O AMAZONAS ATUAL publicou nessa semana que mal termina ou que terminou mal na quarta-feira, 4, duas matérias com dados que, no mínimo, precisam ser investigados. A primeira matéria dá conta de contratos para a realização de projetos executivos de obras do Governo do Estado do Amazonas e de gerenciamento de obras só para a capital Manaus com um volume de recursos gastos da ordem de R$ 209 milhões. A segunda, trata de um contrato com uma única empresa para supervisionar e gerenciar obras no interior do Estado, no valor de R$ 133,5 milhões.
Entre os contratos para Manaus, uma única empresa, a Laghi Engenharia Ltda., faturou R$ 133 milhões, com projetos executivos de obras de 2009 a 2015. No contrato para o interior do Estado, também uma única empresa, a Egus Consult Engenharia e Projetos Ltda., tem contrato de R$ 133,5 milhões, para dois anos, no período de junho de 2014 a junho de 2016.
Fiscalizar obras, ou supervisionar, como diz o governo, é uma atribuição de quem contrata. No caso, em tela, o contratante é o próprio governo. Não faz sentido esse serviço ser terceirizado. É como se um cidadão contratasse um empresa para realizar a construção de uma casa e precisasse contratar uma outra empresa para ver se a obra está saindo conforme o combinado e dentro do prazo. Ninguém melhor do que o dono para fiscalizar os serviços que contrata.
Por outro lado, as secretarias de obras ou infraestrutura tinham – pelo menos esse era o motivo da existência delas – um corpo técnico formado por engenheiros e outros profissionais, que eram responsáveis tanto para elaborar projetos quanto para fiscalizar as obras. Onde foi parar esse pessoal? Qual a função das secretarias de infraestrutura nessa nova forma de gestão pública? Tudo é terceirizado: as obras, os projetos, e, agora, até a fiscalização das obras. No entanto, essas secretarias ainda estão abarrotadas de gente, muitos apadrinhados de políticos, que são colocados nos cargos comissionados para pagar favores.
Sobre os projetos executivos, por que o governo e a Prefeitura de Manaus deixaram de fazê-los no âmbito das secretarias, por seus técnicos, e passaram a terceirizar a preços que saltam os olhos? Não cheira bem esse tipo de contratação. A Laghi faturou R$ 133 milhões com 24 contatos, uma média de R$ 5,5 milhões por projeto. Quanto de salário seria possível pagar com esse valor? Para onde está indo esse dinheiro todo?
Quem poderia dar uma resposta a essa série de perguntas era o Ministério Público do Estado do Amazonas e o Tribunal de Contas do Estado. Essas instituições tinham a finalidade de fiscalizar. O primeiro, guardião da Lei, o segundo, guardião da moralidade dos gastos públicos. Mas o que se tem percebido nos últimos anos é um certo desleixo proposital dessas duas instituições, principalmente quando o problema atinge o centro do poder (Leia-se: governo do Estado e Prefeitura de Manaus). Mordem como feras selvagens os prefeitos do interior do Estado, mas não dão um arranhão nos gestores que estão concentrados na capital. Por manterem uma relação institucional muito próxima, as relações de amizade acabam comprometendo a o trabalho daqueles que deveriam fazer a defesa dos interesses coletivos.
Os processos não andam nessas instituições; o marasmo toma conta dos gabinetes; todos estão muito satisfeitos com seus salários e vantagens, concedidas ao bel prazer dos comandantes e corroboradas pelos demais poderes. Não é bom para ninguém do circuito do poder tirar o manto e desvendar os malfeitos.
Assim, fica tudo livre, leve e solto. O governo contrata os serviços, contrata o fiscal do serviço, paga valores que de longe levantam suspeitas; e cria a necessidade de um fiscal para fiscalizar a fiscalização. O problema é que ninguém se habilita para esse empreitada. Sobra pra quem trabalha duro para pagar os impostos e garantir o banquete do andar de cima.
Valmir Lima é jornalista, graduado pela Ufam (Universidade Federal do Amazonas); mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia (Ufam), com pesquisa sobre rádios comunitárias no Amazonas. Atuou como professor em cursos de Jornalismo na Ufam e em instituições de ensino superior em Manaus. Trabalhou como repórter nos jornais A Crítica e Diário do Amazonas e como editor de opinião e política no Diário do Amazonas. Fundador do site AMAZONAS ATUAL.
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