Desde 2004 múltiplas organizações da sociedade civil se mobilizam, visando reconfigurar o sistema político brasileiro, uma vez que naquela época já se percebia fortes sinais de fragilidade na democracia. Esta mobilização foi justificada pelo fato de nossa democracia, apesar de ainda recente, ter demonstrado que não vinha correspondendo às aspirações do país, deixando à margem dos processos decisórios a maioria da população. Em 2004, a democracia brasileira já dava sinais de exaustão, apresentando-se como uma democracia meramente procedimental, sem provocar impactos substantivos na vida concreta do povo brasileiro.
Este movimento tem ganhado força nos últimos anos refletindo os riscos e ataques que a democracia tem sofrido no Brasil. A ascensão de grupos conservadores de extrema-direita (no Brasil e no Mundo) ligou o alerta dos movimentos democráticos, uma vez que aqueles grupos preconizam agendas de tendências neofascistas, chegando a defender publicamente regimes militarizados, que se caracterizam por rígidas hierarquias sociais, com acentuadas feições patriarcais.
Os movimentos democráticos também são sensíveis às reconfigurações contemporâneas do capitalismo, que ampliam cada vez mais as desigualdades sociais e impõem um estilo de vida precário para a maioria da população. Estas reconfigurações atribuem ao mercado prerrogativas excepcionais, tornando-o o centro da vida social e impossibilitando que a sociedade civil organizada exerça influência sobre as decisões de maior impacto na sociedade.
Organizada nacionalmente, a Plataforma pela Reforma do Sistema Político identificou logo no seu início, um sistema político deficitário constituído por instrumentos de participação social de baixo impacto na formulação e no controle social sobre as políticas públicas, que se restringia a um tênue acompanhamento de políticas sociais. Foram identificados problemas graves como, a sub representação de setores sociais dominados e explorados, tais como mulheres, pessoas negras, povos indígenas, LGBTQI+, da classe trabalhadora e da juventude. Era evidente o domínio do capital sobre a política e a corrupção eleitoral; o descrédito na política e a crise de representatividade; o funcionamento antidemocrático dos partidos políticos; a produção de falsos consensos pela mídia corporativa; a criminalização dos movimentos sociais; o autoritarismo do sistema de justiça, entre outros.
De fato, os principais atores do capitalismo (agências financeiras multilaterais, empresas transnacionais, nações mundialmente poderosas e elites econômicas nacionais e locais) procuram expandir o sistema de mercado e sofisticar o seu aparato ideológico, visando ampliar o processo de acumulação de riqueza, provocando uma grave crise socioambiental. Neste processo, os direitos sociais são solapados, os bens públicos são privatizados, a natureza é capitalizada e até a vida é mercantilizada. Vivemos a tirania do mercado.
Em abril de 2019, a Plataforma pela Reforma do Sistema Político, durante Encontro Nacional em Brasília, pactuou uma atuação coletiva em torno de 11 temáticas, a saber: Laicidade do Estado e Diversidade Religiosa, Economia e Democracia, Racismo e Poder, Democracia Comunitária, Mulheres nos Espaços de Poder, Sistema político e os Direitos LGBTQI+, Poder Político e Juventude, Esfera Pública Digital, Direito à Desobediência Civil, Justiça Popular, Justiça formal e Partidarização do Sistema de Justiça, Direitos dos Povos Originários e Tradicionais.
Em Manaus, a plataforma se articula com o apoio do Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental – SARES, contando com a participação de professores, lideranças de movimentos sociais, partidos políticos e pastorais sociais.
Este pleito eleitoral é uma boa oportunidade para a sociedade expressar a sua vontade fortalecer a democracia, escolhendo candidatos comprometidos em efetivar a cidadania: direitos civis, direitos políticos, direitos sociais, direitos culturais e ambientais. Não basta poder votar, mas é preciso fazer a diferença, afastando os velhos caciques que sempre estiveram comandando a política local. É necessário dar oportunidade aos candidatos que têm um histórico de luta junto às comunidades e movimentos populares mais vulneráveis, que buscam efetuar mudanças significativas na sociedade.
Às vezes, o candidato é novo, mas defende ideais velhos, que consolidam ainda mais a opressão, a intolerância, a militarização, a desigualdade social e a degradação ambiental. Não podemos nos deixar enganar pelas artimanhas dos velhos coronéis, que buscam permanecer infernizando a vida do povo e atrasando o processo civilizatório. Muitas vezes se escondem atrás de caras novas, mas as ações truculentas já são bem conhecidas da população sofredora.
A Plataforma para Reforma do Sistema Político é uma expressão da sociedade que aspira salvar a nossa democracia, buscando torna-la mais efetiva. É necessário radicalizar a democracia, dando oportunidade ao povo brasileiro de participar da gestão dos municípios e dos serviços públicos de forma mais direta, pensando em melhorar a qualidade de vida dos segmentos sociais que sempre foram empurrados para as margens da sociedade.
Sandoval Alves Rocha Fez doutorado em ciências sociais pela PUC-RIO. Participa da coordenação do Fórum das Águas do Amazonas e associado ao Observatório Nacional dos Direitos a água e ao saneamento (ONDAS). É membro da Companhia de Jesus, trabalha no Intituto Amazonizar da PUC-Rio, sediado em Manaus.
Os artigos publicados neste espaço são de responsabilidade do autor e nem sempre refletem a linha editorial do AMAZONAS ATUAL.