Os deputados da base de apoio ad governador Omar Aziz (PSD) na Assembleia Legislativa do Estado (ALE-AM) chegaram aonde queriam no processo de Ricardo Nicolau (PSD), denunciado pelo Ministério Público, em ação civil pública por improbidade administrativa, por superfaturar em quase R$ 5 milhões uma obra realizada na gestão dele na presidência do Poder Legislativo: o edifício garagem. Apegados ao Regimento Interno, eles não têm mais para onde correr e a representação dos deputados de oposição pode parar na lata do lixo.
Na sexta-feira, depois de a Comissão de Ética Parlamentar (CEP) dizer que não teria competência para iniciar a investigação e devolver a matéria para a Mesa Diretora, o presidente da ALE, deputado Josué Neto (PSD) afirmou que iria cumprir o Regimento Interno, coisa que não fez até aquele dia. Por decisão da CEP, a representação precisa tramitar, primeiro, na Corregedoria, que na ALE é fundida com a Ouvidoria.
O problema é que ouvidor-corregedor chama-se Ricardo Nicolau, o próprio. Seria um descalabro Nicolau julgar a si mesmo. Por isso, todos esperam que ele se julgue impedido. Fazendo isso, não sobraria nenhum parlamentar para substitui-lo e não há qualquer previsão regimental para resolver o impasse a que se chegou.
Tramitação lenta e gradual
O processo contra Ricardo Nicolau se arrasta na ALE desde junho deste ano, sem que os deputados encontrem uma “solução” para iniciar a investigação contra o colega de bancada. A representação original chegou à ALE no dia 21 de junho, e tinha como autores o Instituto Amazônico da Cidadania (Iaci) e a Central de Movimentos Populares do Amazonas.
A Mesa Diretora a encaminhou à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Passado quase um mês, o relator da matéria, deputado Orlando Cidade (PTN) emitiu parecer para que a representação fosse arquivada, alegando que o Iaci não tinha competência para pedir investigação contra um “nobre deputado”. O voto do relator recebeu o apoio do presidente da CCJ, deputado David Almeida (PSD).
Para livrar o processo do arquivamento, os deputados de oposição Marcelo Ramos (PSB), José Ricardo (PT) e Luiz Castro (PPS) e mais o deputado Tony Medeiros (PSL) reivindicaram a autoria da representação. Eles haviam subscrito o pedido do Iaci e, portanto, poderiam assumir a autoria.
Feito isso, a Mesa Diretora, no dia 27 de agosto, transformou a representação em resolução legislativa e a encaminhou à Comissão de Ética. No discurso, o presidente da ALE afirmava que, enfim, a representação ganhara legalidade para tramitar na Casa. Não demorou para a comissão de ética, na última sexta-feira devolver o pacote de denúncias à Mesa Diretora, com o seguinte recado: “As denúncias devem ser investigadas, primeiro, pela Corregedoria da Casa”. Exatamente a “entidade” dirigida por Nicolau.
Beco sem saída
Agora, os deputados se encontram em um beco sem saída. Nem o Regimento Interno da ALE e nem a Constituição Estadual têm qualquer previsão de substituto em caso de impedimento do corregedor. Josué Neto disse à imprensa que iria esperar um parecer da Procuradoria Geral da Casa sobre a hipótese de nomear um corregedor substituto. Mas advertiu: “Não vamos fazer nada que não esteja escrito no Regimento”. A frase dele sobre o substituto para Nicolau foi reproduzida pela assessoria no site da ALE: “Esta é uma questão que vai ser analisada e a decisão será tomada de acordo com parecer da Procuradoria Geral, seguindo sempre o regimento”.
O Artigo 199 do Regimento Interno diz: “Suscitada omissão, dúvida, incorreção, incoerência notória ou contradição na aplicação ou interpretação deste Regimento, a matéria é submetida ao Plenário e da decisão, pode a Mesa Diretora propor emenda ao texto regimental”. Esse é um típico caso de omissão.
Quem vai querer?
Vamos considerar a hipótese de a ALE decidir nomear um corregedor substituto. Que deputado da base amiga de Nicolau iria querer assumir tal tarefa?. Se não é um deputado de situação, não pode ser também um de oposição, porque os três únicos oposicionistas são autores da representação.
Há, inclusive, uma hipótese de José Ricardo assumir a corregedoria temporariamente, porque foi candidato a corregedor na última eleição para o cargo e ficou em segundo lugar, num placar de 22 votos a 2. Mas o Direito não aceita que o autor de um pedido julgue esse pedido, por motivos óbvios.
A solução para o impasse só deve sair depois da Semana da Pátria, de acordo com Josué Neto. A expressão “empurrando com a barriga” nunca caiu tão bem para uma situação como cai para este caso.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
Os artigos publicados neste espaço são de responsabilidade do autor e nem sempre refletem a linha editorial do AMAZONAS ATUAL.