Da Folhapress
BAURU – O presidente do Haiti, Jovenel Moïse, 53, foi morto a tiros por um grupo de agressores não identificados em sua residência privada durante a madrugada desta quarta-feira (7), informou por meio de um comunicado o primeiro-ministro interino, Claude Joseph, que classificou o caso de “ato odioso, desumano e bárbaro”.
Segundo o premiê, a esposa de Moïse, Martine, 47, também foi baleada e está recebendo cuidados médicos. Sem dar mais detalhes, Joseph informou ainda que parte dos invasores falava espanhol, o que indicaria que eles não são haitianos – os idiomas oficiais do país são o francês e o crioulo.
“Todas as medidas estão sendo tomadas para garantir a continuidade do Estado e para proteger a nação. A democracia e a República vencerão”, disse o primeiro-ministro depois de pedir calma à população e afirmar que a situação de segurança do país está sob controle da polícia e das Forças Armadas.
Na segunda-feira (5), Moïse havia nomeado um novo premiê, o sétimo em quatro anos. Ariel Henry deveria substituir Joseph nesta quarta, mas, devido às circunstâncias, a troca não aconteceu. Em entrevista ao jornal americano The New York Times, Joseph afirmou estar no comando do Haiti neste momento.
O ataque, no entanto, ocorreu em meio a uma onda crescente de violência ligada à crise política do país. Com o Haiti profundamente polarizado e enfrentando uma crise humanitária e escassez de alimentos, há temores de uma desordem generalizada.
Nesta madrugada, houve relatos de tiros em toda a capital, Porto Príncipe. No começo da manhã, forças de segurança montaram um sistema para controlar a circulação de pessoas as ruas.
Segundo o embaixador brasileiro no país, Marcelo Baumbach, a polícia controla a cidade e a população evita sair de casa, mas na região central, onde está o palácio do governo, alguns grupos já começam a se reunir para manifestações. “Deve esperar-se um clima tenso, embora o país esteja neste momento sob controle”, disse Baumbach.
Porto Príncipe vinha sofrendo com um aumento da violência por causa do confronto entre as gangues e com a polícia pelo controle das ruas. No mês passado, o líder de uma espécie de coalizão de nove gangues conhecida como G9 anunciou que estava lançando um movimento revolucionário contra elites políticas e empresariais do país, o que deixou as autoridades em estado de alerta.
As consequências do terremoto que devastou o país há 11 anos, o aumento da pobreza e da instabilidade política também serviram de gatilho para a violência nas ruas, que a Organização das Nações Unidas (ONU) definiu como “sem precedentes”.
Moïse vinha enfrentando protestos desde que assumiu a Presidência em 2017, com a oposição acusando-o de autoritarismo e de tentar instalar uma ditadura ao prolongar seu mandato – acusações que ele negava.
Em fevereiro, mais de 20 pessoas, incluindo um juiz da Suprema Corte do Haiti e um dos inspetores-gerais da polícia, foram presas sob a acusação de envolvimento em uma tentativa de golpe de Estado e em uma conspiração para assassinar Moïse.
O caso acirrou a crise política do país, que tinha no centro da disputa uma discussão sobre o término do mandato de Moïse. Ele foi eleito em 2015 e deveria ter tomado posse em 7 de fevereiro de 2016 para um mandato de cinco anos.
Em meio a acusações de fraudes, porém, o pleito foi anulado e teve que ser refeito no ano seguinte. Durante esse período, o país foi comandado por um governo interino.
Moïse saiu vencedor na nova votação e assumiu o comando do Haiti em 7 de fevereiro de 2017. Como o mandato presidencial no país é de cinco anos, ele alegava que devia permanecer no cargo até fevereiro de 2022, portanto -uma alegação apoiada pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e pelo governo do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
A oposição, no entanto, considerava que o período de um ano de governo interino deveria ser incluído na contagem, mesmo que Moïse não fizesse parte dele. O Superior Tribunal de Justiça do Haiti concordava com essa visão, segundo a qual o mandato do presidente deveria ter terminado em 7 de fevereiro deste ano.
O plano da oposição para trocar o comando do país exigia que membros da sociedade civil e líderes políticos escolhessem um novo presidente entre os juízes da Suprema Corte, em vez de esperar pelas eleições gerais marcadas para setembro.
Moïse, por sua vez, não aceitava deixar o cargo. “Eu não sou um ditador. Meu mandato termina em 7 de fevereiro de 2022”, disse, durante um discurso em Porto Príncipe horas depois de milhares de haitianos irem às ruas pedindo sua saída da Presidência.
Moïse governava o país por meio de decretos desde o ano passado, depois de suspender dois terços do Senado, toda a Câmara dos Deputados – na prática, anulando o Poder Legislativo- e todos os prefeitos.