
OPINIÃO
MANAUS – É uma característica das pessoas que se arvoram a bater no peito e se autodeclarar “de direita” a arrogância, a empáfia e a falta de respeito com o outro ou a outra. É uma característica de Plínio Valério a falta de humildade para reconhecer o erro. No caso envolvendo a ministra Marina Silva, o senador amazonense até pediu desculpas, mas não a Marina, a quem ele ofendeu com uma fala grosseira, preconceituosa, misógina e mentirosa.
É grosseira porque Plínio Valério, como ele mesmo disse, fez “uma brincadeira” com coisa séria, usando o nome de uma mulher: “A Marina teve (sic) na CPI das ONGs, 6 horas e 10 minutos. Imagine o que é tolerar a Marina 6 horas e 10 minutos sem enforcá-la. [a plateia gargalha] A minha mulher que está ali, a Ana, mandava mensagem o tempo todo, instigando, jogando gasolina. E, no final, ela me disse: ‘se você tivesse 10% da paciência que teve com a Marina, a gente não brigava’”.
É preconceituosa, porque essa gente que não respeita o meio ambiente sempre liga o nome da ministra Marina Silva com o atraso, por ela defender a preservação da floresta de forma incondicional. No Amazonas, o preconceito contra Marina tem um ingrediente adicional: a BR-319. Todo político tenta ligar a falta de pavimentação da rodovia à vontade ou falta de vontade da ministra, de origem humilde dos rincões do Acre. Quando o nome dela é pronunciado, muitos fazem a ligação com a falta de pavimentação da rodovia.
É misógina porque a fala de Plínio, como da maioria dos políticos do Amazonas, tem um tom elevado quando é dirigida à mulher Marina Silva. Houve, durante o governo passado, um general no cargo de vice-presidente, que, em visita a Manaus, prometeu “comer a boina” se a rodovia não fosse asfaltada. O governo de Jair Bolsonaro nada fez e o general Hamilton Mourão nunca foi cobrado. Outros ministros do Meio Ambiente que vieram depois de Marina Silva, em governos como de Dilma Rousseff, de Michel Temer e de Jair Bolsonaro [foram três homens e uma mulher], nunca foram cobrados publicamente pelos políticos ou pelos críticos de Marina Silva em relação ao asfaltamento da BR-319.
É mentirosa porque tenta carimbar em Marina Silva a culpa por um desleixo que não é dela. Marina Silva, sempre cobrou os estudos de viabilidade econômica, social e ambiental para a liberação das obras de reconstrução e repavimentação da BR-319. Mas ela ficou fora do governo de 2008 a 2022. Voltou para o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima em janeiro de 2023. Por que a BR-319 não foi asfaltada durante os 14 anos que ela esteve ausente dos governos? Onde estava Plínio Valério nesse período para exigir dos homens que administraram o Brasil o asfaltamento da rodovia?
No fim da nota, Plínio escreve: “Minhas divergências são em relação à atuação da ministra Marina Silva, e não à sua pessoa. Peço desculpas, de forma sincera, a todos que se sentiram ofendidos pela minha infeliz colocação.” Não faz um pedido de desculpas direto.
Mais grosseria
Plínio diz à plateia patética de empresários que Marina Silva está blindada no Ministério do Maio Ambiente, e de novo usa a grosseria que lhe é peculiar: “A Marina não é burra, ele repete, tem lavagem cerebral, mas ela trouxe a Apple. O Lula quer tirar a Marina, mas não pode fazer por causa de forças externas”.
Outra mentira de Plínio. Esse tipo de argumento, que parece uma forma de exaltar o poder de Marina Silva, é, na verdade, uma tentativa de desqualificá-la perante a autoridade. É uma tentativa de desestabilizar a relação de Lula ou do governo com a ministra. E nada disso vai acontecer, porque é uma mentira deslavada o que o senador diz. Lula mantém Marina Silva no cargo porque precisa de uma pessoa de fibra no ministério, que seja respeitada pela comunidade internacional.
Plínio inventou uma CPI das ONGs no Senado que foi um vexame. Ele queria provar um delírio dele próprio de que a Amazônia é uma zona povoada por ONGs que querem impedir o desenvolvimento da região, explorar seu povo e roubar as riquezas acumuladas há milhares de anos por aqui. Para isso, chamou todo tipo de gente que pudesse falar mal das ONGs e apontar problemas que tinham características de fofoca.
Por fim, convidou a ministra Marina Silva na tentativa de desqualificá-la e desqualificar o Ministério do Meio Ambiente e os órgãos de controle ambiental. Se deu mal, porque Marina Silva enfrentou e ele (presidente) e o senador do Acre Márcio Bittar (relator da CPI), outro negacionista do clima e defensor de garimpeiros, madeireiros e exploradores de minérios em geral na região.
Ambiente privado
Na nota em que se defende, Plínio Valério alegou estar participando de uma reunião privada, fora do ambiente do Senado e de qualquer área pública, mas no mesmo evento ele dizia falar em nome do povo do Amazonas. O fato de estar em local privado [uma reunião de empresários na Associação Comercial do Amazonas] não lhe dá o direito de ser grosseiro, preconceituoso, misógino e mentiroso para atacar uma mulher.
O senador afirma que ao comentar sobre o problema da BR-319, usou termos fortes. Não são termos fortes, mas inadequados: “Usei então termos fortes, mas que correspondem ao sentimento da população local.” A fala dele não representa o sentimento da população do Amazonas, tanto que a repercussão foi muito negativa.
Ele continuou: “Talvez, como senador da República, não devesse fazer isso, menos pela real intenção, que é zero, e mais pela possibilidade de interpretações descabidas, que realmente aconteceram. Infelizmente o tema repercutiu amplamente.”
Houve exageros nas narrativas sobre a fala do senador, no sentido de acrescentar o que ele não disse. Plínio não ameaçou Marina Silva de morte, mas quando diz que suportou a ministra falando por 6 horas sem enforcá-la, ele sugere que a vontade naquele momento era de fazê-lo. E ao dizer isso, incita, sim, a violência contra a ministra, principalmente porque no Amazonas há uma animosidade quase que geral contra ela provocada pela onda de inverdades que os políticos disseminam ao abordar o tema BR-319.
Por fim, o senador afirma que a repercussão da fala dele, inclusive no plenário do Senado, tem ligação com a disputa eleitoral do próximo ano. É possível que o episódio respingue numa eventual campanha eleitoral, mas não deve ser decisivo. Plínio é um político em fim de carreira, e escolheu a mesma trilha de seu ex-companheiro de partido Arthur Virgílio Neto. O fim de ambos pode ser o mesmo do PSDB, um partido que já foi grande, mas se apequenou e está à beira da extinção.