os encontros de preparação para a Conferência que acontecem em Manaus tratam de temas específicos, sendo o primeiro dia dedicado a discutir “água e saneamento e os desafios em comunidades de periferia da cidade de Manaus”. No segundo dia somos convidados a abordar a questão da “terra e moradia: conflitos fundiários e os despejos forçados”. E finalmente no último dia discutiremos a temática do “direito à cidade e os povos indígenas em contexto urbano”. São assuntos estreitamente relacionados com a vida urbana, servindo de base para refletirmos sobre até que ponto o direito à cidade é implantado em Manaus.
O primeiro tema, abordado no dia 05 de maio, foi conduzido a partir da exposição de Sandoval Alves Rocha, Eduardo Colmanetti e Francisco Pinheiro de Lira, que falaram sobre o problema da água e do saneamento nas periferias de Manaus. Depois da fala de abertura realizada pelo subdefensor público geral Tiago Nobre Rosas, os palestrantes focaram suas ponderações no desempenho da concessão privada dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, que iniciou no ano 2000, com a venda da subsidiária estatal Manaus Saneamento para o Grupo francês Lyonnaise des Eaux (Suez). Nas últimas duas décadas, quatro poderosos grupos empresariais se permutaram na gestão daqueles serviços, sem conseguir apresentar resultados satisfatórios, principalmente nas áreas periféricas da cidade.
Os conferencistas expuseram vários problemas da gestão, tais como, elevados preços tarifários cobrados pela empresa, falta de esgotamento sanitário na cidade, tarifa injusta dos serviços de esgotamento sanitário, morosidade na implantação da tarifa social, cortes do abastecimento em época de pandemia, poluição dos rios e igarapés, redução da participação popular nas decisões sobre a política de saneamento, investimentos de recursos públicos em obras da empresa, ausência de consciência ambiental, omissão do poder público municipal e das entidades educativas na formação da consciência crítica. Todos esses problemas são comumente vivenciados pela população de Manaus, mas os órgãos de fiscalização do contrato fecham os olhos para esta realidade, buscando legitimar a permanência da empresa na cidade.
Na ocasião, houve também participações de lideranças presentes no local. Dentre essas lideranças se destacaram as intervenções de Marcos Brito, do Fórum Amazonense de Reforma Urbana; Neila Gomes, do Movimento Nacional de Luta pela Moradia; Erivaldo Mura, Tuchaua da aldeia Guará do Rio Negro; e Bia Kokama, do movimento de moradia popular.
Foram depoimentos relevantes, que abrilhantaram o evento e mostraram a complexidade da problemática do saneamento básico na Amazônia. Essas falas foram perpassadas por uma visão crítica do Estado, nas instâncias municipais, estaduais e federais. As considerações produziram um consenso geral sobre a necessidade de mudança urgente na forma como a política nacional é atualmente conduzida.
O evento procurou destacar a necessidade de que o direito à cidade torne-se uma orientação fundamental, ocasionando mudanças significativas na gestão do urbano. A cidade é vista como um bem comum que deve ser acessível a todos os indivíduos e coletivos, possibilitando uma vivência digna, independentemente da raça, região, ideologia, gênero e classe de pertencimento.
Não convém que serviços essenciais como o abastecimento de água e esgotamento sanitário fiquem submetidos à interesses empresariais, que priorizam a geração de lucros, ignorando as necessidades básicas das populações mais pobres da cidade.
Sandoval Alves Rocha Fez doutorado em ciências sociais pela PUC-RIO. Participa da coordenação do Fórum das Águas do Amazonas e associado ao Observatório Nacional dos Direitos a água e ao saneamento (ONDAS). É membro da Companhia de Jesus, trabalha no Intituto Amazonizar da PUC-Rio, sediado em Manaus.
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